Refrigerantes e Depressão: O Papel Escondido Das Bactérias Do Intestino
- Lidi Garcia
- 13 de out.
- 4 min de leitura

Este estudo mostra que o consumo frequente de refrigerantes está ligado ao aumento do risco e da gravidade da depressão maior, especialmente em mulheres. Essa associação acontece, em parte, porque os refrigerantes alteram a microbiota intestinal, aumentando a abundância da bactéria Eggerthella, que contribui para inflamação e piora dos sintomas depressivos.
Nos últimos anos, o consumo de refrigerantes se tornou um dos hábitos alimentares mais comuns em todo o mundo. Estima-se que mais de 1,9 bilhão de pessoas consomem diariamente bebidas açucaradas, incluindo refrigerantes tradicionais, e esse número cresce especialmente entre os jovens e em países de baixa e média renda.
Relatórios da Organização Mundial da Saúde mostram que em alguns países, cada pessoa consome em média mais de 100 litros de refrigerante por ano. Esse consumo excessivo está fortemente ligado a doenças crônicas, como obesidade, diabetes tipo 2, problemas cardíacos e até câncer.
Nos últimos anos, pesquisadores também têm chamado atenção para os efeitos negativos dos refrigerantes na saúde mental, sugerindo uma possível relação com a ansiedade, alterações de humor e depressão. Apesar desses indícios, pouco se sabe sobre os mecanismos biológicos que podem explicar essa conexão entre refrigerantes e transtornos mentais.

Esse estudo buscou responder a uma pergunta importante: o consumo de refrigerantes está ligado ao risco de desenvolver transtorno depressivo maior (TDM)? E, se sim, será que essa relação acontece porque os refrigerantes alteram a microbiota intestinal, ou seja, as bactérias que vivem no nosso intestino? Os cientistas se concentraram em duas bactérias específicas: Eggerthella e Hungatella, que estudos anteriores já haviam associado a problemas inflamatórios e a mudanças de humor.
Para investigar essa questão, pesquisadores na Alemanha realizaram um grande estudo chamado Coorte Afetiva de Marburg-Münster, conduzido entre 2014 e 2018. Eles analisaram 405 pessoas com diagnóstico de depressão maior e compararam com 527 pessoas saudáveis, todas entre 18 e 65 anos de idade.
Os participantes foram recrutados tanto da população em geral quanto de serviços de atenção primária de saúde. As análises estatísticas aconteceram mais tarde, entre maio e dezembro de 2024, quando os dados foram tratados de forma detalhada.
O método usado foi bastante rigoroso. Primeiro, todos os participantes responderam a questionários detalhados sobre seus hábitos alimentares e o consumo de refrigerantes. Em seguida, foram feitos exames clínicos e análises laboratoriais, incluindo a coleta de amostras fecais, para medir a quantidade de diferentes bactérias na microbiota intestinal.

Eggerthella lenta
Para garantir que os resultados não fossem influenciados por outros fatores, os cientistas controlaram variáveis como nível de escolaridade, local de coleta e até o tamanho da biblioteca genética analisada (isso significa que eles ajustaram os dados para não haver distorções técnicas na medição das bactérias).
Na análise estatística, eles usaram dois métodos principais: modelos de regressão multivariável (para verificar se o consumo de refrigerante aumentava ou não as chances de ter depressão, mesmo considerando outros fatores) e ANOVA (para analisar diferenças entre grupos e a gravidade dos sintomas de depressão). Além disso, fizeram análises de mediação: isso significa que testaram se a presença maior ou menor das bactérias Eggerthella e Hungatella poderia explicar a relação entre refrigerantes e depressão.
Os resultados foram muito reveladores. Pessoas que consumiam mais refrigerantes tinham maior risco de ter depressão e também apresentavam sintomas mais graves. Esse efeito foi mais forte em mulheres, em quem o risco subiu ainda mais. Entre elas, também foi observado que o consumo de refrigerantes estava associado a uma maior abundância da bactéria Eggerthella no intestino, mas não de Hungatella.
A análise de mediação confirmou que a Eggerthella foi responsável por explicar uma parte significativa da relação entre refrigerantes e depressão, chegando a 5% do efeito total sobre a gravidade dos sintomas.

