Aprendizado Social: Jovens Orangotangos Aprendem a Fazer Ninhos Sofisticados Observando Adultos
- Lidi Garcia
- 3 de set.
- 5 min de leitura

Orangotangos selvagens constroem ninhos todas as noites para dormir com segurança e conforto. Os jovens aprendem essa habilidade complexa ao longo de vários anos, observando principalmente suas mães e, depois, outros indivíduos. Esse aprendizado social garante que saibam tanto como montar o ninho quanto quais árvores escolher, mostrando que a construção de ninhos é também um comportamento cultural transmitido entre gerações.
Assim como muitas pessoas, especialmente aquelas tias e avós que não dormem sem pelo menos três travesseiros, um cobertor para o frio, outro “só de enfeite” e uma almofada estratégica para a lombar, os orangotangos também levam muito a sério a hora de dormir. Esses primatas não se contentam em simplesmente deitar em um galho qualquer: eles constroem verdadeiras camas com direito a “colchão” de folhas, “travesseiros” de galhos e até “cobertores” improvisados.
E o mais curioso é que, assim como nós aprendemos com nossas mães e avós o jeito certo de arrumar a cama, os orangotangos jovens também aprendem observando os mais experientes, transformando a arte de dormir bem em um traço cultural compartilhado entre humanos e primatas.

Os orangotangos selvagens precisam construir ninhos todos os dias para sobreviver. Eles fazem isso porque os ninhos servem como cama para descansar à noite, mas também como proteção contra predadores, insetos e até contra o frio. Às vezes, durante o dia, eles também montam ninhos menores apenas para descansar um pouco.
À noite, porém, os ninhos são mais complexos: eles podem incluir camadas de folhas que funcionam como colchões, travesseiros e até “cobertores” improvisados. Tudo isso exige força, destreza e uma boa dose de tomada de decisão, já que o ninho precisa ser firme o suficiente para suportar o peso de um animal tão grande.
Um detalhe importante é que os orangotangos não escolhem qualquer árvore. Eles selecionam espécies específicas que oferecem madeira mais resistente, folhas maiores e até substâncias químicas que podem afastar insetos. Isso mostra que existe conhecimento acumulado e transmitido sobre quais árvores são melhores para cada situação.

A base do ninho é coberta com um forro espesso de galhos cheios de folhas frescas, uma almofada feita de galhos folhosos em forma de Y e uma manta de galhos curtos e folhosos dentro de um ninho arbóreo recém-abandonado. Fotografia de Junaidi Jaka Permana.
Construir um bom ninho não é apenas habilidade física, mas também envolve raciocínio e escolhas inteligentes, o que torna essa prática um grande desafio cognitivo.
Os filhotes de orangotango começam a se interessar por ninhos ainda muito pequenos, por volta dos 6 meses, quando passam a brincar com folhas e gravetos. Eles tentam imitar o que veem, mas só começam a construir ninhos simples de dia perto de 1 ano de idade.
A verdadeira prática de ninhos noturnos, mais sofisticados, só acontece a partir dos 3 anos, e leva vários anos até que dominem por completo a técnica, em torno dos 8 anos de idade. Com o tempo, eles também aprendem a escolher as melhores árvores, algo que exige experiência e observação.
Grande parte desse aprendizado acontece de forma social. Os jovens observam atentamente suas mães ou outros indivíduos montando ninhos, num comportamento chamado “espiar”. Não basta apenas estar por perto: é a observação direta, focada nos detalhes, que leva os pequenos a praticarem o que viram. Aos poucos, eles passam de observadores a construtores. No início, a mãe é o principal modelo, mas conforme crescem, os jovens começam a observar também outros membros do grupo, ampliando o repertório de técnicas e materiais.

Mãe e orangotango imaturo explorando juntos / Guilhem Duvot @ Projeto SUAQ
Esse tipo de aprendizado é chamado de “aprendizagem social observacional”. Ou seja, o filhote não apenas tenta por conta própria, mas aprende vendo como outro indivíduo faz. Ele adquire tanto o “saber fazer”, como manipular galhos e folhas para dar estabilidade, quanto o “saber o quê”, quais árvores e materiais escolher.
Com o tempo, isso se transforma numa espécie de cultura compartilhada entre grupos de orangotangos: algumas populações usam técnicas ou elementos adicionais que outras não utilizam.
Um estudo de longo prazo com 44 orangotangos em Sumatra, acompanhado ao longo de 17 anos, confirmou exatamente isso.
Os pesquisadores observaram que os jovens aumentavam significativamente a prática de construção depois de verem outros montarem seus ninhos. Os filhotes mais novos tendiam a copiar suas mães, enquanto os mais velhos buscavam aprender com diferentes indivíduos. Até a escolha das espécies de árvores seguia esse padrão: primeiro copiavam as preferências maternas, depois exploravam novas opções observadas em outros.

Orangotango imaturo olhando para baixo através dos galhos / Natasha Bartolotta @ Projeto SUAQ
Essas descobertas mostram que a construção de ninhos não é apenas uma necessidade prática, mas também um comportamento cultural complexo. O aprendizado social permite que o conhecimento seja passado de geração em geração, moldando as diferenças entre grupos de orangotangos em diferentes regiões.
Assim, o que poderia parecer apenas um amontoado de galhos é, na verdade, uma janela para entender como esses grandes primatas pensam, aprendem e transmitem conhecimento dentro de suas comunidades.

Taxas médias de prática de ninhos de imaturos dependentes na hora anterior à mãe fazer o ninho, na hora posterior à mãe fazer o ninho (independentemente da distância do imaturo à mãe quando ela fez o ninho e independentemente de o imaturo estar espiando), na hora posterior à mãe fazer o ninho quando os imaturos estavam a menos de cinco metros da mãe quando ela fez o ninho, mas não estavam espiando, e na hora posterior à mãe fazer o ninho quando o imaturo estava espiando a mãe que estava fazendo o ninho. Os pontos de dados representam a taxa média de prática de ninhos por indivíduo e classe etária anual para cada condição. O tamanho dos pontos de dados corresponde ao número observado de eventos de construção de ninhos da mãe para cada condição e classe etária individual. As cores diferentes representam os diferentes indivíduos focais que contribuíram com dados para esta análise (n = 14 imaturos dependentes).
LEIA MAIS:
Observational social learning of “know-how” and “know-what” in wild orangutans: evidence from nest-building skill acquisition
Andrea L. Permana, Junaidi Jaka Permana, Lara Nellissen, Eggi Septian Prayogi, Didik Prasetyo, Serge A. Wich, Carel P. van Schaik, and Caroline Schuppli
Nature Communications Biology, volume 8, Article number: 890 (2025)
Abstract:
Immature great apes learn how to build their nests over multiple years, yet how they do so has remained largely unclear. We investigated the detailed role of social learning in the acquisition of nest-building skills in wild Sumatran orangutans (Pongo abelii) using data on nest-building, nest practice, and nest peering behaviour from 44 individuals, collected over 17 years. We found that nest peering (but not being close to a nesting individual without peering) is associated with a significant increase in nest practice and is primarily directed at multi-step nest elements. Dependent immatures mostly peer at their mothers and use nest tree species in common with her, independent immatures peer at a larger range of individuals and use nest tree species in common with them. Our results suggest that orangutans acquire their nest-building skills through observational social learning, selective attention to “know-how” and the transmission of “know-what” information.
Creditos das imagens:
Bornean orangutan (Pongo pygmaeus), Tanjung Putting National Park. Thomas Fuhrmann Wikimedia
Interesting engineering;



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