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Resumo:
“O homem não se preocupa tanto com problemas reais quanto com suas ansiedades imaginárias sobre problemas reais.”
— Epictetus
Um exame de sangue recém-desenvolvido detecta biomarcadores específicos associados à ansiedade, permitindo prever o risco de uma pessoa desenvolver o transtorno. Além disso, essa ferramenta também ajuda a monitorar a gravidade dos sintomas em indivíduos que já apresentam ansiedade, proporcionando um acompanhamento mais preciso.
Ansiedade é um estado de aumento da reatividade a eventos que são percebidos como desafiadores, ameaçadores ou prejudiciais. Em pacientes psiquiátricos, essa condição pode ser agravada por uma trajetória de vida marcada por adversidades.
Por isso, esses pacientes representam uma amostra de estudo ideal para a identificação de biomarcadores sanguíneos que possam ser utilizados de forma generalizada e transdiagnóstica, ou seja, aplicáveis a diferentes transtornos mentais, inclusive a ansiedade.
Devido à falta de testes objetivos disponíveis para diagnosticar e monitorar a ansiedade, a condição muitas vezes é subdiagnosticada e tratada de maneira inadequada. Isso pode levar a eventos adversos ao longo da vida, como hospitalizações, além do risco de desenvolvimento de dependências e até suicídios.
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A identificação de biomarcadores específicos eliminaria a subjetividade associada às avaliações atuais, fornecendo uma melhor estimativa do risco de desenvolvimento do transtorno, além de auxiliar na orientação de tratamentos mais eficazes. Um biomarcador é uma substância ou característica no corpo que pode ser medida para indicar a presença ou progresso de uma doença ou a resposta a um tratamento.
Um estudo da Indiana University, publicado na Molecular Psychiatry, buscou identificar esses biomarcadores através de uma abordagem sistemática e em múltiplas etapas.
Primeiramente, os pesquisadores realizaram um estudo longitudinal com pacientes psiquiátricos, observando mudanças na expressão gênica no sangue durante fases de baixa e alta ansiedade, medidas por uma escala desenvolvida pela equipe, a Simplified Anxiety Scale (SAS-4). Essa escala é semelhante à Simplified Mood Scale (SMS-7), que já havia sido publicada anteriormente.
Em uma segunda etapa, os pesquisadores utilizaram a abordagem de Convergent Functional Genomics (CFG), que integra dados anteriores de estudos em humanos e modelos animais, para priorizar os biomarcadores mais relevantes.
Em seguida, validaram os principais biomarcadores em uma coorte independente de pacientes com ansiedade grave, identificando 95 biomarcadores candidatos. Esses biomarcadores foram então testados para prever a gravidade da ansiedade e o risco de piora clínica (como hospitalizações).
Utilizando dados de acompanhamento de prontuários médicos e a amostra sanguínea dos pacientes, os pesquisadores puderam identificar os biomarcadores mais eficazes na previsão do agravamento da ansiedade.
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Os biomarcadores com melhor evidência geral foram GAD1, ERCC6L2, NTRK3, ADRA2A, FZD10, GRK4, SLC6A4, ATP1B2, NRG1, CLIC6, EFNA5, GPX7, SLC6A2 e TMEM138.
O GAD1 (Glutamato Descarboxilase 1), o principal biomarcador geral para ansiedade neste estudo, sintetiza ácido gama-aminobutírico (GABA) a partir do glutamato. Anormalidades no sistema neurotransmissor GABA foram observadas em indivíduos com transtornos de humor e ansiedade.
Alem disso, o GAD1 tem evidências genéticas anteriores em transtornos de ansiedade e pânico. Sua expressão no sangue é aumentada em casos de alta ansiedade, com resultados sendo um pouco melhores em mulheres. Ele também prevê futuras hospitalizações com ansiedade em todos.
Outro importante biomarcador identificado foi o ERCC6L2, cuja expressão foi diminuída 68% em estados de alta ansiedade. Em homens, especialmente aqueles com transtorno bipolar, a expressão de ERCC6L2 apresentou diminuição de 72% transversalmente. Além disso, em homens com depressão, a expressão do gene foi altamente preditiva de ansiedade clínica (100%).
O biomarcador SLC6A2, apresentou aumento de expressão em estados de alta ansiedade, sendo 63% em homens e 76% em mulheres. Esse gene codifica o transportador de norepinefrina, e a descoberta reforça a importância de medicamentos que inibem esse transportador no tratamento de transtornos de ansiedade.
Também foi detectada a relevância do gene SLC6A4, associado ao transportador de serotonina, que já é alvo de medicamentos como os inibidores seletivos da recaptação de serotonina (ISRS).
