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Colágeno: Juventude Em Pó Ou Placebo Caro?

  • Foto do escritor: Lidi Garcia
    Lidi Garcia
  • 11 de jul.
  • 5 min de leitura
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Uma nova meta-análise com 23 estudos sobre suplementos de colágeno para envelhecimento da pele revelou que, embora estudos em geral indiquem melhora na hidratação, elasticidade e rugas, esses efeitos desaparecem quando se consideram apenas estudos independentes e de alta qualidade. Ou seja, os benefícios só aparecem em pesquisas financiadas pela indústria ou de baixa qualidade. Assim, não há evidência clínica confiável de que suplementos de colágeno previnam ou tratem o envelhecimento da pele. Isso destaca um problema mais amplo: a influência do viés de financiamento na indústria de suplementos, cujas promessas muitas vezes superam as evidências.


O mercado de suplementos de colágeno vem crescendo a passos largos, impulsionado pela promessa de rejuvenescer a pele, fortalecer articulações e promover uma aparência mais jovem. Celebridades, influenciadores e empresas do setor de beleza promovem diariamente os supostos benefícios dessa proteína, gerando um mercado bilionário. 


Só nos Estados Unidos, os consumidores gastaram mais de 4 bilhões de dólares em colágeno, e a expectativa é de crescimento contínuo. Mas uma nova e robusta análise científica acaba de lançar dúvidas sérias sobre a eficácia real desses produtos, especialmente no que diz respeito ao envelhecimento da pele.


O colágeno é uma proteína essencial presente nos tecidos conjuntivos do corpo, como pele, ossos, tendões e ligamentos. Ele representa mais de 90% da composição da pele e é crucial para sua firmeza e elasticidade. Com o passar dos anos, a produção natural de colágeno no corpo diminui, cerca de 1% a 1,5% ao ano, o que contribui para o surgimento de rugas, flacidez e ressecamento da pele. 


A lógica por trás da suplementação seria simples: ao repor o colágeno, melhoraríamos a qualidade da pele. Mas a realidade biológica é bem mais complexa. 

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Existem pelo menos 28 tipos de colágeno identificados, mas os mais relevantes para a saúde humana são os tipos I, II e III. O tipo I é o mais abundante no corpo, responsável por proporcionar resistência à pele, ossos, tendões e ligamentos. O tipo II está presente principalmente nas cartilagens, sendo essencial para a saúde das articulações. Já o tipo III é comum em tecidos mais flexíveis, como vasos sanguíneos e pele jovem, atuando em conjunto com o tipo I. Suplementos geralmente contêm colágeno hidrolisado (ou peptídeos de colágeno), que mistura esses tipos em versões mais facilmente absorvidas pelo organismo.


Quando ingerimos colágeno, seja em forma de pó, cápsula, goma ou bebida, ele é quebrado no sistema digestivo em pequenos fragmentos, os aminoácidos. O corpo, então, os utiliza conforme suas necessidades, podendo usá-los para formar colágeno... ou não. 


O grande desafio é garantir que esses aminoácidos, uma vez absorvidos, sejam de fato utilizados para reconstruir a pele e não outros tecidos. Cientistas ainda não conseguem explicar com clareza como o colágeno ingerido poderia se direcionar especificamente para a derme (camada profunda da pele). Essa lacuna biológica já era um ponto de alerta, e agora há novas evidências que colocam ainda mais dúvidas sobre os reais benefícios da suplementação. 

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Uma nova meta-análise publicada em 2025 analisou 23 ensaios clínicos randomizados (ECRs) com mais de 1.400 participantes, todos avaliando os efeitos dos suplementos de colágeno na pele,  especialmente em termos de hidratação, elasticidade e rugas. 


A princípio, os resultados pareceram promissores: quando todos os estudos foram agrupados, os suplementos mostraram benefícios modestos. No entanto, os autores decidiram investigar mais a fundo, dividindo os estudos de acordo com a qualidade metodológica e a fonte de financiamento. E foi aí que surgiu um padrão preocupante.


Os estudos financiados por empresas do setor, ou seja, com interesse direto na venda do produto,  relataram consistentemente benefícios significativos. Já os estudos independentes, sem ligação com a indústria, não encontraram nenhum efeito mensurável. 


O mesmo aconteceu quando se considerou a qualidade dos estudos: os de alta qualidade não demonstraram benefício real; os de baixa qualidade, por outro lado, apontaram melhorias. 

