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Como a Dopamina Ajuda o Cérebro a Esquecer o Medo

  • Foto do escritor: Lidi Garcia
    Lidi Garcia
  • 15 de mai.
  • 6 min de leitura

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Nosso cérebro pode "desaprender" medos antigos quando percebe que estamos seguros, esse processo é chamado de extinção do medo. Um estudo com camundongos mostrou que um tipo de substância química no cérebro, a dopamina, ajuda a ativar partes da memória responsáveis por esse desaprendizado. Ao estimular essas áreas com precisão, os cientistas conseguiram acelerar a superação do medo, o que pode abrir caminho para novos tratamentos de transtornos como o TEPT.


Nosso cérebro precisa ser capaz de esquecer ou controlar medos antigos quando eles não são mais necessários. Esse processo é chamado de extinção do medo e é fundamental para nossa saúde mental. Por exemplo, se você foi mordido por um cachorro quando criança, seu cérebro aprendeu a ter medo de cachorros. Mas, com o tempo, ao conviver com cães inofensivos, esse medo pode diminuir. 


Esse "desaprender" é o que chamamos de extinção do medo. Esse mecanismo ajuda a equilibrar nossas emoções e evitar que lembranças negativas dominem nossas reações. Quando ele falha, pode contribuir para doenças como o transtorno de estresse pós-traumático (TEPT).


A extinção do medo depende de uma parte do cérebro chamada amígdala basolateral (BLA), que está envolvida na formação de memórias emocionais.


Nessa região, existem dois tipos principais de células nervosas: uma que guarda o medo (chamadas de neurônios Rspo2+, localizados na parte frontal da amígdala basolateral), e outra que ajuda a apagar esse medo e está relacionada a sentimentos positivos (chamadas de neurônios Ppp1r1b+, localizadas na parte traseira da amígdala basolateral).  

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Durante a extinção do medo, essas células Ppp1r1b+ criam uma nova memória positiva que reduz o medo guardado pelas células Rspo2+.


Mas como o cérebro decide que é hora de "desligar" o medo? Isso acontece quando um estímulo ruim esperado, como um choque, não acontece. Essa ausência de perigo é percebida como algo bom, e esse alívio gera um "sinal de aprendizado" no cérebro. 


Esse sinal parece vir de outra área chamada área tegmentar ventral (VTA), que produz dopamina, uma substância química importante para aprendizado e motivação. Os cientistas acreditam que, durante a extinção do medo, a dopamina liberada pela área tegmentar ventral pode ajudar o cérebro a entender que está seguro e, assim, formar uma nova memória sem medo. 


Para testar essa ideia, os cientistas do Massachusetts Institute of Technology, USA, usaram ratos e uma série de técnicas modernas. 


Primeiro, eles traçaram as conexões entre a área tegmentar ventral e a amígdala basolateral para ver quais tipos de neurônios se comunicavam. Depois, usaram um método chamado fotometria de fibra, que permite observar a atividade cerebral em tempo real, medindo os níveis de dopamina enquanto os ratos passavam por sessões para desaprender o medo. 


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Em seguida, eles usaram uma técnica chamada optogenética, que funciona como um “controle remoto” de luz para ligar ou desligar células específicas do cérebro, ativando ou inibindo a liberação de dopamina nas áreas desejadas. 

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(A) Um desenho mostrando que os cientistas injetaram um vírus (AAV) com uma proteína que brilha (EYFP) na área tegmentar ventral de camundongos. Esse vírus entra apenas nos neurônios que liberam dopamina (em camundongos com um gene chamado DAT-IRES-Cre). Isso permite rastrear os caminhos dos neurônios dopaminérgicos que vão até a amígdala.


(B) Imagens reais do cérebro. À esquerda, vemos a área tegmentar ventral com neurônios verdes (dopaminérgicos). À direita, vemos a amígdala, com fibras verdes (que vieram da área tegmentar ventral) se espalhando em duas áreas: aBLA (parte anterior, marcada com células vermelhas chamadas Rspo2+), e pBLA (parte posterior, com células vermelhas chamadas Ppp1r1b+, que ajudam a extinguir o medo). Essas imagens mostram que os neurônios da área tegmentar ventral se projetam para essas duas áreas de maneira diferente.


(C) Um gráfico que mostra a quantidade média de sinal verde (intensidade da fluorescência) em três regiões da amígdala, o que sugere que há mais dopamina chegando ali.


(D-F) Esses painéis mostram outra abordagem: agora usando um vírus da raiva modificado, que "volta" pelas conexões nervosas. Isso permite descobrir de onde vêm os sinais que chegam a neurônios específicos na amígdala. (D) mostra um esquema de injeção do vírus na aBLA de camundongos com neurônios Rspo2+ (relacionados ao medo).


(E) mostra as imagens reais, revelando que muitos neurônios da VTA enviam sinais para os neurônios Rspo2+ na aBLA.


