Nova Estratégia Faz Efeito Da Cetamina Contra Depressão Durar Até Dois Meses
- Lidi Garcia
- 2 de jun.
- 3 min de leitura

Pesquisadores descobriram uma forma de prolongar os efeitos antidepressivos da cetamina, que normalmente duram poucos dias. Ao combinar a cetamina com uma substância que mantém ativa uma molécula chamada ERK no cérebro, os efeitos benéficos duraram até dois meses em camundongos. Isso pode levar a tratamentos mais duradouros para a depressão, com menos necessidade de repetição da dose e menos efeitos colaterais.
A depressão é uma condição psiquiátrica comum e debilitante que afeta milhões de pessoas em todo o mundo. Embora existam tratamentos eficazes, como antidepressivos convencionais e psicoterapia, muitas pessoas não respondem bem ou demoram semanas para sentir melhora.
A cetamina, originalmente desenvolvida como anestésico, tem chamado a atenção nos últimos anos por apresentar efeitos antidepressivos muito rápidos, às vezes dentro de horas após uma única dose intravenosa. No entanto, esses efeitos são temporários, geralmente durando apenas alguns dias, o que exige doses repetidas para manter os benefícios.
O problema é que o uso repetido de cetamina pode trazer efeitos colaterais indesejados, como distúrbios cognitivos, dependência e efeitos no sistema urinário.

Com isso em mente, os cientistas da Vanderbilt University, USA, quiseram responder a uma pergunta importante: será possível fazer com que os efeitos positivos de uma única dose de cetamina durem muito mais tempo, sem a necessidade de reaplicações frequentes?
Para isso, eles investigaram como a cetamina age no cérebro e o que poderia ser feito para prolongar seus efeitos antidepressivos sem aumentar a dose.
Sabemos que a cetamina aumenta a plasticidade sináptica, ou seja, melhora a capacidade dos neurônios de se comunicarem entre si, em uma região específica do cérebro chamada hipocampo, mais precisamente entre as áreas chamadas CA3 e CA1.
Essa região está envolvida com memória, emoções e regulação do humor. Quando essa conexão entre neurônios é fortalecida, os sintomas de depressão parecem diminuir. No entanto, esse fortalecimento dura pouco tempo após a administração da cetamina.

No experimento, os cientistas utilizaram camundongos de laboratório para testar se seria possível fazer esse efeito durar mais. Eles focaram em uma enzima chamada ERK (quinase regulada por sinal extracelular), que está envolvida em processos de aprendizagem, memória e resposta celular a estímulos.
Quando a ERK está ativa, ela ajuda a manter a capacidade dos neurônios de se comunicarem entre si. Porém, existe uma outra proteína chamada DUSP6, que “desliga” a ERK e reduz sua atividade.
A ideia dos pesquisadores foi simples: se inibirmos a DUSP6, a ERK continua ativa por mais tempo, e isso pode manter as mudanças cerebrais causadas pela cetamina. Para testar essa hipótese, eles administraram cetamina nos animais e, em seguida, deram um medicamento que inibe a DUSP6.

O resultado foi surpreendente: os efeitos antidepressivos, que normalmente durariam alguns dias, foram mantidos por até 2 meses em camundongos. Ou seja, uma única dose teve efeito prolongado graças à manipulação dessa via intracelular.
Para confirmar que esse efeito dependia mesmo dessa via, os cientistas fizeram outro experimento: eles bloquearam uma molécula chamada TrkB (um tipo de receptor importante para o funcionamento dos neurônios) apenas nos neurônios excitatórios, os que mais participam na transmissão ativa de sinais.
Sem o TrkB, os efeitos prolongados da inibição da DUSP6 desapareceram, confirmando que essa rota de sinalização é essencial para sustentar os efeitos da cetamina.

Esse estudo, portanto, mostra que é possível, ao modular uma via interna do neurônio, prolongar o efeito antidepressivo da cetamina com uma única aplicação, evitando os riscos associados ao uso repetido.
Embora ainda sejam necessários estudos em humanos para confirmar esses resultados, a descoberta representa um avanço importante no tratamento da depressão resistente e pode abrir caminho para novas abordagens terapêuticas mais seguras e duradouras.
LEIA MAIS:
Enhanced ERK activity extends ketamine’s antidepressant effects by augmenting synaptic plasticity
Z. ZACK MA, NATALIE J. GUZIKOWSKI, JI-WOON KIM, EGE T. KAVALALI, AND LISA M. MONTEGGIA
Science. Vol 388, Issue 6747 pp. 646-655
DOI: 10.1126/science.abb6748
Abstract:
Repeated ketamine treatment to maintain a rapid antidepressant effect can lead to side effects over time, highlighting an unmet clinical need for sustaining this drug’s antidepressant action from a single administration. Ketamine-induced synaptic potentiation at CA3-CA1 synapses has been proposed to be a key synaptic substrate for antidepressant action. Here, we found that ketamine-induced CA3-CA1 synaptic potentiation could be augmented by transiently increasing extracellular signal–regulated kinase (ERK) activity through pharmacological inhibition of dual-specificity phosphatases 6 (DUSP6). The antidepressant-like behavioral effects of acute ketamine treatment were extended by DUSP6 inhibition for up to 2 months. The selective deletion of tropomyosin receptor kinase B (TrkB) in excitatory neurons abolished these DUSP6 inhibition–mediated synaptic and behavioral effects. These data suggest that ketamine’s rapid antidepressant effects can be sustained by selectively targeting downstream intracellular signaling.



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