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Opioides Na Gravidez: Estudo Gigante Descarta Ligação Com Autismo e TDAH

  • Foto do escritor: Lidi Garcia
    Lidi Garcia
  • 6 de out.
  • 6 min de leitura
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Este estudo investigou se o uso de opioides prescritos para dor durante a gravidez aumenta o risco de autismo (TEA) e déficit de atenção e hiperatividade (TDAH) nas crianças. Analisando mais de 1,2 milhão de nascimentos na Suécia, os pesquisadores viram que, apesar de um risco maior aparecer em análises iniciais, ele praticamente desapareceu quando compararam irmãos e outros grupos de controle. Ou seja, os resultados sugerem que fatores familiares e ambientais, e não os remédios em si, explicam grande parte da associação. Apenas em casos de uso muito alto de opioides ainda não é possível descartar risco aumentado.


A dor é uma condição comum que afeta muitas pessoas que dão à luz, e, quando não é tratada de maneira adequada, pode impactar negativamente a qualidade de vida e o bem-estar no dia a dia. Embora o uso de analgésicos opioides prescritos (chamados AOPs) tenha diminuído nos últimos anos, ainda é relativamente comum durante a gravidez. 


A prevalência de uso varia bastante entre países: por exemplo, cerca de 3% das gestantes na Noruega, entre 2005 e 2015, receberam esse tipo de medicação, enquanto nos Estados Unidos, em 2019, aproximadamente 9% das beneficiárias do sistema Medicaid usaram opioides prescritos durante a gestação. 


Tanto os médicos que prescrevem como as pacientes grávidas enfrentam dilemas importantes ao decidir sobre o uso de analgésicos opioides prescritos nesse período, pois é preciso equilibrar os benefícios do alívio da dor com os possíveis riscos para o desenvolvimento do bebê.


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Estudos em animais já mostraram que a exposição a opioides durante a gestação pode afetar processos celulares e moleculares em fases críticas do desenvolvimento do sistema nervoso central. Essas alterações podem levar a mudanças estruturais e funcionais no cérebro, aumentando o risco de condições como o transtorno do espectro autista (TEA) e o transtorno do déficit de atenção e hiperatividade (TDAH), que estão entre os distúrbios de neurodesenvolvimento mais comuns.


Em humanos, alguns estudos também encontraram um aumento no risco de TEA e TDAH em crianças expostas a analgésicos opioides prescritos ainda no útero, especialmente quando a exposição ocorreu em doses mais altas ou por períodos mais longos. No entanto, os resultados ainda são inconsistentes e não está claro até que ponto essa associação é causada diretamente pelos medicamentos ou se reflete outros fatores de confusão, como características genéticas ou ambientais da família.


Alguns estudos reforçam essa incerteza. Por exemplo, uma pesquisa realizada com uma coorte nacional de nascimentos na Coreia do Sul encontrou um risco ligeiramente aumentado de transtornos neuropsiquiátricos em geral (7%), mas esse risco desapareceu quando os pesquisadores compararam irmãos, sugerindo que fatores familiares e não os opioides poderiam explicar a associação. 


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Já nos Estados Unidos, uma análise de dados de planos de saúde mostrou que crianças expostas por mais de 14 dias a opioides durante a gestação tiveram risco 70% maior de desenvolver transtornos do neurodesenvolvimento. Além disso, doses mais altas também se associaram a maior risco. Na Noruega, outro estudo encontrou risco 60% maior de TDAH em casos de exposição prolongada (cinco semanas ou mais).


Diante dessas incertezas, o presente estudo teve como principal objetivo investigar se o uso de analgésicos opioides prescritos na gravidez realmente aumenta o risco de TEA e TDAH em crianças. Para isso, os pesquisadores buscaram minimizar vieses e fatores de confusão que afetaram estudos anteriores. 


Eles usaram diferentes grupos de comparação, como crianças de mães que tinham condições dolorosas mas não receberam opioides, crianças de mães que tomaram opioides antes da gravidez mas não durante, e irmãos não expostos. 


Também utilizaram técnicas avançadas de análise de dados, como mineração de texto em prescrições, que permitiram avaliar não apenas se a mulher tomou analgésicos opioides prescritos, mas também a dose acumulada, a duração do tratamento e se a prescrição era para uso contínuo ou “conforme necessário”.


Além disso, os diagnósticos de TEA e TDAH foram feitos com base em registros clínicos validados, e o tempo de acompanhamento foi suficiente para garantir confiabilidade.


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Esse estudo foi conduzido na Suécia e analisou uma enorme coorte populacional. Para investigar o TEA, foram incluídas mais de 1,2 milhão de crianças nascidas entre 2007 e 2018, acompanhadas até 2021. Para TDAH, o número foi um pouco menor, cerca de 918 mil crianças, já que o diagnóstico tende a ocorrer mais tarde e exigiu um período de acompanhamento diferente. 


