top of page

Neurônios Da Abstinência: Por Que o Cérebro Nos Empurra de Volta ao Álcool

  • Foto do escritor: Lidi Garcia
    Lidi Garcia
  • 30 de set
  • 4 min de leitura
ree

Este estudo mostrou que o cérebro forma grupos específicos de neurônios que registram a associação entre beber álcool e o alívio dos sintomas negativos da abstinência. Esses circuitos parecem estar por trás da busca compulsiva pelo álcool e ajudam a explicar por que recaídas acontecem com tanta frequência em pessoas dependentes.


O cérebro humano e o de outros animais têm uma capacidade fundamental: aprender a associar certos estímulos do ambiente (sons, cheiros, lugares, objetos) com experiências boas ou ruins. Esse tipo de aprendizagem é chamado de condicionamento. 


Ele funciona assim: se um estímulo é seguido por algo agradável, ele passa a ser visto como recompensador; se for seguido por algo desagradável, ele é visto como aversivo. Esse processo é vital para a sobrevivência, pois nos ajuda tanto a procurar coisas boas (como comida e abrigo) quanto a evitar situações perigosas.


No caso da dependência de drogas, essas associações podem se tornar muito fortes. Por exemplo: uma pessoa dependente de álcool pode aprender a associar certos lugares ou situações com o alívio imediato dos sintomas ruins da abstinência (ansiedade, mal-estar, tristeza). Nesse caso, o cérebro aprende que beber não é só prazeroso, mas também uma forma de escapar do sofrimento. 


ree

Esse mecanismo é chamado de reforço negativo, porque o comportamento (beber) serve para tirar algo desagradável (os sintomas da abstinência). Esse aprendizado acaba sendo muito poderoso e pode levar ao comportamento compulsivo, no qual a pessoa continua bebendo mesmo quando sabe que isso traz consequências ruins.


Os cientistas queriam entender melhor quais grupos de neurônios no cérebro estão envolvidos nesse tipo de aprendizagem. Quando o cérebro recebe estímulos motivacionais (como sinais ligados à bebida ou à abstinência), apenas alguns neurônios específicos são ativados. Esses pequenos grupos são chamados de conjuntos neuronais. 


A ideia do estudo foi investigar como esses conjuntos participam na busca compulsiva por álcool, especialmente quando o consumo está ligado ao alívio dos sintomas negativos da abstinência. Para isso, os pesquisadores do The Scripps Research Institute, USA, usaram ratos como modelo experimental. 


ree

Eles dividiram os animais em diferentes grupos para poder comparar situações:


- Grupo dependente com aprendizagem ligada à abstinência (DEP-WDL): ratos que desenvolveram dependência de álcool e aprenderam a associar sinais ambientais com o alívio da abstinência quando bebiam.


- Grupo não dependente com aprendizagem ligada à abstinência (NDEP-WDL): ratos que não eram dependentes, mas também passaram por situações de aprendizagem.


- Grupo dependente sem aprendizagem ligada à abstinência (DEP-NWDL): ratos dependentes, mas sem associação entre estímulos e abstinência.


- Grupo não dependente sem aprendizagem (NDEP-NWDL): grupo de controle, sem dependência e sem associações com abstinência.


Dessa forma, os cientistas puderam isolar os efeitos de ser dependente ou não, e ter passado ou não pelo processo de aprendizagem de que o álcool alivia sintomas ruins.


ree

Depois, eles analisaram quais neurônios eram ativados em regiões específicas do cérebro quando os ratos eram expostos aos estímulos associados ao álcool. Isso foi feito medindo a atividade neuronal em áreas como o núcleo paraventricular do tálamo, a amígdala central e o estriado dorsal, regiões conhecidas por estarem ligadas às emoções, motivação e comportamento compulsivo.


Os cientistas descobriram que populações específicas de neurônios nessas regiões eram ativadas quando o comportamento estava relacionado ao reforço negativo (alívio da abstinência). Isso significa que existem circuitos cerebrais distintos que codificam essa aprendizagem e que podem estar diretamente ligados à vulnerabilidade de recaída em dependentes de álcool. 


ree

Ilustração resumida neuroanatômica do recrutamento de neurônios ativos associados à busca de álcool induzida por contexto em ratos com experiência em WDL e consumo dependente (B) versus busca de álcool induzida pelo mesmo contexto em ratos não dependentes com histórico de consumo social (A). BLA, amígdala basolateral; CeA, amígdala central; DEP, dependente; DS, estriado dorsal; IL, córtex infralímbico; LH, hipotálamo lateral; NAc, núcleo accumbens; NDEP, não dependente; PL, córtex pré-límbico; PVT, núcleo paraventricular do tálamo; WDL, aprendizagem relacionada à abstinência.


Esses achados mostram que a compulsão pelo álcool não surge apenas porque ele dá prazer, mas também porque o cérebro aprende que ele alivia estados de sofrimento. 


Esse tipo de aprendizado fica gravado em grupos neuronais específicos, o que pode explicar por que é tão difícil parar de beber e por que as recaídas são comuns. Entender esses mecanismos abre caminho para desenvolver tratamentos mais eficazes contra a dependência, focando justamente nesses circuitos cerebrais.



LEIA MAIS:


Recruitment of Neuronal Populations in the Paraventricular Thalamus of Alcohol-Seeking Rats With Withdrawal-Related Learning Experience

Hermina Nedelescu, Elias Meamari, Nami Rajaei, Alexus Grey, Ryan Bullard, Nathan O’Connor, Nobuyoshi Suto, and Friedbert Weiss

Biological Psychiatry Global Open Science.Volume 5, Issue 6, November 2025, 100578.DOI: 10.1016/j.bpsgos.2025.100578


Abstract: 


Stimulus-reactive neuronal populations are groups of neurons that become activated by environmental stimuli. These sparsely activated neuronal assemblies are implicated in encoding associations between environmental contexts and subjectively rewarding or aversive experiences that regulate behavior. How positive or negative hedonic states are represented in brain neurocircuits is a fundamental question relevant for understanding the processing of emotionally meaningful stimuli that drive appropriate versus maladaptive behavior. It is well known that animals avoid noxious stimuli and experiences. However, little is known about how the conditioning of environmental stimuli to behavior that leads to amelioration of dysphoric states establishes powerful associations that lead to compulsive maladaptive behavior. Here, we sought to identify stimulus-reactive neurons that may mediate the conditioned effects of environmental stimuli associated with the reversal of dysphoric alcohol withdrawal states using a dependent withdrawal-related learning (WDL) experimental condition (DEP-WDL) (N = 13) and 3 controls: nondependent WDL (NDEP-WDL) (N = 12), dependent no-WDL (DEP-NWDL) (N = 9), NDEP-NWDL (N = 9). The results document a role for clusters of neurons in the paraventricular nucleus of the thalamus (N = 8), the central nucleus of the amygdala (N = 8), and the dorsal striatum (N = 9) in this conditioned negative reinforcement process. These findings suggest that associations between reversal of negative hedonic states and environmental contexts are encoded in distinct neuronal populations that may serve as a neural substrate of compulsive alcohol seeking and vulnerability to relapse associated with reward dysregulation and hedonic allostasis.

 
 
 

Comentários


© 2020-2025 by Lidiane Garcia

bottom of page