Por que a Depressão Afeta Mais as Meninas? Novo Estudo Pode Ter a Resposta
- Lidi Garcia
- 28 de mar.
- 4 min de leitura

O estudo analisou a relação entre a depressão na adolescência e um desequilíbrio químico no cérebro, especialmente na via da quinurenina, que pode produzir substâncias protetoras ou tóxicas para os neurônios. Os resultados mostraram que meninas com maior risco ou já diagnosticadas com depressão tinham menos substâncias neuroprotetoras e mais neurotóxicas, o que pode dificultar a recuperação. Além disso, a inflamação parece influenciar esse desequilíbrio. Esses achados ajudam a entender melhor a biologia da depressão em adolescentes e podem contribuir para novos tratamentos.
A depressão é um transtorno que pode começar já na adolescência, um período sensível do desenvolvimento. Ela é mais comum em mulheres do que em homens, especialmente após a puberdade.
Além dos impactos emocionais, a depressão nessa fase pode prejudicar o desempenho escolar, as relações sociais e até aumentar o risco de suicídio.
Apesar das melhorias em nossa compreensão dos mecanismos biológicos que fundamentam o desenvolvimento, patogênese e recorrência da depressão adulta, muito pouca pesquisa foi conduzida sobre os mecanismos biológicos envolvidos no risco e desenvolvimento de depressão em populações adolescentes e, em particular, com foco nas diferenças potenciais entre adolescentes do sexo masculino e feminino.
Isso é crucial para informar o foco e o direcionamento de intervenções preventivas. Além disso, dado que 90% dos adolescentes do mundo vivem em países de baixa e média renda, é importante examinar os mecanismos biológicos que sustentam o desenvolvimento da depressão em adolescentes que vivem nesses contextos.

Os cientistas sabem que substâncias químicas no cérebro influenciam a depressão. Uma dessas substâncias é o triptofano, um aminoácido essencial que pode ser transformado em serotonina (um neurotransmissor associado ao bem-estar) ou seguir outro caminho, chamado via da quinurenina.
Esse caminho pode levar à produção de substâncias que protegem os neurônios (neuroprotetoras) ou de outras que podem ser tóxicas para eles (neurotóxicas).
As pesquisas mostram que, em adultos com depressão, há um desequilíbrio nessa via: há mais produção de substâncias neurotóxicas e menos das neuroprotetoras.
Além disso, a inflamação do corpo, que envolve moléculas chamadas citocinas pró-inflamatórias, pode interferir nessa via e levar a um maior risco de depressão. O estudo queria entender se esse mesmo desequilíbrio acontece em adolescentes e se ele afeta meninos e meninas de forma diferente.
O projeto atual foi conduzido como parte do estudo IDEA-RiSCo (Identifying Depression Early in Adolescence Risk-Stratified Cohort), uma coorte longitudinal recrutada para investigação aprofundada de fatores neurobiológicos, psicológicos e ambientais associados ao aumento do risco e da presença de depressão.

Após a triagem de 7.720 adolescentes de escolas públicas de Porto Alegre, no sul do Brasil, 150 adolescentes de 14 a 16 anos foram selecionados para serem incluídos no estudo. Os pesquisadores analisaram os níveis das substâncias da via da quinurenina no sangue de adolescentes brasileiros, divididos em três grupos:
Baixo risco de desenvolver depressão.
Alto risco de desenvolver depressão.
Já diagnosticados com transtorno depressivo maior (TDM).
Eles também acompanharam os adolescentes do terceiro grupo por três anos para ver se a depressão persistia ou melhorava.Os resultados mostraram que adolescentes do segundo e terceiro grupo tinham menos substâncias neuroprotetoras no sangue do que aqueles de baixo risco.
Esse efeito parecia ser mais forte nas meninas do que nos meninos. As substâncias inflamatórias estavam ligadas a um aumento das substâncias neurotóxicas, principalmente nos grupos de alto risco e já diagnosticados.
Entre as meninas com depressão, aquelas que continuaram deprimidas três anos depois tinham, desde o início, um padrão químico diferente no sangue: menos quinurenina e mais substâncias neurotóxicas.

Os resultados sugerem que as meninas adolescentes podem ser mais vulneráveis à depressão devido a diferenças biológicas em como seus corpos processam o triptofano. Se essa via estiver desregulada, pode aumentar o risco de depressão e dificultar a recuperação.
Além disso, a inflamação pode estar desempenhando um papel importante, ajudando a "empurrar" o organismo para a produção de substâncias mais tóxicas para o cérebro.
Esses achados ajudam a entender melhor os processos biológicos que contribuem para a depressão em adolescentes, o que pode levar a novos tratamentos mais eficazes e personalizados. Se os cientistas conseguirem equilibrar essa via bioquímica, talvez seja possível reduzir o risco de depressão ou ajudar as pessoas a se recuperarem mais rápido.
Em resumo, a pesquisa sugere que a depressão na adolescência, especialmente em meninas, pode estar ligada a um desequilíbrio químico no cérebro que aumenta a produção de substâncias neurotóxicas, e isso pode ser influenciado pela inflamação do corpo.
Esse conhecimento pode ser fundamental para desenvolver novas estratégias de prevenção e tratamento no futuro.
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Sex-Specific Alterations of the Kynurenine Pathway in Association With Risk for and Remission of Depression in Adolescence
Naghmeh Nikkheslat, Zuzanna Zajkowska, Cristina Legido-Quigley, Jin Xu, Pedro H. Manfro, Laila Souza, Rivka Pereira, Fernanda Rohrsetzer, Jader Piccin, Anna Viduani, Brandon A. Kohrt, Helen L. Fisher, Christian Kieling and Valeria Mondelli
Biological Psychiatry. 25 March 2025,
DOI: 10.1016/j.biopsych.2024.11.020
Abstract:
The imbalance between neurotoxic and neuroprotective metabolites of the kynurenine pathway has been implicated in the pathophysiology of major depressive disorder (MDD) in adulthood but has not been fully investigated among adolescents. In this study, we tested the association of kynurenine pathway metabolites with risk for and remission of adolescent depression and whether abnormalities in the kynurenine pathway are sex specific. Kynurenine pathway metabolites were measured in plasma at baseline in the IDEA-RiSCo (Identifying Depression Early in Adolescence Risk-Stratified Cohort), a longitudinal study of adolescents (15.6 ± 0.8 years; 50% female) stratified into 3 groups (each n = 50): 1) at low risk for developing depression, 2) at high risk for developing depression, or 3) with MDD. Adolescents with MDD at baseline were followed up after 3 years (n = 41) to assess remission or persistence of MDD. Cross-sectional analyses at baseline showed that adolescents at high risk for depression and adolescents with MDD had lower kynurenic acid concentrations and kynurenic acid/quinolinic acid ratio than low-risk adolescents. These differences were not present in males but appeared to be driven by females. Proinflammatory cytokines positively correlated with neurotoxic metabolites, specifically in the high-risk and MDD groups. Female individuals with persistent MDD at the 3-year follow-up showed lower baseline kynurenine and higher 3-hydroxykynurenine/kynurenine ratio than those who experienced remission at 3-year follow-up. The findings suggest a sex-specific kynurenine pathway alteration in adolescent depression. Female adolescents at higher risk for or with depression showed a reduction in neuroprotective metabolites. An increased diversion of kynurenine toward production of neurotoxic metabolites predicted persistent depression in female adolescents with MDD.
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