Genes Sob Vigilância: Nova IA Mostra Quando Os Genes Estão Ativados ou Não
- Lidi Garcia
- 5 de set.
- 4 min de leitura

Durante o desenvolvimento do corpo, os genes precisam ser ativados e desligados no momento certo para que as células assumam suas funções corretas. Quando isso falha, podem surgir doenças. Pesquisadores criaram uma ferramenta chamada chronODE, que usa matemática e inteligência artificial para acompanhar como os genes são regulados ao longo do tempo. Com ela, descobriram padrões que mostram como o DNA e seus mecanismos de controle trabalham em conjunto, o que pode ajudar a entender melhor o desenvolvimento do cérebro e abrir caminho para novos tratamentos.
Durante o desenvolvimento de um organismo, cada célula precisa “decidir” qual será sua função, por exemplo, virar uma célula do cérebro, do músculo ou do sangue. Essas decisões dependem de quais genes estão ativos ou inativos em cada momento. Quando os genes são ativados ou desligados fora de hora, as células podem perder sua função normal e até causar doenças.
O controle desses processos é feito em grande parte por mecanismos chamados epigenéticos, que regulam como o DNA é lido sem mudar a sua sequência. Entender a velocidade e o ritmo com que esses genes são ativados ou silenciados é essencial para compreender tanto o funcionamento saudável do corpo quanto o surgimento de problemas.
Se for possível controlar esses processos com precisão, pode-se também abrir caminho para novos tratamentos que ajustem a atividade dos genes de forma direcionada.

Para estudar esses ritmos, os cientistas da Yale University, USA, analisam como a expressão dos genes e a estrutura da cromatina (a forma como o DNA se organiza dentro das células) mudam ao longo do tempo.
Observar apenas momentos isolados não é suficiente, porque isso dá apenas “fotografias paradas” dos processos. Já acompanhar os genes em diferentes momentos permite revelar padrões dinâmicos, como se fosse um filme. No entanto, lidar com esses dados é um desafio, porque eles contêm muito “ruído” e são extremamente interligados, exigindo métodos computacionais sofisticados para separar os sinais importantes e entender o que de fato está acontecendo nas células.
Os mecanismos epigenéticos, como a abertura da cromatina ou as modificações químicas nas proteínas chamadas histonas, seguem princípios básicos. Um deles é a cooperatividade: quando a cromatina começa a se abrir, o processo tende a se reforçar, facilitando ainda mais a abertura. O mesmo vale para modificações das histonas, que podem se espalhar rapidamente para regiões vizinhas.

O outro princípio é a saturação: esses processos têm limites naturais e não podem continuar indefinidamente, já que dependem da quantidade de moléculas disponíveis. Esses conceitos também ajudam a entender como a produção de RNA, que é a cópia feita dos genes, varia no tempo, mostrando que a expressão gênica é regida por regras semelhantes às da cromatina.
Apesar dos avanços no estudo das taxas de produção e degradação de RNA, ainda sabemos pouco sobre como os processos epigenéticos mudam ao longo do tempo e como influenciam diretamente a atividade dos genes.
Para enfrentar esse desafio, os cientistas desenvolveram uma nova ferramenta chamada chronODE, que combina modelos matemáticos e inteligência artificial para analisar dados de várias camadas biológicas ao longo do tempo. Essa ferramenta consegue suavizar os sinais “barulhentos” dos experimentos e identificar diferentes padrões de ativação ou repressão dos genes.
Os pesquisadores aplicaram o chronODE em dados do desenvolvimento cerebral de camundongos e observaram que a maioria dos genes (~87%) segue um padrão de ativação gradual e limitado, como uma curva logística. Apenas uma pequena parcela de genes acelera rapidamente e atinge altos níveis de atividade, o que mostra que existem restrições químicas que impedem que todos os genes funcionem dessa maneira.
Eles também descobriram que genes ativados em diferentes fases do desenvolvimento seguem ritmos distintos, sendo que os mais essenciais para a formação do cérebro apresentam aceleração mais rápida.

Distribuição dos parâmetros cinéticos k (eixo y) e b (eixo x) para genes ativados (k > 0) em 41 tipos de células cerebrais. Os tipos celulares foram agrupados com base no dia de aparecimento durante o período embrionário (entre 8 e 9, 9 e 10, 10 e 11, 12 e 13 e 14 e 15 dias embrionários [E]).
Além disso, o chronODE mostrou que elementos regulatórios próximos aos genes são importantes para decidir se eles serão ativados ou silenciados, enquanto elementos mais distantes controlam o ritmo e o padrão dessas mudanças. Para aprofundar ainda mais as previsões, os cientistas usaram redes neurais recorrentes, que aprenderam a prever como alterações na cromatina se refletem em mudanças na expressão dos genes.
De forma geral, essa abordagem abre caminho para compreender melhor como os genes e seus mecanismos de controle trabalham de forma coordenada no tempo. Isso pode ajudar a entender tanto o desenvolvimento normal dos organismos quanto o surgimento de doenças, além de oferecer novas possibilidades de intervenção terapêutica.
LEIA MAIS:
The chronODE framework for modelling multi-omic time series with ordinary differential equations and machine learning
Beatrice Borsari, Mor Frank, Eve S. Wattenberg, Ke Xu, Susanna X. Liu, Xuezhu Yu, and Mark Gerstein
Nature Communications. 16, 7021 (2025).
Abstract:
Many genome-wide studies capture isolated moments in cell differentiation or organismal development. Conversely, longitudinal studies provide a more direct way to study these kinetic processes. Here, we present an approach for modeling gene-expression and chromatin kinetics from such studies: chronODE, an interpretable framework based on ordinary differential equations. chronODE incorporates two parameters that capture biophysical constraints governing the initial cooperativity and later saturation in gene expression. These parameters group genes into three major kinetic patterns: accelerators, switchers, and decelerators. Applying chronODE to bulk and single-cell time-series data from mouse brain development reveals that most genes (~87%) follow simple logistic kinetics. Among them, genes with rapid acceleration and high saturation values are rare, highlighting biochemical limitations that prevent cells from attaining both simultaneously. Early- and late-emerging cell types display distinct kinetic patterns, with essential genes ramping up faster. Extending chronODE to chromatin, we find that genes regulated by both enhancer and silencer cis-regulatory elements are enriched in brain-specific functions. Finally, we develop a bidirectional recurrent neural network to predict changes in gene expression from corresponding chromatin changes, successfully capturing the cumulative effect of multiple regulatory elements. Overall, our framework allows investigation of the kinetics of gene regulation in diverse biological systems.



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