
Indivíduos percebem intenções, não apenas em interações humanas, mas também ao observar movimentos simples, como os de formas geométricas. Quando essas atribuições de intenções falham, podem surgir condições como paranoia (crença em intenções maliciosas) e pensamento teleológico excessivo (ver propósito em eventos aleatórios). Pessoas com maior paranoia ou pensamento teleológico frequentemente relataram ver perseguições quando não havia nenhuma (falsos alarmes).
As pessoas conseguem perceber intenções não apenas ao interagir com outras pessoas, mas também ao observar movimentos simples, como o de formas geométricas.
Essas percepções surgem de características visuais básicas, como proximidade, direção e padrões de interação, e são processadas rapidamente por áreas específicas do cérebro que lidam com informações sociais.
Quando esse processo de atribuição de intenções falha, podem surgir sintomas como paranoia (a crença de que outros têm intenções maliciosas) e pensamento teleológico excessivo (a tendência de ver propósito em eventos sem intenção).
Embora pareçam diferentes, ambos estão relacionados à Teoria da Mente (ToM), que é a capacidade de atribuir estados mentais a outras pessoas.
Em pessoas paranoicas, um déficit na ToM pode dificultar o raciocínio sobre intenções hipotéticas. Já no pensamento teleológico, a ToM pode estar envolvida porque ver propósito implica imaginar agentes com intenções.
Diversos trabalhos investigam se essas crenças complexas, como paranoia e teleologia, podem ter raízes mais profundas em como percebemos o mundo ao nosso redor.

Os pesquisadores de Yale exploraram como pessoas percebem intenções sociais, mesmo em situações muito simples, como observar formas geométricas (discos) se movendo em uma tela.
Eles investigaram se crenças de alto nível, como paranoia (crença em intenções maliciosas de outros) e teleologia (tendência a atribuir propósito a eventos não intencionais), poderiam ser influenciadas por mecanismos perceptivos básicos relacionados à percepção de intenções.
O estudo se baseou na ideia de que nossa percepção social pode começar com sinais visuais simples, como distância, direção e movimento relativo.
Para investigar isso, os cientistas usaram um experimento no qual os participantes observavam discos em movimento em uma tela. Eles deveriam identificar se um disco ("lobo") perseguia outro ("ovelha"). Em algumas situações, a perseguição era real, mas em outras, ela não existia, o movimento era apenas aleatório ou refletia manipulações visuais que criavam a ilusão de perseguição.
A dificuldade da tarefa foi manipulada ao variar o "ruído" no movimento do lobo. Por exemplo, quando o lobo seguia a ovelha com alta precisão, a perseguição era fácil de detectar. Mas quando o movimento era menos direto, a percepção de perseguição tornava-se ambígua.
Esse design permitiu aos pesquisadores medir se pessoas com tendências paranoicas ou teleológicas eram mais propensas a "ver" perseguições onde não havia nenhuma.

Condições de perseguição presente (A) e perseguição ausente (B). A) é um exemplo gráfico de um teste de perseguição presente, onde o lobo persegue a ovelha com uma sutileza de perseguição de 30°. A ovelha se move aleatoriamente pela tela, assim como os discos distratores. B) é uma exibição gráfica de uma condição de controle de perseguição ausente, onde o lobo persegue uma ovelha invisível que espelha os movimentos de outro disco que se move aleatoriamente.
Para analisar as respostas, os pesquisadores usaram tanto relatos comportamentais (o que os participantes disseram ver) quanto medidas de confiança (o quão certos estavam de suas respostas).
Além disso, eles correlacionaram esses resultados com características individuais, como a tendência dos participantes para paranoia ou pensamento teleológico.
Os resultados mostram que pessoas com maior paranoia ou pensamento teleológico frequentemente relataram ver perseguições quando não havia nenhuma (falsos alarmes).
Esses participantes também tinham mais dificuldade em identificar corretamente qual disco era o "lobo" ou a “ovelha".
Essas pessoas estavam extremamente confiantes em suas respostas, mesmo quando estavam erradas. Essa confiança em percepções equivocadas é semelhante ao que ocorre em alucinações sociais.
Embora ambos os grupos mostrassem erros perceptivos, as características específicas dos erros variaram. Paranoicos tinham mais dificuldade em identificar a ovelha (a vítima), enquanto os teleológicos encontravam mais dificuldades em identificar o lobo (o perseguidor).
Esses resultados sugerem que crenças como paranoia e teleologia podem estar enraizadas em mecanismos perceptivos básicos e automáticos. Essas crenças aberrantes não são apenas raciocínios de "alto nível", mas podem surgir de interpretações automáticas de estímulos visuais simples.

Além disso, os resultados indicam que os sistemas neurais envolvidos na percepção social, como a junção temporoparietal e o sulco temporal superior posterior, desempenham um papel crucial na maneira como processamos intenções, mesmo em situações aparentemente triviais.
Esses sistemas estão mais relacionados à percepção "inferior" (visual) do que ao raciocínio "superior" (cognitivo).
Os pesquisadores conectaram crenças de nível superior (paranoia e teleologia) com erros perceptivos em tarefas visuais simples, como a identificação de perseguição.
Isso ajuda a entender como alucinações sociais, uma característica comum de transtornos como a esquizofrenia, podem se relacionar a processos perceptivos básicos.
A abordagem também pode contribuir para novos métodos de diagnóstico e tratamento de distúrbios envolvendo pensamentos e crenças aberrantes.
LEIA MAIS:
Paranoid and teleological thinking give rise to distinct social hallucinations in vision
Santiago Castiello, Joan Danielle K. Ongchoco, Benjamin van Buren, Brian J. Scholl & Philip R. Corlett
Communications Psychology, volume 2, Article number: 117 (2024)
Abstract:
Paranoia (believing others intend harm) and excess teleological thinking (ascribing too much purpose) are non-consensual beliefs about agents. Human vision rapidly detects agents and their intentions. Might paranoia and teleology have roots in visual perception? Using displays that evoke the impression that one disc (‘wolf’) is chasing another (‘sheep’), we find that paranoia and teleology involve perceiving chasing when there is none (studies 1 and 2) — errors we characterize as social hallucinations. When asked to identify the wolf or the sheep (studies 3, 4a, and 4b), we find high-paranoia participants struggled to identify sheep, while high-teleology participants were impaired at identifying wolves — both despite high-confidence. Both types of errors correlated with hallucinatory percepts in the real world. Although paranoia and teleology both involve excess perception of agency, the current results collectively suggest a perceptual distinction between the two, perhaps with clinical import.
Comments