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Como Nasce Um Comportamento Compulsivo: Cientistas Identificam o Circuito-chave

  • Foto do escritor: Lidi Garcia
    Lidi Garcia
  • 5 de dez.
  • 4 min de leitura
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O estudo identifica um circuito específico entre o núcleo accumbens e o hipotálamo que pode transformar comportamentos normais orientados por objetivos em ações compulsivas e repetitivas. Ao estimular artificialmente esse circuito, animais passaram a exibir comportamentos automáticos e persistentes, mesmo quando havia recompensas naturais disponíveis. Isso sugere que esse caminho neural pode ser um mecanismo central em transtornos humanos como dependência, compulsão alimentar e transtorno obsessivo-compulsivo.


Para sobreviver e funcionar bem, qualquer animal precisa ajustar seu comportamento ao ambiente. Isso significa ser capaz de explorar, procurar alimentos, tomar decisões quando há perigo, interagir com outros da mesma espécie e realizar comportamentos automáticos e instintivos, como higiene ou proteção dos filhotes.


Essa flexibilidade depende de um equilíbrio entre comportamentos guiados por objetivos, como buscar algo que traga recompensa, e comportamentos automáticos reflexos. 


No cérebro, existe uma região chamada hipotálamo que atua como um centro regulador desses processos. Ele recebe e combina informações internas do corpo, como fome, estresse, energia disponível e hormônios, com informações externas do ambiente, como ameaças ou oportunidades de alimento. A partir disso, ele decide qual comportamento deve ser priorizado.


Um comportamento adequado exige a capacidade de interromper ações repetitivas quando elas não trazem resultado. Quando o cérebro falha nesse controle, surgem comportamentos compulsivos e repetitivos, semelhantes ao que acontece em transtornos como compulsão alimentar, anorexia, dependência química e transtorno obsessivo-compulsivo.


Estudos anteriores já mostraram que essa região do cérebro, o hipotálamo, participa desses comportamentos problemáticos.


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O hipotálamo contém muitos tipos diferentes de neurônios distribuídos de forma organizada. Dentro dele existe uma sub-região chamada área hipotalâmica lateral. Essa área tem papel direto na regulação da motivação e de comportamentos essenciais para manter o corpo em equilíbrio. Ali existem neurônios que estimulam o comportamento alimentar e outros que o inibem. 


Pesquisas mostram que alguns neurônios associados ao impulso de comer também podem estimular comportamentos compulsivos e repetitivos. Isso significa que as redes neurais ligadas à motivação alimentar estão conectadas a circuitos responsáveis por comportamentos mais amplos relacionados ao impulso e ao controle.


Embora se saiba que a área hipotalâmica lateral participa de comportamentos motivados, ainda não estava claro como diferentes conexões e subtipos de neurônios dentro dela influenciam a escolha comportamental. Essa escolha envolve decidir entre agir com base em um objetivo, reagir instintivamente, buscar recompensas ou evitar estímulos negativos. A forma como essa região se conecta com outras áreas do cérebro é determinante nesse equilíbrio.


Por exemplo, quando determinados neurônios dessa região enviam sinais para a área tegmental ventral, há influência no sistema de recompensa e motivação, podendo gerar busca compulsiva sem necessariamente aumentar o ato de comer.


Já quando outros neurônios dessa mesma área fazem conexão com a habenula lateral, uma região relacionada à sensação de punição e experiências desagradáveis, ocorre o oposto: aumenta-se a aversão e diminui-se a motivação por recompensa. Esses circuitos têm funções diferentes e, ao mesmo tempo, interagem entre si.


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O estudo investigado buscou entender um subtipo específico de neurônios dessa rede, que expressam uma molécula chamada Esr1 e se conectam ao centro da aversão do cérebro, a habenula lateral. Pesquisadores mapearam cuidadosamente quais regiões do cérebro enviam informações para esses neurônios e observaram como esse circuito funciona durante comportamentos naturais e durante situações experimentais.


