Interruptor Da Fome: O Pequeno Núcleo No Cérebro Que Decide Se Você Vai Comer Mais Ou Menos
- Lidi Garcia
- 5 de jun.
- 5 min de leitura
Atualizado: 6 de jun.

Pesquisadores descobriram um novo grupo de neurônios no cérebro que ajuda a controlar a fome e o peso corporal. Esses neurônios são influenciados por um hormônio chamado leptina, que é produzido pela gordura do corpo. Quando esse hormônio não age corretamente nesses neurônios, a pessoa sente mais fome e pode ganhar peso. Essa descoberta pode abrir caminho para novos tratamentos contra a obesidade.
A obesidade e o excesso de alimentação são problemas sérios de saúde pública em todo o mundo, e ainda precisamos de tratamentos mais eficazes. Para isso, é essencial entender melhor como o corpo controla o apetite e o consumo de alimentos.
Um dos hormônios mais importantes nesse processo é a leptina. Ela é produzida pelas células de gordura do corpo e age como um sinal para o cérebro sobre a quantidade de gordura armazenada. Quanto mais gordura temos, mais leptina é liberada, ajudando a regular o apetite e o gasto de energia.
Quando há deficiência de leptina ou quando o cérebro não responde adequadamente a ela, a pessoa sente mais fome e queima menos calorias, o que pode levar à obesidade grave. Esse processo foi observado tanto em animais quanto em seres humanos.

A leptina age principalmente no cérebro, em especial em uma região chamada núcleo arqueado do hipotálamo (ARC). Dentro dessa área, existem grupos de neurônios que têm papéis opostos: alguns reduzem o apetite (como os neurônios POMC), enquanto outros aumentam a fome (como os neurônios AgRP e NPY).
No entanto, pesquisas mostram que a leptina não exerce um controle direto tão importante sobre os neurônios que reduzem o apetite em adultos. E embora a ausência do receptor de leptina (LEPR) nos neurônios que aumentam a fome do tipo AgRP cause obesidade moderada em animais jovens, a mesma manipulação em adultos gera ganho de peso mais significativo.
Isso mostra que outros neurônios além dos neurônios que aumentam a fome também estão envolvidos nesse sistema de controle do apetite.

Recentemente, os cientistas do Max Planck Institute for Metabolism Research, Alemanha, identificaram um novo grupo de neurônios no núcleo arqueado do hipotálamo que podem estar por trás desse processo: os neurônios que expressam uma substância chamada prepronociceptina (PNOC).
Esses neurônios são do tipo GABAérgico (ou seja, usam o neurotransmissor GABA) e ajudam a promover o ganho de peso em camundongos alimentados com dietas ricas em gordura. Além disso, eles inibem diretamente os neurônios que reduzem o apetite, os quais normalmente ajudariam a reduzir o apetite.
Descobriu-se também que esses neurônios PNOC respondem à glicose e, em alguns casos, são inibidos pela leptina, mostrando sua importância na regulação do comportamento alimentar.

Esta imagem mostra como a reativação do receptor de leptina (Lepr) em um grupo específico de neurônios chamados PNOC pode ajudar a controlar o peso corporal. No painel (A), os cientistas criaram camundongos geneticamente modificados para que apenas os neurônios PNOC tivessem o receptor de leptina ativado novamente. O painel (B) mostra a diferença visual entre os grupos: os camundongos com Lepr inativo (à esquerda) são muito maiores do que os com Lepr restaurado nos neurônios PNOC (meio) e os controles saudáveis (direita). O gráfico (C) mostra que os camundongos sem Lepr ganharam muito mais peso ao longo do tempo, enquanto os com Lepr reativado ficaram no meio termo, e os controles foram os mais leves. Os gráficos (D) e (E) confirmam isso com medidas de peso total e quantidade de gordura corporal. Já os painéis (F) e (G) mostram imagens do cérebro destacando uma proteína (pSTAT3) que indica que os neurônios estão respondendo à leptina. Os camundongos com Lepr nos neurônios PNOC mostraram mais dessa proteína do que os que não tinham o receptor, indicando que a leptina voltou a funcionar parcialmente nesses cérebros. Em resumo, isso mostra que ativar o receptor de leptina nesses neurônios específicos pode ajudar a reduzir a obesidade.
Neste estudo, os pesquisadores mostraram que uma parte importante da ação da leptina para controlar a fome e o peso corporal acontece por meio dos neurônios PNOC. Quando os cientistas removeram os receptores de leptina desses neurônios, os animais desenvolveram obesidade devido ao aumento da ingestão de alimentos, mesmo que os neurônios ainda produzissem PNOC.
Com uma técnica de sequenciamento genético, os cientistas observaram que a ausência do receptor de leptina nesses neurônios fez com que eles passassem a produzir mais do neuropeptídeo Y (NPY), um potente estimulador do apetite.
Interessantemente, esses neurônios que aumentaram o NPY não eram os neurônios que aumentam a fome clássicos, e sim uma nova população de neurônios PNOC que expressam neuropeptídeo Y, mas não Agrp.
Esses novos neurônios PNOC/NPY também expressam o receptor de leptina, e quando foram artificialmente ativados, causaram um aumento acentuado na ingestão de alimentos. Além disso, esse mesmo tipo de neurônio também foi identificado no cérebro humano, o que sugere que os resultados podem ser relevantes para futuros tratamentos.

