
Esses resultados indicam que a dieta cetogênica pode ser uma abordagem promissora para complementar o tratamento de doenças mentais graves, oferecendo benefícios tanto para a saúde metabólica quanto para os sintomas psiquiátricos. Embora mais pesquisas sejam necessárias, essa estratégia pode representar uma alternativa valiosa para melhorar a vida de pessoas que enfrentam esses desafios diariamente.
Milhões de pessoas em todo o mundo enfrentam doenças mentais graves, como esquizofrenia e transtorno bipolar. Embora existam tratamentos eficazes, muitos pacientes enfrentam desafios como resistência aos medicamentos ou efeitos colaterais graves, que podem comprometer sua qualidade de vida e até levar à interrupção do tratamento.
Além disso, certos medicamentos usados para tratar essas condições podem aumentar o risco de morte prematura, especialmente em populações vulneráveis, como idosos com demência.
Estudos indicam que, a longo prazo, os remédios antipsicóticos podem ser benéficos para a esquizofrenia, mas seus efeitos colaterais metabólicos podem reduzir a expectativa de vida dos pacientes. A diferença na longevidade entre pessoas com esquizofrenia e a população geral tem aumentado nos últimos anos.
Se houvesse um tratamento capaz de reduzir os efeitos metabólicos negativos desses medicamentos sem comprometer seus benefícios neuroprotetores, a qualidade de vida desses pacientes poderia melhorar significativamente.

A dieta cetogênica, que já é utilizada no tratamento da epilepsia resistente a medicamentos, pode ser uma alternativa promissora. Essa dieta reduz a ingestão de carboidratos e faz com que o corpo utilize gordura como principal fonte de energia, produzindo moléculas chamadas corpos cetônicos.
Esses compostos podem servir como combustível alternativo para o cérebro, ajudando a estabilizar a atividade neuronal. Além disso, a dieta cetogênica tem mostrado potencial para reduzir inflamações e melhorar a função cerebral.
Pesquisas recentes sugerem que doenças como esquizofrenia e transtorno bipolar podem estar ligadas a problemas metabólicos no cérebro, como dificuldades no uso da glicose, estresse oxidativo e falhas na produção de energia nas células cerebrais.
Esses fatores podem prejudicar a comunicação entre os neurônios e aumentar a instabilidade da atividade cerebral. Como a dieta cetogênica altera o metabolismo do cérebro e reduz inflamações, ela pode oferecer benefícios para o tratamento dessas doenças, sem os efeitos colaterais dos medicamentos tradicionais.

Pessoas com transtornos mentais graves também estão entre os grupos mais afetados pela obesidade e problemas metabólicos. Estudos mostram que pacientes com esquizofrenia ou transtorno bipolar têm um risco significativamente maior de desenvolver diabetes tipo 2 e doenças cardiovasculares.
Além disso, os próprios medicamentos psiquiátricos podem agravar esses problemas metabólicos, levando a ganho de peso e resistência à insulina. Isso faz com que muitos pacientes abandonem o tratamento, aumentando as chances de recaída e hospitalização.
Entre os adultos dos EUA com doença mental grave, a síndrome metabólica é uma condição altamente prevalente que tem consequências graves, com pacientes estimados morrendo em média 10–25 anos antes da população em geral, em grande parte de doença cardiovascular prematura.
Como já foi demonstrado que a dieta cetogênica melhora a saúde metabólica e reduz o risco cardiovascular em pessoas com diabetes e resistência à insulina, pesquisadores começaram a investigar seus possíveis benefícios para pacientes psiquiátricos.
Embora ainda seja um campo novo, estudos preliminares sugerem que essa abordagem pode melhorar sintomas psiquiátricos e qualidade de vida sem os efeitos adversos das medicações tradicionais.
Para testar essa hipótese, um estudo piloto foi conduzido com 23 pacientes com idades entre 18–75, que completaram o estudo, 5 foram diagnosticados com esquizofrenia e 16 foram diagnosticados com transtorno bipolar, todos com problemas metabólicos.
Durante quatro meses, eles seguiram uma dieta cetogênica e foram monitorados para avaliar mudanças na saúde metabólica e nos sintomas psiquiátricos.
Os participantes não precisavam contar calorias, apenas monitorar a ingestão de carboidratos (cerca de 20 g/dia, excluindo fibras), consumir vegetais e saladas diariamente e manter uma boa hidratação.
Eles foram instruídos a medir os níveis de cetona no sangue semanalmente, sendo classificados como aderentes (0,5–5 mM de cetonas em 80–100% das medições), semi-aderentes (50–79%) ou não aderentes (<50%).

