Transtorno do Estresse Pós-Trauma no Mundo Real: Por Que os Estudos Ocidentais Podem Estar Errados
- Lidi Garcia
- 7 de mar.
- 4 min de leitura

Pesquisas indicam que o transtorno de estresse pós-traumático (TEPT) pode afetar os hormônios, como cortisol e testosterona, mas isso parece variar conforme o ambiente. Em países industrializados, pessoas com TEPT apresentam alterações hormonais, mas um estudo com a etnia Turkana, no Quênia, não encontrou essa relação. Isso sugere que o impacto do trauma no corpo pode depender do contexto cultural e ambiental, destacando a necessidade de mais pesquisas.
O transtorno de estresse pós-traumático (TEPT) é uma condição mental que pode se desenvolver após uma pessoa vivenciar ou testemunhar um evento traumático, como violência, acidentes graves, abusos ou desastres naturais. Os sintomas incluem lembranças angustiantes, pesadelos, ansiedade intensa e evitação de situações que lembrem o trauma.
O transtorno de estresse pós-traumático pode afetar qualquer pessoa, mas é mais comum em grupos expostos a altos níveis de estresse, como militares, vítimas de violência e sobreviventes de tragédias.
Fatores como predisposição genética, suporte social e histórico de outros traumas podem influenciar o risco de desenvolver a condição. O tratamento geralmente envolve terapia e, em alguns casos, medicação para ajudar a aliviar os sintomas.

Pesquisas realizadas em países industrializados sugerem que o transtorno de estresse pós-traumático pode estar relacionado a uma menor sensibilidade do organismo a hormônios como o cortisol e a testosterona.
Isso significa que pessoas com transtorno de estresse pós-traumático poderiam apresentar um padrão menos acentuado desses hormônios ao longo do dia. No entanto, ainda não está claro se essa relação é universal ou se ocorre apenas devido a características específicas desses países.
A maior parte dos estudos sobre o tema foi feita em sociedades ocidentais modernas, o que nos impede de saber se essa alteração hormonal é uma resposta biológica comum ao transtorno de estresse pós-traumático ou se está ligada a fatores ambientais e de estilo de vida dessas populações.

Outro problema das pesquisas anteriores é que elas geralmente analisam casos de transtorno de estresse pós-traumático resultantes de diferentes tipos de traumas, como violência, desastres naturais e acidentes. Além disso, os grupos estudados costumam ser muito diferentes entre si em aspectos como experiências de vida e condições socioeconômicas.
Isso torna difícil saber se as mudanças hormonais observadas são realmente causadas pelo transtorno de estresse pós-traumático ou por outros fatores que afetam a vida das pessoas.
Para entender melhor essa relação, pesquisadores realizaram um estudo com 60 homens, com idades entre 18 e 65 anos, da etnia Turkana, no Quênia. Esses participantes eram pastores e guerreiros que viviam em uma região de alto risco, frequentemente expostos a conflitos violentos envolvendo ataques para roubo de gado entre diferentes grupos étnicos.

Entre esses homens, 28% apresentavam sintomas graves de transtorno de estresse pós-traumático, o que os qualificaria para um possível diagnóstico da condição.
Para analisar o efeito do transtorno de estresse pós-traumático nos hormônios, os pesquisadores coletaram amostras de saliva em três momentos diferentes do dia e compararam os níveis de cortisol e testosterona entre aqueles com maior e menor gravidade dos sintomas.
Diferente do que estudos anteriores sugeriam, essa pesquisa não encontrou uma diferença significativa nos perfis hormonais entre os homens com e sem transtorno de estresse pós-traumático.

Isso sugere que a relação entre transtorno de estresse pós-traumático e a variação dos hormônios ao longo do dia pode não ser a mesma em todas as populações ou ambientes. Outra possibilidade é que, nos países ocidentais, outros fatores da vida, como estresse crônico, hábitos alimentares ou estilo de vida, influenciem a relação entre o transtorno de estresse pós-traumático e os hormônios.
Os resultados do estudo indicam que ainda há muito a ser descoberto sobre como o trauma afeta o funcionamento hormonal do corpo. Para entender melhor essa questão, é essencial realizar pesquisas em diferentes populações e ambientes, levando em conta variações culturais, ecológicas e biológicas.
Isso pode ajudar a esclarecer se o embotamento dos hormônios é realmente uma característica do transtorno de estresse pós-traumático ou apenas um efeito colateral de fatores específicos de determinados contextos.
LEIA MAIS:
Little evidence that posttraumatic stress is associated with diurnal hormone dysregulation in Turkana pastoralists
Matthew R Zefferman, Michael D Baumgarten, Benjamin C Trumble, Sarah Mathew
Evolution, Medicine, and Public Health, eoaf004, Published: 17 February 2025
Abstract:
Research in industrialized populations suggests that post-traumatic stress disorder may be associated with decreased cortisol or testosterone sensitivity, resulting in a blunted diurnal rhythm. However, the evolutionary implications of this association are unclear. Studies have primarily been conducted in Western industrialized populations, so we do not know whether hormonal blunting is a reliable physiological response to PTSD or stems from factors unique to industrialized settings. Furthermore, existing studies combine PTSD from diverse types of traumas, and comparison groups with and without PTSD differ along multiple dimensions, making it hard to know if PTSD or other life factors drive the blunted cortisol response. We conducted a study among n = 60 male Turkana pastoralists, aged between about 18-65 years in Kenya, exposed to high levels of lethal inter-ethnic cattle raiding. 28% of men in this area have PTSD symptom severity that would qualify them for a provisional PTSD diagnosis. Saliva samples were collected at three points to compare the cortisol and testosterone profiles of Turkana warriors with and without PTSD. Contrary to existing work, our preregistered analysis found little evidence for a difference in the hormonal profiles of warriors with high versus low PTSD symptom severity. Our results imply that the relationship between PTSD and hormonal diurnal variation may vary across populations and ecologies or that the association documented in Western populations stems from other correlated life factors. Studies in a wider range of populations and ecological contexts are needed to understand the evolutionary underpinnings of hormonal responses to trauma.



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