Diagnóstico Errado: Remédio Comum Para Dor Imita Alucinações Da Esquizofrenia
- Lidi Garcia
- 22 de ago.
- 4 min de leitura

A esquizofrenia é uma doença mental séria que pode causar sintomas como alucinações, quando a pessoa vê ou ouve coisas que não existem. Porém, nem toda alucinação significa que alguém tem esquizofrenia, já que elas também podem ser causadas por outras condições ou pelo uso de certos medicamentos. Esse foi o caso de um homem de 67 anos, que começou a ter alucinações depois de tomar remédios à base de opioides para tratar dores nas costas. Quando parou a medicação, os sintomas desapareceram. Esse exemplo mostra como é importante investigar bem as causas das alucinações antes de dar um diagnóstico de esquizofrenia.
A esquizofrenia é uma condição de saúde mental complexa que afeta profundamente a forma como uma pessoa pensa, sente e se comporta. Indivíduos que vivem com esse transtorno podem apresentar dificuldades em distinguir o que é real do que é fruto de alterações em seu cérebro, o que causa sofrimento tanto para eles quanto para seus familiares.
O diagnóstico de esquizofrenia exige uma investigação minuciosa feita por psiquiatras, que inclui entrevistas detalhadas, análise do histórico de vida e de saúde mental do paciente, além de exames que ajudam a excluir outras causas médicas ou psicológicas que possam estar provocando sintomas semelhantes.
Um dos sintomas mais marcantes são as alucinações, que ocorrem quando o cérebro cria percepções falsas, fazendo a pessoa ouvir, ver, sentir, cheirar ou saborear coisas que não existem no ambiente real.
Embora muitas vezes associadas diretamente à esquizofrenia, as alucinações também podem ocorrer em diversos outros contextos, como efeitos colaterais de medicamentos, uso ou abstinência de drogas, quadros de demência ou delírios relacionados a doenças físicas.

Entre as possíveis causas médicas de alucinações, o uso de opioides merece destaque, apesar de ser pouco discutido. Opioides são medicamentos usados para controlar dores intensas, muitas vezes prescritos em contextos pós-cirúrgicos ou em casos de dores crônicas. Estudos relatam, por exemplo, que cerca de seis por cento das pessoas que recebem fentanil após cirurgias apresentam alucinações.
Esse número provavelmente é maior, mas pode estar subestimado porque muitos pacientes não relatam o sintoma por receio de serem vistos como instáveis mentalmente. Apesar das controvérsias sobre seu uso em dores que não estão relacionadas ao câncer, os opioides ainda são largamente prescritos em países como Estados Unidos e Canadá, em especial para condições como dor lombar crônica. Nesses países, os índices de prescrição são duas a três vezes mais elevados do que na Europa, o que mostra a dimensão do uso dessa classe de medicamentos.

O caso relatado no estudo mostra de forma clara como esse efeito colateral pode confundir diagnósticos psiquiátricos. Trata-se de um paciente afro-americano de sessenta e sete anos que sofria de dor lombar crônica e havia sido tratado com Norco, uma medicação que combina hidrocodona e acetaminofeno.
Após o início do uso desse remédio, ele começou a ter alucinações auditivas e visuais, ou seja, passou a ouvir e ver coisas que não existiam. O detalhe importante é que as alucinações aumentavam de intensidade quando a dose do remédio era ajustada para cima, mas desapareciam quando ele interrompia o uso da medicação.
Apesar disso, o paciente foi inicialmente encaminhado a uma clínica psiquiátrica com o diagnóstico de esquizofrenia não especificada, sem que tivesse sido considerada a relação entre o início das alucinações e o tratamento para a dor.
Esse exemplo mostra como é fundamental que médicos, em especial psiquiatras, façam uma avaliação ampla e detalhada, levando em conta o histórico de uso de medicamentos, antes de fechar um diagnóstico tão impactante quanto o de esquizofrenia.

Quando um paciente apresenta alucinações, os médicos seguem um processo de exclusão para entender a causa. Primeiro, fazem entrevistas detalhadas para relacionar o início dos sintomas com eventos da vida do paciente, uso de medicamentos ou outras doenças. Também realizam exames clínicos e laboratoriais para descartar condições físicas, como infecções, distúrbios metabólicos ou efeitos colaterais de drogas.
No caso da esquizofrenia, o diagnóstico só é considerado se os sintomas persistirem por tempo prolongado, se não houver outra explicação médica plausível e se estiverem associados a outros sinais característicos do transtorno, como pensamentos desorganizados ou delírios.
Já quando as alucinações aparecem em paralelo ao uso de um medicamento, e desaparecem quando ele é suspenso, isso é um forte indício de que a causa está no fármaco, não em um transtorno psiquiátrico primário.
Quando sintomas como alucinações aparecem, é preciso investigar se eles podem estar relacionados a tratamentos em andamento, especialmente ao uso de opioides. Essa atenção cuidadosa não apenas evita diagnósticos errados, como também garante que o paciente receba o tratamento adequado para sua condição real.
O caso ainda ressalta a importância de os pacientes falarem abertamente sobre os efeitos colaterais que sentem, sem medo do estigma, já que essa informação pode ser crucial para a definição correta da conduta médica.
LEIA MAIS:
Opioid-Induced Hallucinations: A Case Report
Arvind Dhanabalan, Sall Saveen, Christina Singh, Ramona Ramasamy, and Keerthiga Raveendran
Cureus, 16(12): e74915.
doi:10.7759/cureus.74915
Abstract:
This article presents the case of a 67-year-old African American male patient who was referred to a psychiatry clinic by his Internal Medicine Provider with a diagnosis of "schizophrenia, unspecified." The patient reported the onset of auditory and visual hallucinations (AVHs) two years ago, coinciding with his starting Norco (hydrocodone 5 mg/acetaminophen 325 mg) for chronic back pain. He noted that his AVH worsened when he increased his prescribed Norco dosage (within his prescribed recommended range) and observed that the hallucinations ceased when he discontinued the medication. This case highlights the potential for opioid-induced AVH to be misdiagnosed as schizophrenia while emphasizing the importance of careful evaluation of opioid use in psychiatric assessments.



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