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Células Humanas Criadas em Laboratório Podem Ajudar a ‘Reprogramar’ o Cérebro Contra a Depressão

  • Foto do escritor: Lidi Garcia
    Lidi Garcia
  • 20 de ago.
  • 4 min de leitura
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Cientistas conseguiram criar em laboratório um tipo específico de neurônio ligado ao prazer, motivação e emoções, células que costumam falhar em doenças como depressão, esquizofrenia e dependência. Quando transplantados em camundongos, esses neurônios reconstruíram circuitos cerebrais e reduziram sintomas parecidos com os da depressão. Essa descoberta abre caminho para novas formas de entender e talvez tratar transtornos psiquiátricos no futuro.


Os neurônios dopaminérgicos são células do cérebro responsáveis por transmitir a dopamina, um mensageiro químico essencial para várias funções do nosso corpo e mente. Eles participam do controle dos movimentos, da sensação de prazer e recompensa, da motivação e até das nossas emoções. 


Esses neurônios ficam em uma região chamada mesencéfalo e se organizam em grupos, sendo os mais importantes os chamados A9 e A10. O grupo A9 é responsável pelo controle dos movimentos voluntários, e sua degeneração está diretamente ligada ao Parkinson, doença que causa rigidez e tremores. 


Já o grupo A10 atua em áreas do cérebro que regulam prazer, motivação e cognição, sendo fundamental para comportamentos baseados em recompensa, como quando sentimos satisfação ao alcançar uma meta. Alterações nesse sistema A10 estão associadas a transtornos como depressão, esquizofrenia e dependência química.


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Nos últimos anos, a ciência avançou muito na capacidade de criar células humanas em laboratório a partir de células-tronco. Essas células são especiais porque podem se transformar em qualquer tipo de célula do corpo, inclusive neurônios. 


Já existiam protocolos que permitiam transformar células-tronco em neurônios do tipo A9, usados em pesquisas sobre Parkinson, mas até agora não havia um método eficiente para gerar neurônios A10, justamente aqueles ligados a problemas psiquiátricos. Resolver esse desafio era importante, porque permitiria entender melhor doenças como a depressão e até abrir caminho para novas terapias.


Foi exatamente isso que este estudo conseguiu fazer. Os pesquisadores desenvolveram um protocolo específico para guiar células-tronco humanas até se transformarem em neurônios A10. Para isso, eles usaram uma combinação de substâncias, entre elas, um fator chamado GDNF, vitamina C (ácido ascórbico) e uma molécula que bloqueia uma via de sinalização chamada Notch. 


Esses compostos foram aplicados em um momento muito preciso da diferenciação celular, quase como se os cientistas tivessem “ensinado” as células-tronco a seguir o caminho certo para virar neurônios do subtipo A10.


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Essa figura mostra como cientistas conseguiram transformar células-tronco humanas em neurônios semelhantes aos que controlam prazer, motivação e emoções (os chamados neurônios dopaminérgicos A10). Na imagem, cada cor representa uma marcação diferente: os núcleos das células aparecem em azul (Hoechst), os neurônios derivados das células-tronco em vermelho (tdTomato) e os neurônios ativados pelo tratamento especial em verde (EGFP). À esquerda, vemos o grupo “controle”, sem tratamento, no qual os neurônios estão presentes, mas em menor quantidade e menos conectados. Já à direita, no grupo tratado com o coquetel de moléculas “GBCATD”, há muito mais neurônios formados, com extensas ramificações e conexões. Isso demonstra que o tratamento químico ajuda a direcionar as células-tronco para se tornarem especificamente neurônios dopaminérgicos A10, aumentando seu potencial para uso em pesquisas sobre depressão e outros transtornos psiquiátricos.


Os neurônios produzidos em laboratório foram analisados e mostraram se comportar de forma semelhante aos A10 originais do cérebro humano. Eles apresentaram os mesmos padrões de genes e também responderam eletricamente como esperado. 


O passo mais impressionante, no entanto, foi o transplante em camundongos. Quando implantados, esses neurônios se conectaram às regiões corretas do cérebro, reconstruindo o circuito mesolímbico,  o principal caminho da dopamina relacionado ao prazer e motivação.


Os testes comportamentais trouxeram resultados animadores. Em camundongos com sintomas semelhantes aos da depressão, a ativação desses neurônios transplantados levou a mudanças claras de comportamento, como se tivessem efeito antidepressivo. Isso significa que, no futuro, essa técnica pode ajudar não só a entender os mecanismos da depressão resistente a tratamentos, mas também servir como base para uma terapia celular que reconstrua circuitos cerebrais danificados em transtornos psiquiátricos. 


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Imunocoloração de neurônios enxertados 6 meses após transplante no estriato  de precursores de mDA humanos de controle ou tratados com o coquetel (GAD) em camundongos.


Esse estudo é considerado um marco porque mostra que é possível criar em laboratório um tipo específico de neurônio humano, que antes era muito difícil de obter, e usá-lo para reconstruir conexões cerebrais em animais. 


Além de apontar novas possibilidades de tratamento para depressão, ele oferece uma poderosa ferramenta de pesquisa para entender como o sistema de recompensa funciona no cérebro e como ele se desregula em doenças mentais.


No futuro, essa abordagem pode abrir portas para terapias inovadoras que tratem não apenas os sintomas, mas a raiz do problema em transtornos como depressão, esquizofrenia e dependência química.



LEIA MAIS:


Human stem cell-derived A10 dopaminergic neurons specifically integrate into mouse circuits and improve depression-like behaviors

Wei Yan, Qinqin Gao, Yingying Zhou, Peibo Xu, Ziyan Wu, Tingli Yuan, Lianshun Xie, Zhiwen You, Xinyue Zhang, Ban Feng, Shanzheng Yang, Yuejun Chen, and Man Xiong 

Cell Stem Cell. 2025 Aug 5:S1934-5909(25)00264-4. Available online 11 August 2025


Abstract: 


A10 dopaminergic neurons located in the ventral tegmental area play central roles in reward-related and goal-directed behaviors and are proposed to be target cells for treatment of various psychiatric disorders, including depression. Here, we report an efficient differentiation method to generate A10-like midbrain dopaminergic (mDA) neurons from human pluripotent stem cells (hPSCs) and found that post-mitotic patterning by Notch inhibitor, glial cell line-derived neurotrophic factor (GDNF), and ascorbic acid (AA) induced A10 subtype specification. These hPSC-derived mDA neurons exhibited characteristics of the A10 subtype, including gene expression profiles and electrophysiological properties. Moreover, grafted A10-like mDA neurons specifically project to their endogenous target brain regions and induce the anxiolytic phenotype in normal mice or antidepressant-like phenotypes in depression model mice. These results indicate that grafted A10-like mDA neurons can reconstruct specific circuits and functionally restore impaired circuits, highlighting the promising application of hPSC-derived neuron subtypes in the treatment of neuropsychiatric disorders.

 
 
 

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