Aumento da expressão de NPY em neurônios PNOC de camundongos mutantes, mas não em neurônios AgRP. Usando a técnica chamada "hibridização in situ" para identificar quais genes estavam sendo ativados nesses neurônios, marcando três deles com cores diferentes: Pnoc (verde), Npy (ciano/azul claro) e Agrp (magenta). As imagens mostradas comparam dois grupos de camundongos, um grupo normal e outro com uma modificação genética nos neurônios que expressam Pnoc (PNOCΔLEPR), em duas situações: (A) após jejum de 16 horas e (B) depois de terem sido alimentados por 1 hora. As escalas na imagem indicam o tamanho das células. Nos gráficos (C e D), os pesquisadores contam quantas células estavam ativas com os genes NPY e AgRP nas duas condições (em jejum e após alimentação). Isso ajuda a entender como esses neurônios reagem à fome e à alimentação, especialmente quando a leptina (o hormônio que regula a fome) está ausente nesses neurônios.
Por fim, quando os cientistas forçaram esses neurônios a produzir mais neuropeptídeo Y, os animais comeram mais e ficaram obesos, mas isso só aconteceu quando a alteração foi feita nos neurônios PNOC, e não nos AgRP.
Em resumo, este estudo revela que um grupo específico de neurônios no cérebro, chamados PNOC/NPY, é fundamental para a ação da leptina no controle do apetite. Esses neurônios oferecem uma nova e promissora rota para desenvolver tratamentos mais eficazes contra a obesidade.
LEIA MAIS:
Hypothalamic PNOC/NPY neurons constitute mediators of leptin-controlled energy homeostasis
Marie H. Solheim, Sima Stroganov, Weiyi Chen, P. Sicilia Subagia, Corinna A. Bauder, Daria Wnuk-Lipinski, Almudena Del Río-Martín, Tamara Sotelo-Hitschfeld, Cait A. Beddows, Paul Klemm, Garron T. Dodd, Sofia Lundh, Anna Secher, F. Thomas Wunderlich, Lukas Steuernagel, and Jens C. Brüning
Cell. 23 April 2025
DOI: 10.1016/j.cell.2025.04.001
Abstract:
Leptin acts in the brain to suppress appetite, yet the responsible neurocircuitries underlying leptin’s anorectic effect are incompletely defined. Prepronociceptin (PNOC)-expressing neurons mediate diet-induced hyperphagia and weight gain in mice. Here, we show that leptin regulates appetite and body weight via PNOC neurons, and that loss of leptin receptor (Lepr) expression in PNOC-expressing neurons in the arcuate nucleus of the hypothalamus (ARC) causes hyperphagia and obesity. Restoring Lepr expression in PNOC neurons on a Lepr-null obese background substantially reduces body weight. Lepr inactivation in PNOC neurons increases neuropeptide Y (Npy) expression in a subset of hypothalamic PNOC neurons that do not express agouti-related peptide (Agrp). Selective chemogenetic activation of PNOC/NPY neurons promotes feeding to the same extent as activating all PNOCARC neurons, and overexpression of Npy in PNOCARC neurons promotes hyperphagia and obesity. Thus, we introduce PNOC/NPYARC neurons as an additional critical mediator of leptin action and as a promising target for obesity therapeutics.
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