Esses achados sugerem que não é apenas o açúcar ou os aditivos do refrigerante que afetam a saúde mental diretamente, mas também como essas substâncias interagem com a microbiota intestinal. Mudanças no equilíbrio das bactérias do intestino podem influenciar inflamação, produção de neurotransmissores e, consequentemente, o humor e os sintomas depressivos.
Em resumo, o estudo mostra que reduzir o consumo de refrigerantes pode não só proteger contra doenças físicas, mas também diminuir o risco de depressão, especialmente entre as mulheres. Além disso, aponta que novas terapias para depressão poderiam se concentrar no microbioma intestinal, seja com probióticos, dieta ou intervenções específicas para modular bactérias como a Eggerthella.
LEIA MAIS:
Soft Drink Consumption and Depression Mediated by Gut Microbiome Alterations
Sharmili Edwin Thanarajah, Adèle H. Ribeiro, Jaehyun Lee, Nils R. Winter, Frederike Stein, Rachel N. Lippert, Ruth Hanssen,
Carmen Schiweck, Leon Fehse, Mirjam Bloemendaal, Mareike Aichholzer,
Aicha Bouzouina, Carmen Uckermark, Marius Welzel, Jonathan Repple,
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Ramona Leenings, Maximilian Konowski, Jan Ernsting, Lukas Fisch, Carlotta Barkhau, Florian Thomas-Odenthal,Paula Usemann, Lea Teutenberg,
Benjamin Straube, Nina Alexander, Hamidreza Jamalabadi, Igor Nenadić,
Andreas Lügering, Robert Nitsch, Sarah Kittel-Schneider, John F. Cryan,
Andreas Reif, Tilo Kircher, Dominik Heider, Udo Dannlowski,and Tim Hahn.
JAMA Psychiatry. Published Online: September 24, 2025
doi: 10.1001/jamapsychiatry.2025.2579
Abstract:
Soft drink consumption is linked to negative physical and mental health outcomes, but its association with major depressive disorder (MDD) and the underlying mechanisms remains unclear. To examine the association between soft drink consumption and MDD diagnosis and severity and whether this association is mediated by changes in the gut microbiota, particularly
Eggerthella and Hungatella abundance. This multicenter cohort study was conducted in Germany using cross-sectional data from the Marburg-Münster Affective Cohort. Patients with MDD and healthy controls (aged 18-65 years) recruited from the general population and primary care between September 2014 and September 2018 were analyzed. Data analyses were conducted between May and December 2024. Primary analyses included multivariable regression and analysis of variance (ANOVA) models examining the association between soft drink consumption and MDD diagnosis and symptom severity, controlling for site and education, and Eggerthella and Hungatella abundance,
controlling for site, education, and library size. Mediation analyses tested whether microbiota abundance mediated the soft drink–MDD link. A total of 405 patients with MDD (275 female patients [67.9%]; mean [SD] age, 36.37 [13.33] years) and 527 healthy controls (345 female controls [65.5%]; mean [SD] age, 35.33 [13.13] years) were included. Soft drink consumption predicted MDD diagnosis (odds ratio [OR], 1.081; 95% CI, 1.008-1.159; P = .03) and symptom severity (P < .001; partial η2 [ηp2], 0.012; 95% CI, 0.004-0.035), with stronger effects in women (diagnosis: OR, 1.167; 95% CI, 1.054-1.292; P = .003; severity: P < .001; ηp2, 0.036; 95% CI, 0.011-0.062). In women, consumption was linked to increased Eggerthella (P = .007; ηp2, 0.017; 95% CI, 0.0002-0.068), but not Hungatella abundance. Mediation analyses confirmed that Eggerthella
significantly mediated the soft drink–MDD association (diagnosis: P = .011; severity: P = .005), explaining 3.82% and 5.00% of the effect, respectively. In this cohort study, it was found that soft drink consumption may contribute to MDD through gut microbiota alterations, notably involving Eggerthella. Public health strategies to reduce soft drink intake may help mitigate depression risk, especially among vulnerable populations; in addition, interventions for depression targeting the microbiome composition appear promising.



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