Os resultados foram promissores: ao final do estudo, nenhum dos participantes atendia mais aos critérios de síndrome metabólica. Houve uma redução significativa no peso corporal (12%), no índice de massa corporal (IMC) (12%), na circunferência da cintura (13%) e na gordura visceral (36%). Além disso, marcadores metabólicos como resistência à insulina e níveis de triglicerídeos também apresentaram melhorias expressivas.

Alterações metabólicas ao longo do período de teste para populações aderentes e semi-aderentes. ApoB, Apolipoproteína B; IMC, Índice de Massa Corporal; PA, pressão arterial; BPRS, Escala Breve de Avaliação Psiquiátrica; CGI, Impressão Clínica Global; CHOL/HDLC, razão colesterol/lipoproteína de alta densidade; FMI, Índice de Massa Gorda; GAD–7, Escala de Transtorno de Ansiedade Geral de 7 itens; GAF, Avaliação global do funcionamento; HDL, lipoproteína de alta densidade; HOMA–IR, Avaliação do Modelo Homeostático para Resistência à Insulina; hs–CRP, proteína C-reativa de alta sensibilidade; LDL, lipoproteína de baixa densidade; MANSA, Avaliação Curta de Qualidade de Vida de Manchester; PHQ–9, Questionário de Saúde do Paciente–9; PSQI, Índice de Qualidade do Sono de Pittsburgh; VAT, Tecido Adiposo Visceral; Circunferência da Cintura, Circunferência da Cintura.
Do ponto de vista psiquiátrico, os participantes com esquizofrenia tiveram uma redução de 32% nos sintomas, segundo uma escala de avaliação médica.
De maneira geral, a gravidade dos sintomas foi reduzida em 31%, e 79% dos pacientes que inicialmente apresentavam sintomas intensos mostraram melhora significativa. Além disso, os participantes relataram maior satisfação com a vida e melhora na qualidade do sono.
Esses resultados indicam que a dieta cetogênica pode ser uma abordagem promissora para complementar o tratamento de doenças mentais graves, oferecendo benefícios tanto para a saúde metabólica quanto para os sintomas psiquiátricos. Embora mais pesquisas sejam necessárias, essa estratégia pode representar uma alternativa valiosa para melhorar a vida de pessoas que enfrentam esses desafios diariamente.
LEIA MAIS:
Ketogenic Diet Intervention on Metabolic and Psychiatric Health in Bipolar and Schizophrenia: A Pilot Trial
Shebani Sethi, Diane Wakeham, Terence Ketter, Farnaz Hooshmand, Julia Bjornstad, Blair Richards, Eric Westman, Ronald M Krauss, Laura Saslow
Psychiatry Research. Volume 335, May 2024, 115866
Abstract:
The ketogenic diet (KD, also known as metabolic therapy) has been successful in the treatment of obesity, type 2 diabetes, and epilepsy. More recently, this treatment has shown promise in the treatment of psychiatric illness. We conducted a 4–month pilot study to investigate the effects of a KD on individuals with schizophrenia or bipolar disorder with existing metabolic abnormalities. Twenty–three participants were enrolled in a single–arm trial. Results showcased improvements in metabolic health, with no participants meeting metabolic syndrome criteria by study conclusion. Adherent individuals experienced significant reduction in weight (12 %), BMI (12 %), waist circumference (13 %), and visceral adipose tissue (36 %). Observed biomarker enhancements in this population include a 27 % decrease in HOMA–IR, and a 25 % drop in triglyceride levels. In psychiatric measurements, participants with schizophrenia showed a 32 % reduction in Brief Psychiatric Rating Scale scores. Overall Clinical Global Impression (CGI) severity improved by an average of 31 %, and the proportion of participants that started with elevated symptomatology improved at least 1–point on CGI (79 %). Psychiatric outcomes across the cohort encompassed increased life satisfaction (17 %) and enhanced sleep quality (19 %). This pilot trial underscores the potential advantages of adjunctive ketogenic dietary treatment in individuals grappling with serious mental illness.
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