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Quando o Cérebro Esquece Vínculos: A Descoberta da Região Cerebral Que Faz Esquecer Entes Queridos No Alzheimer's

  • Foto do escritor: Lidi Garcia
    Lidi Garcia
  • 3 de dez.
  • 4 min de leitura
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Este estudo mostra que a perda de memória social no Alzheimer está ligada à destruição das redes perineuronais na região CA2 do hipocampo. Quando essas redes desaparecem, as sinapses ficam vulneráveis e a memória se deteriora. Bloquear as enzimas que destroem essas estruturas pode proteger o cérebro e retardar os sintomas, indicando uma nova possibilidade de tratamento.


A doença de Alzheimer é hoje a principal causa de demência no mundo e afeta dezenas de milhões de pessoas. Ela começa de maneira sutil, com pequenas falhas de memória, dificuldade de manter a atenção e mudanças comportamentais. Com o tempo, esses sintomas se intensificam e passam a comprometer a identidade da pessoa: nomes são esquecidos, rostos deixam de ser reconhecidos e relações sociais tornam-se difíceis. 


Essas mudanças não acontecem ao acaso, mas acompanham transformações profundas no cérebro, como o acúmulo de proteínas tóxicas chamadas beta-amiloide e tau, a morte de neurônios, redução das conexões sinápticas e aumento de inflamação e estresse oxidativo.


Nos últimos anos, pesquisadores começaram a observar outra alteração importante no cérebro com Alzheimer: mudanças na matriz extracelular, que é o material que envolve e sustenta os neurônios. Dentro dessa estrutura existe uma forma mais organizada chamada rede perineuronal. Essas redes funcionam como uma proteção e ao mesmo tempo um regulador da atividade dos neurônios. 


Elas são compostas de moléculas como ácido hialurônico, proteínas específicas e proteoglicanos, entre eles o agrecano. Em regiões essenciais para a memória, como o hipocampo, essas redes envolvem células que ajudam a controlar a atividade elétrica e a manter a estabilidade das sinapses. Uma parte específica do hipocampo, chamada região CA2, é especialmente interessante porque participa de um tipo de memória altamente social: a capacidade de reconhecer indivíduos familiares.


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Diversos estudos mostraram que no cérebro com Alzheimer essas redes perineuronais estão enfraquecidas ou fragmentadas. Essa destruição está associada a processos inflamatórios que aumentam enzimas capazes de degradar a matriz extracelular. Essas enzimas incluem as metaloproteinases, que funcionam como “tesouras biológicas”, cortando estruturas celulares.


A hipótese levantada pelos cientistas é que, quando essas redes se rompem, as sinapses ficam mais vulneráveis, deixando o cérebro menos capaz de manter memórias e mais exposto a danos.


Para testar essa hipótese, os pesquisadores utilizaram um modelo animal de Alzheimer chamado 5XFAD, um tipo de camundongo geneticamente modificado para desenvolver alterações semelhantes às vistas em humanos com a doença. A parte metodológica deste estudo é especialmente importante, pois mostra como diferentes técnicas científicas podem ser combinadas para responder uma única pergunta. 


Primeiramente, os cientistas usaram microscopia e marcadores biológicos para visualizar as redes perineuronais no cérebro desses animais. Em paralelo, realizaram testes comportamentais para medir a capacidade dos camundongos reconhecerem outros da mesma espécie. Esses testes são fundamentais porque traduzem alterações microscópicas em comportamentos observáveis. 


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Também foram usados métodos de sequenciamento de RNA para identificar quais genes estavam sendo ativados ou desativados na região CA2, permitindo compreender quais mecanismos biológicos estavam em funcionamento. Além disso, técnicas de manipulação genética e digestão enzimática foram utilizadas para remover artificialmente as redes perineuronais, testando se a sua ausência poderia, por si só, causar perda de memória social. 


E, por fim, medicamentos conhecidos por bloquear a atividade das metaloproteinases foram administrados para observar se seria possível impedir o dano e preservar a função cognitiva.


Os resultados foram claros: os camundongos com Alzheimer apresentaram uma redução acentuada das redes perineuronais na região CA2, e essa perda coincidia com o aparecimento dos déficits de memória social. Quando os pesquisadores romperam essas redes artificialmente em animais saudáveis, esses camundongos passaram a apresentar problemas de memória semelhantes aos do modelo de Alzheimer, o que mostra uma relação de causa e efeito. 


A análise molecular revelou que as enzimas responsáveis por cortar a matriz extracelular estavam anormalmente aumentadas, sugerindo um desequilíbrio entre destruição e reparação das redes. 


O passo mais promissor veio quando os pesquisadores trataram os animais com uma substância capaz de inibir essas enzimas. Os camundongos tratados preservaram melhor as redes perineuronais e mantiveram a memória social por mais tempo.


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Essas descobertas revelam não apenas que a perda da memória social no Alzheimer está diretamente relacionada à destruição dessas redes protetoras ao redor dos neurônios CA2, mas também mostram que esse processo pode ser freado. Isso abre caminho para uma nova linha de terapia que não mira diretamente as proteínas tóxicas clássicas do Alzheimer, mas sim o ambiente que sustenta as conexões neuronais.



LEIA MAIS:


Degradation of perineuronal nets in hippocampal CA2 explains the loss of social cognition memory in Alzheimer's disease

Lata Chaunsali, Jiangtao Li, Erik Fleischel, Courtney E. Prim, Izabela Kasprzak, Shan Jiang, Silky Hou, Miguel Escalante, Elise C. Cope, Michelle L. Olsen, Bhanu P. Tewari, Harald Sontheimer

Alzheimer’s and Dementia. Volume21, Issue10, October 2025, e70813


Abstract:


Loss of social cognition memory impairs Alzheimer's disease (AD) patients to recognize family members, friends, and caregivers. We investigate the role of perineuronal nets (PNNs), specialized coats of extracellular matrix around hippocampal CA2 neurons in AD-associated social memory impairments. We utilized 5XFAD mouse model of AD and employed immunohistochemistry, microscopy, bulk RNA-sequencing, animal behavior, gene-knockout, and drug-treatment approaches. AD mice showed profound disruption of CA2 PNNs with concomitant impairment of social cognition memory. Genetic or enzymatic CA2 PNN disruption in wild-type mice mimicked these impairments. Transcriptomic analysis shows upregulation of PNN-cleaving matrix metalloproteinases (MMP) in AD mice causing disequilibrium of PNN synthesis and remodeling. Chronic inhibition of MMPs retains CA2 PNN and delays social memory impairments in 5XFAD mice. AD-associated social memory impairments are caused by loss of CA2 PNNs. Inhibition of PNN proteolysis by MMPs preserves social memory, suggesting PNN as a promising therapeutic target.

 
 
 

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