HIIT na Adolescência: Uma Barreira Contra a Dependência De Cocaína
- Lidi Garcia
- 23 de set.
- 4 min de leitura

O uso crônico de cocaína causa alterações cerebrais ligadas à dependência. Pesquisadores mostraram que o treinamento intervalado de alta intensidade (HIIT) durante a adolescência reduziu a atração pela droga em ratos e aumentou os níveis da proteína ΔFosB, sugerindo que o exercício pode proteger contra o abuso de substâncias.
Em 2019, estimou-se que cerca de 23 milhões de pessoas com 12 anos ou mais sofriam de transtorno por uso de substâncias. Entre as drogas mais consumidas, a cocaína ocupa o segundo lugar no mundo, ficando atrás apenas da cannabis.
Essa droga atua no cérebro aumentando os níveis de dopamina, um neurotransmissor relacionado à sensação de prazer e recompensa. Isso acontece porque a cocaína bloqueia a recaptação de dopamina, ou seja, impede que ela seja removida do espaço entre os neurônios, intensificando seus efeitos.
O uso repetido e crônico da cocaína provoca mudanças estruturais no cérebro, como maior ramificação dos dendritos e aumento da quantidade de espinhos dendríticos em regiões ligadas ao prazer e ao controle do comportamento, como o núcleo accumbens e o córtex pré-frontal. Essas alterações reforçam a busca pela droga.
Outro fator associado é o aumento da proteína ΔFosB, que se acumula após a exposição crônica à cocaína e está diretamente ligada a comportamentos de dependência.

Diversos estudos anteriores mostraram que a prática de exercícios pode ajudar tanto na prevenção quanto no tratamento do abuso de drogas. Isso acontece porque a atividade física também altera o metabolismo do cérebro, inclusive nas mesmas regiões ativadas pelo uso da cocaína.
Em animais de laboratório, já foi observado que o exercício diminui a atração pela cocaína, reduz as recaídas induzidas por gatilhos externos (como lembrar da droga) e até bloqueia recaídas causadas pelo estresse. Em seres humanos, exercícios físicos foram associados à diminuição do desejo e do consumo da droga.
Nem todo tipo de exercício tem o mesmo impacto. O treinamento intervalado de alta intensidade (HIIT, na sigla em inglês) mostrou-se mais eficaz do que o exercício contínuo de intensidade moderada (MICT). Entre seus benefícios estão: maior melhora da capacidade cardiorrespiratória (VO2 máx), redução da resistência à insulina, controle da glicemia, melhora da memória de trabalho e maior chance de adesão em pessoas sedentárias.
Estudos anteriores avaliaram o exercício contínuo (MICT) em adolescentes e observaram que ele diminuiu a atração futura pela cocaína em fêmeas, mas não em machos. Até então, nenhum estudo havia testado os efeitos do HIIT nessa fase da vida em relação à cocaína.

Neste estudo, pesquisadores da University at Buffalo, USA, investigaram o impacto do HIIT durante a adolescência na atração pela cocaína em ratos machos da linhagem Lewis.
Os ratos do grupo de exercício foram colocados em uma esteira por 30 minutos por dia, realizando dez ciclos de três minutos cada, durante seis semanas. A velocidade da esteira foi aumentada progressivamente até chegar a 0,8 milhas por hora (21,5 metros por minuto).
Após esse período, os animais foram submetidos a um teste chamado preferência de lugar condicionada (PPC), que avalia se eles passam mais tempo em um ambiente associado à cocaína. A droga foi administrada em uma dose de 25 miligramas por quilo de peso.
Depois do teste comportamental, os cérebros dos ratos foram analisados para medir os níveis da proteína ΔFosB no estriado, uma região relacionada à motivação e ao controle de hábitos.

Os resultados mostraram que os ratos que praticaram HIIT apresentaram:
- 19% menos tempo gasto no ambiente associado à cocaína, indicando menor atração pela droga (B).
- 65% mais níveis de ΔFosB no estriado em comparação aos ratos sedentários (A).
Isso sugere que o exercício HIIT durante a adolescência tem um efeito protetor contra o abuso de cocaína, possivelmente por meio do aumento da ΔFosB. Embora essa proteína seja conhecida por seu papel na dependência, neste caso parece estar associada a um mecanismo de adaptação que ajuda a reduzir a vulnerabilidade à droga.

Esses achados são relevantes porque reforçam a ideia de que o exercício, especialmente o HIIT, pode ser uma ferramenta eficaz na prevenção e no tratamento do uso de drogas. Como o estudo foi feito apenas em machos, os pesquisadores destacam a importância de realizar novos experimentos também com fêmeas e de investigar mais profundamente os mecanismos biológicos que explicam esse efeito.
LEIA MAIS:
High Intensity Interval Training (HIIT) exercise in adolescent rats results in cocaine place aversion and ΔFosB induction
Nikki Hammond, Nabeel Rahman, Sam Zhan, Mark S. Gold, Kenneth Blum,
Teresa Quattrin, Yun Young Yim, Eric J. Nestler, and Panayotis K. Thanos
PLoS One. 20(9): e0316228.
Abstract:
High-Intensity Interval Training (HIIT) is a form of exercise that has been greatly popularized over the past few years for its many health benefits. Similar to other forms of exercise, HIIT may be beneficial in the prevention of substance use behaviors; however, the extent to which HIIT can impact the reinforcing effects of drugs of abuse during adolescence has not been fully evaluated. Here, we assess the effects of HIIT during adolescence on subsequent cocaine conditioned place preference (CPP) in male Lewis rats. The HIIT exercise exposed rats ran on a treadmill for 30 minutes daily (ten three-minute cycles) for six weeks with progressive speed-increased up to 0.8 mph (21.5m/min), while the sedentary rats remained in their home cage. Following the six weeks of exercise, rats were tested for cocaine (25 mg/kg) CPP. Following completion of the behavior test ∆FosB levels were measured in the brain. Results showed that the HIIT rats showed significantly attenuated place preference (−19%) in their time spent in the cocaine-paired chamber compared to the sedentary environment rats. In addition, HIIT rats had significantly higher (65%) striatum ∆FosB levels compared to the sedentary rats. Our findings show that HIIT exercise during adolescence could be protective against cocaine abuse which may be mediated by an increase in ∆FosB. This finding has important clinical implications with respect to exercise mediated protection against substance misuse and abuse. Future studies will examine this effect in females as well as the potential underlying mechanisms.



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