Os pesquisadores identificaram a exposição aos analgésicos opioides prescritos a partir de registros de prescrições preenchidas. Entre as crianças analisadas, quase metade era do sexo feminino, e 4,4% foram expostas a analgésicos opioides prescritos durante a gestação.


Os resultados mostraram que, aos 10 anos de idade, 2% das crianças que não foram expostas a analgésicos opioides prescritos tinham diagnóstico de TEA, contra 2,9% das expostas a doses baixas e 3,6% das expostas a doses altas. Em análises iniciais, sem ajuste para fatores de confusão, a associação parecia clara: quanto maior a dose, maior o risco. 


Mesmo após ajustes para algumas variáveis medidas, as associações ainda apareciam. Porém, quando os pesquisadores usaram modelos mais sofisticados, como comparar com crianças de mães que usaram opioides antes, mas não durante a gravidez, ou comparar irmãos, as associações desapareceram ou se tornaram mínimas. Esse mesmo padrão foi encontrado quando se analisou o TDAH.


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Uma limitação do estudo é que, na Suécia, a distribuição das doses e do tempo de uso dos analgésicos opioides prescritos durante a gravidez não incluiu muitas situações de exposição extremamente alta, o que dificulta afirmar se, em casos mais graves, o risco poderia ser maior.


Em conclusão, os resultados indicam que, embora não se possa descartar completamente riscos associados ao uso de doses muito altas de opioides na gravidez, grande parte das associações observadas em estudos anteriores provavelmente se deve a fatores de confusão familiares ou ambientais, e não a um efeito direto dos medicamentos.


Isso significa que, nos níveis de exposição observados nesta coorte, a relação entre analgésicos opioides prescritos na gravidez e TEA ou TDAH parece ser mais fraca do que se supunha.



LEIA MAIS:


Prescribed opioid analgesic use in pregnancy and risk of neurodevelopmental disorders in children: A retrospective study in Sweden. 

Emma N. Cleary, Ayesha C. Sujan, Martin E. Rickert, Franziska Fischer, Tyra Lagerberg, Zheng Chang, Paul Lichtenstein, Patrick D. Quinn, Anna Sara Öberg, and Brian M. D’Onofrio

PLoS Med 22(9): e1004721. 


Abstract: 


The extent to which the documented association between prenatal prescribed opioid analgesic (POA) exposure and neurodevelopmental disorders in children is causal or due to confounding is unknown. The objective of this study was to evaluate associations between dose and duration of POA exposure during pregnancy and autism spectrum disorder (ASD) or attention-deficit/hyperactivity disorder (ADHD) in children while minimizing bias due to confounding and other sources. This retrospective study analyzed a population-based cohort of births using national register data from Sweden. The ASD analysis cohort consisted of 1,267,978 children born in Sweden from July 1st, 2007 to December 31st, 2018, with follow-up through 2021. A shorter eligibility period was used to study ADHD given its later age of typical diagnosis, consisting of 918,771 children born through December 31st, 2015. Text-mining algorithms were used to derive cumulative dose and duration of POA exposure during pregnancy from filled POA prescriptions, as well as to identify prescriptions that were to be taken on an “as needed” basis. Outcomes were identified through inpatient or outpatient clinical diagnosis of ASD and ADHD or dispensed ADHD medications. Cox proportional hazards regression models were adjusted for measured covariates from multiple domains. Several designs were used to help address unmeasured confounding: comparisons with children whose birthing parent had a diagnosed painful condition but did not receive POAs, children whose birthing parent received POAs in the year before but not during pregnancy, and siblings who were not exposed to POAs. Of the 1,267,978 children, 48.6% were female and 4.4% were exposed to POAs during pregnancy. At age 10, cumulative incidence of ASD was 2.0% among children unexposed to POAs, 2.9% among children exposed to a low dose across pregnancy, and 3.6% among children exposed to a high dose. In unadjusted models (e.g., hazard ratio [HR]high, 1.74, 95% confidence interval [CI], 1.63, 1.87) and when accounting for measured covariates, cumulative maximum dose was associated with increased risk of ASD (e.g., HRhigh, 1.34, 95% CI, 1.24, 1.44). However, the associations were largely or fully attenuated when using alternative designs (particularly when comparing to children whose birthing parent received POAs before but not during pregnancy: HRhigh, 1.10, 95% CI, 1.00, 1.21). No associations were observed in the sibling comparison (HRhigh, 0.99, 95% CI, 0.81, 1.21). This overall pattern of associations was also observed when considering duration of exposure, and in numerous sensitivity analyses, as well as for analyses of ADHD. A main limitation of this study was that the distribution of dose and duration of POAs prescribed to birthing parents in Sweden limited our ability to explore the effects of extremely high dose and duration on risk for neurodevelopmental disorders. While increased risks with high amounts of POA exposure cannot be ruled out, the results suggest that confounding may largely explain the increased risks of ASD and ADHD associated with prenatal POA exposure at the levels observed in this cohort.

 
 
 

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