top of page

Laticínios Noturnos: Um Convite Para Sonhos Perturbadores

  • Foto do escritor: Lidi Garcia
    Lidi Garcia
  • 9 de jul.
  • 4 min de leitura
ree

Pesquisas mostram que o que comemos pode influenciar nossos sonhos e a qualidade do sono. Alimentos como doces e laticínios estão ligados a mais pesadelos, especialmente em pessoas com intolerâncias como à lactose. Já uma alimentação saudável e evitar comer à noite podem melhorar o sono e tornar os sonhos mais agradáveis.


Por séculos, muitas pessoas acreditaram que certos alimentos, especialmente os mais pesados ou condimentados, podem provocar sonhos estranhos ou até pesadelos. Quem nunca ouviu que “comer queijo antes de dormir dá pesadelo”? 


Essa ideia não é nova: no início do século XX, o cartunista Winsor McCay já retratava personagens tendo sonhos bizarros após comer pratos de queijo, como o famoso rarebit galês (torrada com queijo derretido e pimenta).


Embora essas crenças sejam comuns no imaginário popular, até recentemente havia pouca pesquisa científica para sustentá-las. Hoje, no entanto, a ciência começa a investigar essa conexão de forma mais sistemática e com ferramentas modernas. 

ree

Estudos preliminares descobriram que o que comemos pode sim estar relacionado ao tipo e à frequência dos nossos sonhos. Por exemplo, pessoas que consomem mais frutas relatam mais sonhos lúcidos (aqueles em que sabemos que estamos sonhando), enquanto o consumo de doces está associado a pesadelos mais frequentes. 


No entanto, esses estudos ainda enfrentam limitações, pois fatores como idade, personalidade e estilo de vida também influenciam os sonhos, e, quando esses fatores são considerados, algumas dessas associações desaparecem. Ou seja, ainda não é possível tirar conclusões definitivas.


Uma linha de pesquisa mais recente buscou entender não apenas se a comida influencia os sonhos, mas como isso poderia acontecer. Um estudo com quase 400 estudantes universitários mostrou que quase 18% deles acreditavam que seus sonhos eram influenciados pelo que comiam, e os laticínios foram os alimentos mais citados. 

ree

Esses mesmos estudantes também relataram ter sonhos mais perturbadores e menos confiança em seus próprios sinais de fome e saciedade, além de maior tendência a comer por razões emocionais. 


Com base nesses achados, os cientistas propuseram várias explicações possíveis para a ligação entre comida e sonhos. Uma hipótese é que certos alimentos de fato afetam diretamente o cérebro e os sonhos (por exemplo, estimulantes ou alimentos ricos em açúcar). 


Outra possibilidade é que a comida cause desconforto físico, como sintomas gastrointestinais provocados por intolerâncias alimentares, que, por sua vez, afetam o conteúdo dos sonhos. 


Há ainda a ideia de que algumas pessoas simplesmente atribuem ao que comeram coisas que, na verdade, têm outras causas (como estresse). E, por fim, há a hipótese de que a comida afete a qualidade do sono, o que indiretamente influencia os sonhos, essa última hipótese tem sido cada vez mais apoiada por estudos.


Pesquisas maiores e mais recentes confirmam que a relação entre alimentação e sono é real. Um estudo com mais de mil participantes investigou se certos alimentos alteram o sono e os sonhos. 


Cerca de 40% das pessoas disseram que a comida afeta seu sono (melhorando ou piorando), e 5,5% relataram que ela afeta especificamente seus sonhos. Os doces e os laticínios foram novamente os principais alimentos citados como causadores de sonhos ruins. 

ree

Além disso, pessoas com alergias alimentares, intolerância à lactose ou ao glúten também relataram mais pesadelos. A intolerância à lactose, por exemplo, parece causar sintomas gastrointestinais que prejudicam o sono, e isso, por sua vez, aumenta a chance de ter pesadelos.


Por outro lado, hábitos alimentares mais saudáveis, como evitar comer à noite ou manter uma dieta equilibrada, estiveram associados a uma melhor recordação dos sonhos e a menos experiências negativas durante o sono. Já uma alimentação desregrada, especialmente à noite, foi associada a sonhos mais perturbadores e de conteúdo mais negativo.

ree

Em resumo, embora ainda haja muito a ser estudado, as evidências atuais indicam que sim: a comida pode influenciar tanto a qualidade do sono quanto o conteúdo dos sonhos. Isso pode acontecer por meio de efeitos diretos no cérebro, de desconfortos físicos ou de mudanças no padrão de sono. 


A boa notícia é que essas descobertas podem abrir caminho para novas formas de melhorar o sono e até prevenir pesadelos, simplesmente ajustando a alimentação. Uma área da ciência que, até pouco tempo atrás, era considerada folclórica, hoje começa a ser levada a sério pela neurociência.



LEIA MAIS:


More dreams of the rarebit fiend: food sensitivity and dietary correlates of sleep and dreaming

Tore Nielsen, Jade Radke, Claudia Picard-Deland, and Russell Arnold Powell 

Front. Psychol., 01 July 2025. Volume 16 - 2025 


Abstract: 


Background: Despite centuries-old beliefs and anecdotal evidence that food can influence one's sleep and dreams—an example being the classic Dream of the Rarebit Fiend cartoon series—the topic has only rarely been researched.

Methods: We asked 1,082 participants to complete an online survey to test specific hypotheses on why people perceive that food affects their dreams, including whether specific foods influence dreams directly (food-specific effects), through physiological symptoms (food distress), or via altered sleep quality (sleep effects). Survey measures included standard demographic variables, targeted probes about self-perceived effects of specific foods on dreams, questions about diet, food intolerances and allergies, personality questionnaires, measures of sleep quality (Pittsburgh Sleep Quality Index) and the Nightmare Disorder Index.

Results: A total of 40.2% of participants reported that certain foods either worsened (24.7%) or improved (20.1%) their sleep, while 5.5% of participants reported that food affected their dreams. The perceived effect of food on dreams was associated with higher nightmare recall and Nightmare Disorder Index scores, with changes being blamed primarily on desserts/sweets (31%) and dairy (22%). The effect was also associated with food allergies and Gluten Intolerance, while worse sleep perceptions were tied to Lactose Intolerance. Nightmare Disorder Index scores were strongly associated with Food Allergy and Lactose Intolerance, the latter being mediated by the severity of gastrointestinal symptoms. Healthy eating, such as less evening eating, predicted higher dream recall, while unhealthy eating—including gastric symptoms, lower reliance on hunger and satiety cues, and evening eating—predicted nightmares and dream negativity.

Conclusions: These results support the food-specific effects, food distress, and sleep effects hypotheses to varying degrees. They replicate associations between diet and dream features, highlighting food sensitivities, particularly Lactose Intolerance, as contributors to nightmare prevalence. Findings open new avenues of research on food-dependent dreaming by suggesting dairy-induced gastrointestinal symptoms as one plausible basis for bizarre or disturbing dreams. They have clear implications for understanding how dietary factors may influence sleep quality and the occurrence of nightmares and could inform non-pharmacological interventions for sleep disturbances.

 
 
 

Comentários


© 2020-2025 by Lidiane Garcia

bottom of page