Recarregar Células Cerebrais Pode Ser O Próximo Passo Contra A Esclerose Múltipla
- Lidi Garcia
- 3 de jul.
- 4 min de leitura

Pesquisadores descobriram que danos nas “usinas de energia” das células cerebrais, chamadas mitocôndrias, podem estar por trás de problemas de coordenação e movimento em pessoas com esclerose múltipla. Esses danos afetam especialmente o cerebelo, região do cérebro responsável pelo equilíbrio e controle motor. O estudo sugere que proteger as mitocôndrias pode ser uma nova forma de tratar os sintomas da doença.
A esclerose múltipla (EM) é uma doença neurológica crônica em que o sistema imunológico ataca o próprio cérebro e medula espinhal, afetando a comunicação entre o cérebro e o corpo. Um dos locais frequentemente afetados é o cerebelo, uma região do cérebro responsável por funções motoras como equilíbrio, coordenação e controle fino dos movimentos.
Em muitos pacientes com esclerose múltipla, especialmente em fases mais avançadas da doença, ocorrem tremores, dificuldades para andar e perda de coordenação. Embora já se saiba que há danos nessa área do cérebro, os mecanismos exatos por trás disso ainda não estavam completamente esclarecidos.
Esse estudo, realizado por pesquisadores da School of Medicine at the University of California Riverside, USA, investigou de forma mais profunda o que está acontecendo no cerebelo de pessoas com esclerose múltipla, tanto em exames de tecidos humanos após a morte quanto em camundongos que desenvolvem uma forma semelhante da doença, chamada EAE (encefalomielite autoimune experimental).

A equipe de pesquisa analisou tecido cerebelar post-mortem de pacientes com esclerose múltipla progressiva secundária, juntamente com amostras de indivíduos saudáveis, obtidas do NeuroBioBank do National Institutes of Health e da Cleveland Clinic.
Os pesquisadores descobriram que um fator-chave parece ser a disfunção das mitocôndrias, estruturas minúsculas dentro das células que funcionam como “usinas de energia” celulares. Quando essas mitocôndrias não funcionam bem, as células cerebrais, especialmente as chamadas células de Purkinje (que são essenciais para o controle motor), começam a se deteriorar.
Nos tecidos cerebelares de pacientes com esclerose múltipla progressiva, observou-se uma redução importante na atividade de uma parte específica da mitocôndria chamada complexo IV (COXIV), essencial para a produção de energia.

Celulas de Purkinje marcacas em vermelho, verde e amarelo na imagem.
Além disso, essas pessoas apresentavam grande perda de células de Purkinje e sinais de desmielinização (perda da camada protetora dos nervos), inflamação e dano nos prolongamentos nervosos, chamados axônios.
Quando esse mesmo processo foi estudado nos camundongos com encefalomielite autoimune experimental em estágio avançado, os resultados foram semelhantes: as mitocôndrias estavam danificadas, sua respiração celular estava prejudicada, genes ligados à produção de energia estavam menos ativos e também havia perda das células de Purkinje.
Essas semelhanças entre humanos com esclerose múltipla e camundongos com encefalomielite autoimune experimental sugerem que o modelo animal é bastante útil para estudar a doença. Mais importante, o estudo reforça que a disfunção mitocondrial pode estar diretamente envolvida na degeneração do cerebelo na esclerose múltipla.

Isso abre novas possibilidades para tratamentos que visem proteger ou restaurar a função mitocondrial, o que pode ajudar a preservar as funções motoras dos pacientes com esclerose múltipla e desacelerar a progressão da doença.
Na continuação do projeto, a equipe investigará se o comprometimento mitocondrial encontrado nas células de Purkinje também afeta outras células cerebrais, como os oligodendrócitos, que ajudam a formar a substância branca, ou os astrócitos, que sustentam a função cerebral geral.
“Para responder a isso, um dos nossos projetos de pesquisa em andamento concentra-se no estudo das mitocôndrias em tipos específicos de células cerebrais no cerebelo. Essa pesquisa pode abrir caminho para encontrar maneiras de proteger o cérebro desde o início, como aumentar a energia nas células cerebrais, ajudá-las a reparar sua camada protetora de mielina ou acalmar o sistema imunológico antes que danos excessivos sejam causados. Isso é especialmente importante para pessoas com esclerose múltipla que têm dificuldades de equilíbrio e coordenação, pois esses sintomas estão ligados a danos no cerebelo.” Tiwari-Woodruff, uma das autoras, enfatizou que a pesquisa relacionada à doença é vital para melhorar vidas.

Seema Tiwari-Woodruff (direita) e uma de suas estudantes Credito: University of California, Riverside
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Decreased mitochondrial activity in the demyelinating cerebellum of progressive multiple sclerosis and chronic EAE contributes to Purkinje cell loss
Kelley C. Atkinson, Shane Desfor, Micah Feri, Maria T. Sekyi, Marvellous Osunde, Sandhya Sriram, Saima Noori, Wendy Rincón, Britany Bello, and Seema K. Tiwari-Woodruff
PNAS. June 16, 2025. 122 (25) e2421806122
Abstract:
In multiple sclerosis (MS), cerebellar gray matter atrophy, white matter demyelination, and Purkinje cell (PC) loss have been linked to tremors, impaired motor control, and loss of coordination. Similar pathologies have been observed in the mouse model of MS, experimental autoimmune encephalomyelitis (EAE). This study hypothesized that inflammatory demyelination of the cerebellum alters overall mitochondrial function and is a contributor to axon degeneration and PC loss. Postmortem cerebellar tissue from MS patients, particularly those with secondary progressive MS, showed decreased mitochondrial complex IV (COXIV) activity and significant PC loss. Inflammation, PC axon demyelination, axon degeneration, and parallel fiber loss were also evident. These findings were mirrored in late-stage EAE mice, which also showed increased inflammation and demyelination, reduced PC COXIV activity, and overall PC loss. Further analysis of EAE mice revealed altered mitochondrial structure, modified mitochondrial respiration, and reduced levels of mitochondrial genes involved in energy production. These findings indicate that both human MS and mouse EAE share similar cerebellar changes linked to mitochondrial dysfunction. Thus, late-stage EAE is a valuable model for studying MS-related cerebellar pathology, and mitochondria may be a potential therapeutic target for MS treatment.



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