Sabe-se que vários biomarcadores individuais de ponta são modulados por medicamentos em uso clínico atual para tratar transtornos afetivos e suicídio, como lítio (GAD1, ATP1B2, NRG1), os ácidos graxos ômega-3 nutracêuticos (GAD1, CLIC6, EFNA5, SLC6A4) e antidepressivos (ADRA2A, FZD10, GPX7, SLC6A2, SLC6A4, TMEM138). Isso é de utilidade potencial em abordagens farmacogenômicas que combinam pacientes ansiosos e suicidas com os medicamentos certos e monitoram a resposta ao tratamento.
Os pesquisadores também realizaram uma análise detalhada das redes de proteínas interativas associadas a esses biomarcadores. Por exemplo, o gene HTR2A foi identificado como parte de uma rede que inclui GAD1, GABBR1 e o transportador de serotonina SLC6A4.
Esses genes são alvos de tratamentos tradicionais para a ansiedade, como os ISRS e benzodiazepínicos. Outras redes envolvem genes relacionados à conectividade e atividade neural, sugerindo diferentes mecanismos de ação que podem ser explorados terapeuticamente.
Por fim, os pesquisadores investigaram se esses biomarcadores poderiam ser modulados por medicamentos já existentes, identificando potenciais candidatos para serem reaproveitados no tratamento da ansiedade.
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No geral, com base no número de biomarcadores modulados na expressão na direção oposta à ansiedade, o valproato teve a melhor evidência de ampla eficácia em transtornos de ansiedade, seguido por ácidos graxos ômega-3.
Outro tratamento alternativo que foi uma das principais correspondências foi a frequência da banda gama do EEG, que é aumentada pela meditação e outras práticas de atenção plena. O lítio e a fluoxetina foram os próximos, e os benzodiazepínicos foram uma correspondência menor do que isso.
Os ácidos graxos ômega-3 e a meditação podem ser um tratamento preventivo amplamente implantável, com efeitos colaterais mínimos, inclusive em mulheres que estão ou podem engravidar.
Apenas um dos principais biomarcadores, DYNLL2, tem evidências de ser modulado por benzodiazepínicos na direção oposta à da ansiedade alta; os outros não, o que é interessante e clinicamente útil, pois traz à tona outras escolhas não viciantes.
Análises bioinformáticas do painel de biomarcadores de alta ansiedade revelaram novas terapias potenciais, incluindo o hormônio estradiol, o antagonista de 5-HT2A pirenperona, o agonista opioide loperamida e o antiarrítmico disopiramida. O receptor de estrogênio ESR1 também foi uma descoberta genética importante no estudo.
Este trabalho representa um avanço significativo na compreensão dos mecanismos biológicos subjacentes à ansiedade e oferece caminhos para tratamentos personalizados, que podem aumentar a eficácia dos medicamentos e reduzir seus efeitos colaterais, melhorando o bem-estar dos pacientes.
LEIA MAIS:
Towards precision medicine for anxiety disorders: objective assessment, risk prediction, pharmacogenomics, and repurposed drugs
Roseberry, K., Le-Niculescu, H., Levey, D.F. et al.
Mol Psychiatry 28, 2894–2912 (2023).
Abstract:
Anxiety disorders are increasingly prevalent, affect people’s ability to do things, and decrease quality of life. Due to lack of objective tests, they are underdiagnosed and sub-optimally treated, resulting in adverse life events and/or addictions. We endeavored to discover blood biomarkers for anxiety, using a four-step approach. First, we used a longitudinal within-subject design in individuals with psychiatric disorders to discover blood gene expression changes between self-reported low anxiety and high anxiety states. Second, we prioritized the list of candidate biomarkers with a Convergent Functional Genomics approach using other evidence in the field. Third, we validated our top biomarkers from discovery and prioritization in an independent cohort of psychiatric subjects with clinically severe anxiety. Fourth, we tested these candidate biomarkers for clinical utility, i.e. ability to predict anxiety severity state, and future clinical worsening (hospitalizations with anxiety as a contributory cause), in another independent cohort of psychiatric subjects. We showed increased accuracy of individual biomarkers with a personalized approach, by gender and diagnosis, particularly in women. The biomarkers with the best overall evidence were GAD1, NTRK3, ADRA2A, FZD10, GRK4, and SLC6A4. Finally, we identified which of our biomarkers are targets of existing drugs (such as a valproate, omega-3 fatty acids, fluoxetine, lithium, sertraline, benzodiazepines, and ketamine), and thus can be used to match patients to medications and measure response to treatment. We also used our biomarker gene expression signature to identify drugs that could be repurposed for treating anxiety, such as estradiol, pirenperone, loperamide, and disopyramide. Given the detrimental impact of untreated anxiety, the current lack of objective measures to guide treatment, and the addiction potential of existing benzodiazepines-based anxiety medications, there is a urgent need for more precise and personalized approaches like the one we developed.
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