Os resultados mostram a existência de um grupo específico de neurônios localizados no núcleo accumbens, uma área relacionada à motivação, tomada de decisão e dependência. Quando esses neurônios são estimulados artificialmente, eles acionam o grupo de neurônios Esr1 no hipotálamo, o que pode gradualmente induzir comportamentos compulsivos.


Esses comportamentos aparecem mesmo quando há opções mais vantajosas ou prazerosas disponíveis, como comida ou interação social. Ou seja, esse circuito pode substituir comportamentos normais orientados por metas por ações repetitivas e automáticas.


A ativação desse caminho neural produz comportamentos estereotipados que variam com o ambiente: em um espaço aberto, o animal se move de forma repetitiva e intensa; em um ambiente com material solto, ele cava continuamente; em um ambiente com objetos para manipular, ele repete movimentos como empurrar ou cutucar. Esses comportamentos não têm propósito claro e substituem ações mais naturais, lembrando quadros compulsivos em humanos.


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Esse achado sugere que existe um circuito neural capaz de priorizar repetição e compulsão acima de recompensas naturais. Esse mecanismo parece semelhante ao observado em dependências e transtornos compulsivos em humanos.


Estudos anteriores já indicavam que regiões relacionadas ao sistema de recompensa podem ser alteradas por drogas, estresse e estímulos emocionais persistentes. Este novo estudo une essa ideia ao papel fundamental do hipotálamo e sua capacidade de reorganizar prioridades comportamentais.


A pesquisa também destaca a necessidade de entender os tipos específicos de neurônios envolvidos, suas conexões e como essas conexões mudam ao longo do tempo, pois existe plasticidade, isto é, a capacidade do cérebro de se modificar com a experiência.


Em resumo, o trabalho revela que existe um caminho preciso entre o núcleo accumbens e um grupo específico de neurônios no hipotálamo que pode induzir comportamentos compulsivos, mesmo quando eles são desvantajosos. Esse circuito pode ser um alvo importante para entender e, futuramente, tratar transtornos ligados à compulsão, dependência e comportamentos repetitivos patológicos.



LEIA MAIS:


A striosomal accumbens pathway drives stereotyped behavior through an aversive Esr1+ hypothalamic-habenula circuit

THOMAS CONTESSE, MARTA GRAZIANO, CHIARA FORASTIERI, ALESSANDRO CONTESTABILE, SALOME HAHNE, FELIX JUNG, IFIGENEIA NIKOLAKOPOULO, ELEONORA RUBINO, XIAO CAO, VASILIKI SKARA, IOANNIS MANTAS, SARANTIS GIATRELLIS, MARIE CARLÉN, RICKARD SANDBERG, DANIELA CALVIGIONI, and KONSTANTINOS MELETIS

SCIENCE ADVANCES, 21 Nov 2025, Vol 11, Issue 47

DOI: 10.1126/sciadv.adx9450


Abstract:


The lateral hypothalamic area (LHA) integrates external stimuli with internal states to drive the choice between competing innate or value-driven motivated behaviors. Here, we define a striosomal Tac1+/Tshz1+/Oprm1+ neuron subtype in the nucleus accumbens (ACB) that targets Esr1+ LHA neurons that project to the lateral habenula (LHb). Intersectional cell type–specific and input-output defined optogenetic activation of this ACB-LHA-LHb pathway can progressively induce a negative behavioral state that depends on Esr1+ LHA-LHb neural activity. We found that either activation of the D1+ ACB-LHA projection or inhibition of LHA-LHb neurons defined by ACB inputs can drive reward-independent compulsive-like behaviors that generalize across contexts. We found that these complex yet stereotyped behaviors compete with highly motivated states and can override the drive for natural rewards or social interactions. Our findings reveal a discrete Tac1+ striosomal ACB projection targeting the aversive Esr1+ LHA-LHb pathway as a key circuit that promotes stereotyped and compulsive-like behaviors over goal-directed actions.

 
 
 

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