(F) mostra a mesma técnica aplicada à pBLA em camundongos com neurônios Ppp1r1b+ (relacionados à extinção do medo).


(G) mostra que outra população da área tegmentar ventral envia sinais para esses neurônios Ppp1r1b+.


(H) Esse gráfico mostra a localização dos neurônios da área tegmentar ventral que se conectam com as duas áreas da amígdala (Rspo2+ e Ppp1r1b+). As linhas mostram que os neurônios conectados à aBLA (medo) e à pBLA (extinção do medo) vêm de partes diferentes da área tegmentar ventral. Ou seja, o cérebro envia dopamina para essas duas áreas de formas bem distintas, dependendo do tipo de informação (medo ou segurança).

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Os resultados mostraram que, quando a dopamina chegava às células de extinção do medo (Ppp1r1b+), os ratos aprendiam mais rápido que estavam seguros. Quando os cientistas aumentaram artificialmente essa atividade dopaminérgica, os animais superaram o medo mais rapidamente. 


Por outro lado, quando a dopamina era direcionada às células de medo (Rspo2+), a extinção era mais difícil, e o medo persistia. Isso prova que a dopamina pode influenciar de forma bidirecional o aprendizado: pode tanto ajudar a apagar o medo quanto reforçá-lo, dependendo de onde ela atua no cérebro. 

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Durante o aprendizado do medo (como quando um animal leva um pequeno choque após ouvir um som), duas áreas do cérebro chamadas Rspo2+ e Ppp1r1b+ na amígdala basolateral (BLA) entram em ação. Ambas recebem um sinal químico chamado dopamina (DA), liberado por outra parte do cérebro chamada área tegmentar ventral (VTA). Porém, nesse momento, a dopamina ativa mais fortemente os neurônios Rspo2+, que estão ligados ao sentimento de medo. Esses neurônios então inibem os Ppp1r1b+, que estão ligados a respostas mais positivas, como a sensação de segurança. Isso faz com que o animal congele, ou seja, fique paralisado pelo medo. Por outro lado, quando o animal passa por um processo de "desaprender o medo", ou seja, percebe que o som não vem mais seguido de choque, a situação muda. Agora, a dopamina é liberada principalmente nos neurônios Ppp1r1b+, os que estão ligados à sensação de segurança. Eles então inibem os Rspo2+, fazendo com que o animal pare de congelar. Isso mostra como o cérebro usa a dopamina para ajudar a trocar a resposta de medo por uma resposta de segurança, dependendo do que está acontecendo ao redor.


Em resumo, esse estudo mostra que há um “caminho químico” específico no cérebro, envolvendo dopamina e áreas bem definidas da amígdala, que ajuda a entender quando é seguro deixar o medo de lado.


Esse tipo de descoberta é essencial para criar novos tratamentos para transtornos como o TEPT, que envolvem memórias traumáticas difíceis de apagar. Se conseguirmos controlar esses circuitos com precisão, podemos ensinar o cérebro a desaprender o medo de forma mais eficaz.



LEIA MAIS:


Dopamine induces fear extinction by activating the reward-responding amygdala neurons

Xiangyu Zhang, Katelyn Flick, Marianna Rizzo, and Susumu Tonegawa 

PNAS. April 28, 2025 122 (18) e2501331122


Abstract:


The extinction of conditioned fear responses is crucial for adaptive behavior, and its impairment is a hallmark of anxiety disorders such as posttraumatic stress disorder. Fear extinction takes place when animals form a new memory that suppresses the original fear memory. In the case of context-dependent fear memory, the new memory is formed within the reward-responding posterior subset of basolateral amygdala (BLA) that is genetically marked by Ppp1r1b+ neurons. These memory engram cells suppress the activity of the original fear-responding Rspo2+ engram cells present in the anterior BLA, hence fear extinction. However, the neurological nature of the teaching signal that instructs the formation of fear extinction memory in the Ppp1r1b+ neurons is unknown. Here, we demonstrate that ventral tegmental area (VTA) dopaminergic signaling drives fear extinction in distinct BLA neuronal populations. We show that BLA fear and extinction neuronal populations receive topographically divergent inputs from VTA dopaminergic neurons via differentially expressed dopamine receptors. Fiber photometry recordings of dopaminergic activity in the BLA reveal that dopamine (DA) activity is time-locked to freezing cessation in BLA fear extinction neurons, but not BLA fear neurons. Furthermore, this dopaminergic activity in BLA fear extinction neurons correlates with extinction learning. Finally, using projection-specific optogenetic manipulation, we find that activation of the VTA DA projections to BLA reward and fear neurons accelerated or impaired fear extinction, respectively. Together, this work demonstrates that dopaminergic activity bidirectionally controls fear extinction by distinct patterns of activity at BLA fear and extinction neurons.

 
 
 

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