Autismo e TDAH: Quando os Sintomas Se Encontram no Cérebro
- Lidi Garcia
- há 3 dias
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Autismo e TDAH apresentam sintomas que frequentemente se sobrepõem. Esse estudo analisou 166 crianças com diagnóstico de autismo ou TDAH para investigar se essa sobreposição tem base biológica. Os resultados mostraram que sintomas autistas, mas não sintomas de TDAH, estão relacionados à conectividade funcional entre regiões específicas do cérebro. Além disso, os genes associados a essa conectividade também estão ligados às duas condições, sugerindo uma base genética compartilhada.
Nos últimos anos, pesquisadores começaram a olhar para condições neuropsiquiátricas de uma forma diferente. Antes, os estudos comparavam pessoas com diagnóstico e pessoas sem diagnóstico. Agora, existe um interesse maior em entender os sintomas de maneira dimensional, ou seja, observando como se manifestam em graus diferentes, mesmo entre diagnósticos diferentes.
Esse tipo de abordagem é especialmente útil quando falamos sobre autismo e TDAH. Embora sejam considerados diagnósticos distintos, existe muita sobreposição entre eles. Muitas crianças com autismo apresentam sintomas de TDAH, e muitas crianças com TDAH apresentam características autistas.
Estudos clínicos mostram que essa combinação é bastante comum: entre crianças com autismo, entre 28% e 80% também apresentam sintomas de TDAH. Da mesma forma, até um terço das crianças com TDAH apresentam traços do espectro autista.

Essa sobreposição torna o diagnóstico mais difícil e pode prejudicar o tratamento, pois cada indivíduo apresenta um perfil único. Por isso, muitos especialistas defendem uma abordagem transdiagnóstica, que analisa os sintomas em vez de depender apenas de categorias diagnósticas rígidas.
No campo da genética, há cada vez mais evidências de que o autismo e o TDAH compartilham fatores hereditários. Essas duas condições costumam aparecer na mesma família e apresentam correlações genéticas moderadas.
Pesquisadores acreditam que muitos genes envolvidos em ambas as condições ainda não foram descobertos. No entanto, os genes já identificados estão relacionados ao desenvolvimento do cérebro, comunicação entre neurônios e regulação da atividade neuronal.
Apesar dessas descobertas, ainda não está claro se esses genes compartilham padrões semelhantes de expressão no cérebro, especialmente em regiões ligadas ao comportamento e comunicação social, áreas frequentemente associadas ao autismo e ao TDAH.
Do ponto de vista da neuroimagem, há evidências de que tanto o TDAH quanto o autismo estão ligados a diferenças na conectividade funcional do cérebro. Essa conectividade pode ser estudada por meio de ressonância magnética funcional em repouso, que permite observar como diferentes regiões do cérebro se comunicam entre si quando a pessoa não está realizando uma tarefa específica.

Até agora, poucos estudos examinaram diretamente a relação entre conectividade cerebral e sintomas dimensionais de ambos os diagnósticos dentro do mesmo grupo de participantes.
Os resultados existentes são mistos: alguns estudos não encontraram associação clara, enquanto outros sugeriram que a conectividade cerebral pode estar relacionada à gravidade dos sintomas, mas ainda sem separar completamente o que está ligado ao autismo ou ao TDAH.
Com base nesse contexto, o estudo descrito teve como objetivo investigar como as diferenças individuais nos sintomas de autismo e TDAH se relacionam com a conectividade funcional do cérebro e com padrões genéticos específicos. Participaram 166 crianças com idade entre 6 e 12 anos, todas com diagnóstico rigoroso de autismo ou TDAH, mas sem deficiência intelectual. Todas passaram pelos mesmos testes clínicos, entrevistas com pais e exames de imagem.

Os resultados mostraram uma associação clara entre a gravidade dos sintomas autistas e a conectividade entre duas regiões cerebrais: o giro frontal médio (envolvido em funções executivas) e o córtex cingulado posterior (parte da rede de modo padrão, associada ao pensamento interno e autoconsciência).
Quanto maior a conectividade entre essas regiões, mais intensos eram os sintomas autistas, independentemente da presença de sintomas de TDAH. Isso sugere que essa conexão cerebral pode ser um marcador transdiagnóstico específico relacionado ao autismo. Por outro lado, não foram encontradas associações significativas entre sintomas de TDAH e conectividade cerebral nesse estudo.

Uma etapa adicional mostrou que os genes associados aos padrões de conectividade observados eram os mesmos já ligados ao autismo e ao TDAH em pesquisas anteriores, especialmente genes envolvidos em projeções neuronais e desenvolvimento cerebral. Isso reforça a hipótese de que existe uma base biológica compartilhada entre alguns sintomas das duas condições.
No geral, os resultados destacam a importância de analisar sintomas como dimensões contínuas e não apenas como categorias diagnósticas separadas. Essa abordagem pode ajudar a compreender melhor os mecanismos biológicos compartilhados, melhorar diagnósticos futuros e apoiar intervenções mais personalizadas.
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Connectome-based symptom mapping and in silico related gene expression in children with autism and/or attention-deficit/hyperactivity disorder
Patricia Segura, Marco Pagani, Somer L. Bishop, Phoebe Thomson, Stan Colcombe, Ting Xu, Zekiel Z. Factor, Emily C. Hector, So Hyun Kim, Michael V. Lombardo, Alessandro Gozzi, Xavier F. Castellanos, Catherine Lord, Michael P. Milham, and Adriana Di Martino
Molecular Psychiatry. 23 October 2025
Abstract:
Clinical, neuroimaging and genomics evidence have increasingly underscored a degree of overlap between autism and attention-deficit/hyperactivity disorder (ADHD). This study explores the specific contribution of their core symptoms to shared biology in N = 166 verbal children (6–12 years) with rigorously-established primary diagnoses of either autism or ADHD (without autism). We investigated the associations between inter-individual differences in low motion whole-brain intrinsic functional connectivity (iFC) and dimensional measures of autism and ADHD symptoms indexed by clinician-based observation and parent interview, respectively. Additionally, we explored their linked gene expression patterns in silico. Whole-brain multivariate distance matrix regression revealed a transdiagnostic association between autism severity and iFC of two nodes primarily on the left hemisphere: the middle frontal gyrus of the frontoparietal network and the posterior cingulate cortex of the default mode network. Across children, the greater the iFC between these nodes, the more severe the autism symptoms, even after controlling for ADHD ratings. Results from secondary segregation analyses were consistent with primary findings, underscoring the significance of internetwork iFC for autism symptom severity across diagnoses. No statistically significant brain-behavior relationships were observed for ADHD symptoms. Genetic enrichment analyses of the iFC maps associated with autism symptoms implicated genes known to: (i) have greater rate of variance in autism and ADHD, and (ii) be involved in neuron projections, suggesting shared genetic mechanisms for this specific brain-clinical phenotype. These findings underscore the relevance of transdiagnostic dimensional approaches in linking clinically-defined and observation-based phenomena to shared presentations at the macroscale circuit- and genomic-levels across diagnoses.



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