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A conclusão dos autores foi clara e direta: "atualmente, não há evidência clínica confiável que sustente o uso de suplementos de colágeno para prevenir ou tratar o envelhecimento da pele."


Esse padrão de viés de financiamento não é exclusivo do colágeno. Ele se repete em diversas áreas da indústria de suplementos e levanta questões sérias sobre como decisões de saúde estão sendo influenciadas por marketing, e não por ciência robusta. 


Pior: muitos consumidores acreditam que produtos "naturais" ou "limpos" são automaticamente seguros, ignorando possíveis efeitos colaterais ou a falta de regulação. Existem casos documentados de toxicidade hepática, reações adversas e até internações causadas por suplementos amplamente promovidos.


Ainda assim, é importante reconhecer que os riscos diretos dos suplementos de colágeno parecem ser baixos, e, para muitos, eles são apenas um gasto supérfluo, não um risco à saúde. No entanto, o custo financeiro e o falso senso de segurança podem ser significativos. 

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Pessoas gastam bastante dinheiro esperando resultados que não se concretizam. Além disso, estudos apontam que a maior parte dos produtos de colágeno é vendida em formas e doses que não favorecem a absorção, como gomas com baixo teor da substância e adição de açúcares.


Outro ponto pouco discutido é a origem animal do colágeno: ele é extraído de vacas, porcos, frangos e peixes. Há até preocupações ambientais e sanitárias envolvidas. Já as versões "veganas" de colágeno, na verdade, não contêm colágeno, apenas nutrientes que auxiliariam na sua produção natural, como vitamina C, zinco e alguns aminoácidos.

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Em paralelo, algumas pesquisas emergentes exploram o colágeno em contextos além da estética. Estudos preliminares investigam seu papel em performance atlética, fortalecimento de tendões e até no manejo de dores articulares, como na osteoartrite. Nesses casos, os resultados são variados e ainda inconclusivos. 


Algumas pesquisas sugerem que tomar colágeno combinado com vitamina C antes do exercício  pode estimular a produção natural de colágeno em tecidos conectivos. Porém, esses estudos são limitados, realizados em pequenas amostras e muitas vezes ainda carecem de replicação em populações mais diversas.

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Portanto, a questão central não é se o colágeno é inútil, mas sim se há evidência científica forte o suficiente para justificar seu consumo como estratégia de rejuvenescimento da pele. E, neste momento, a resposta parece ser: não. 


Em vez de apostar em promessas não comprovadas, especialistas recomendam investir em hábitos com eficácia comprovada, como uma alimentação balanceada rica em proteínas e antioxidantes, uso diário de protetor solar, sono de qualidade, controle do estresse e, principalmente, exercícios físicos, especialmente o treino de resistência, que estimula a produção natural de colágeno e promove saúde geral da pele e das articulações.

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Suplementos devem complementar, não liderar, os cuidados com a saúde e o envelhecimento. Questionar evidências fracas, mesmo quando promissoras, é o que move a ciência adiante. Afinal, quando se trata da nossa saúde, esperança não pode substituir rigor.



LEIA MAIS:


Effects of Collagen Supplements on Skin Aging: A Systematic Review and Meta-Analysis of Randomized Controlled Trials

Seung-Kwon Myung, and Yunseo Park 

The American Journal of Medicine. 3 May 2025


Abstract: 


Collagen supplements are promoted to help aging skin. However, no meta-analysis of randomized controlled trials (RCTs) has examined their effects by funding source and study quality, which may influence outcomes. PubMed, Embase, and Cochrane Library were searched from inception to June 14, 2024. A total of 23 RCTs with 1474 participants were analyzed. In a meta-analysis of all 23 RCTs, collagen supplements significantly improved skin hydration, elasticity, and wrinkles. However, in the subgroup meta-analysis by funding source, studies not receiving funding from pharmaceutical companies revealed no effect of collagen supplements for improving skin hydration, elasticity, and wrinkles, while those receiving funding from pharmaceutical companies did show significant effects. Similarly, high-quality studies revealed no significant effect in all categories, while low-quality studies revealed a significant improvement in elasticity. There is currently no clinical evidence to support the use of collagen supplements to prevent or treat skin aging.



BBC

Collagen supplements: The secret to perfect skin, or marketing hype?

By Christine Ro

 
 
 

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