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Ocitocina: O Segredo Por Trás Das Líderes Ferozes, Principalmente Mulheres

  • Foto do escritor: Lidi Garcia
    Lidi Garcia
  • há 6 dias
  • 5 min de leitura

Pesquisadores descobriram que em primatas lêmures, espécies onde machos e fêmeas convivem de forma mais igualitária têm mais receptores de ocitocina no cérebro, especialmente na área ligada a emoções como medo e raiva. Isso sugere que a ocitocina ajudou a reduzir a agressividade, promovendo relações mais pacíficas, uma descoberta que também pode ter implicações para entender o comportamento social em humanos.


A agressão e as substâncias químicas cerebrais que a controlam são geralmente estudadas em machos. Como resultado, os cientistas sabem muito menos sobre como a agressão feminina funciona. 


Para entender melhor como a agressão competitiva é regulada no cérebro feminino, pesquisadores estudaram lêmures, pequenos primatas de Madagascar, comparando machos e fêmeas de diferentes espécies. 


Algumas dessas espécies são predominantemente femininas, o que significa que as fêmeas são mais agressivas e controlam o acesso a alimentos e locais de descanso, enquanto outras têm relações mais equitativas entre machos e fêmeas.


Neste estudo, os cientistas analisaram tecidos cerebrais de sete espécies intimamente relacionadas de lêmures do gênero Eulemur. Eles se concentraram em como dois hormônios envolvidos no comportamento social, a ocitocina (frequentemente chamada de "hormônio do amor") e a vasopressina, atuam no cérebro. 

Usando uma técnica chamada autorradiografia, eles mapearam onde esses hormônios se ligam às células cerebrais. 


Autorradiografia é uma técnica de imagem usada para visualizar a distribuição de moléculas específicas em tecidos (como no cérebro) usando material radioativo. Em termos simples, os cientistas “marcam” uma substância de interesse (por exemplo, um hormônio ou um receptor) com um pequeno traço radioativo, e depois detectam onde essa substância se liga ou se acumula no tecido.


Como funciona, passo a passo:


  1. Marcação Radioativa:


    Primeiro, os pesquisadores pegam uma molécula que se liga especificamente ao que eles querem estudar (como o receptor de ocitocina) e a modificam para que ela contenha um átomo radioativo. Um exemplo comum de isótopo usado é o trítio ou o iodo-125.


  2. Incubação:


    Em seguida, eles colocam fatias muito finas do tecido (como cortes de cérebro) em contato com essa molécula marcada. A substância radioativa se liga aos locais onde o receptor de interesse está presente.


  3. Lavagem:


    Depois, eles lavam o excesso de moléculas que não se ligaram, para garantir que o sinal venha apenas dos locais onde havia realmente o que queriam detectar.


  4. Exposição em Filme Fotográfico:


    As amostras são então colocadas em contato com um filme fotográfico especial (ou uma chapa sensível à radiação). As partículas radioativas emitidas pela substância marcada impressionam o filme.


  5. Imagem Final:


    Após um tempo (que pode ser de dias a semanas, dependendo da intensidade da radiação), o filme é revelado, como em uma fotografia antiga. Os locais escuros no filme correspondem às áreas onde havia mais moléculas ligadas, mostrando visualmente a distribuição dos receptores ou da substância no tecido. 

A autorradiografia foi usada nesse estudo devido usada a sua alta sensibilidade pois detecta mesmo quantidades muito pequenas de substâncias. Alta precisão espacial, que mostra exatamente onde no tecido (e às vezes até dentro de quais células) a substância está.


Alem disso por ser especialmente útil para estudar como receptores hormonais, neurotransmissores ou drogas estão distribuídos no cérebro e em outros órgãos.


Os pesquisadores usaram autorradiografia para mapear onde no cérebro havia mais receptores de ocitocina. Eles conseguiram comparar espécies diferentes e correlacionar a quantidade de receptores com o comportamento social (como dominância e agressividade).

Eles descobriram algo muito interessante: espécies com relações mais pacíficas e igualitárias entre machos e fêmeas apresentaram níveis mais elevados de receptores de ocitocina, especialmente em uma parte do cérebro chamada amígdala, que controla emoções como medo, raiva e ansiedade.


Um exemplo claro é o lêmure-negro-de-olhos-azuis. Nessa espécie, as fêmeas dominam mordendo, perseguindo e batendo nos machos para afirmar seu status. Esse comportamento agressivo não se limita a proteger os filhotes; muitas vezes, não é provocado e parece ser uma forma de lembrar aos machos quem está no comando. Os machos geralmente se afastam e deixam as fêmeas terem primeiro acesso à comida e aos melhores locais de descanso.

lêmure-negro-de-olhos-azuis


Por outro lado, espécies como o lêmure-de-colar são muito mais pacíficas. Machos e fêmeas compartilham o status igualmente, e a agressão é muito mais rara. De acordo com a autora principal, Allie Schrock, nessas espécies, há um "campo de jogo mais equilibrado" entre os sexos.

lêmure-de-colar


Os lêmures estudados morreram naturalmente anos atrás, mas seus tecidos cerebrais foram preservados no Duke Lemur Center. Ao estudar essas amostras, os pesquisadores descobriram que as espécies mais equilibradas evoluíram para ter mais receptores de ocitocina em seus cérebros. 


Isso sugere que uma maior sensibilidade à ocitocina ajudou a reduzir a agressividade, tornando as relações entre machos e fêmeas mais equilibradas ao longo do tempo.


Curiosamente, esse padrão foi observado tanto em machos quanto em fêmeas. Em vez de os machos se tornarem mais agressivos para se igualarem às fêmeas dominantes, ambos os sexos pareciam ter se tornado menos agressivos em geral. Isso sugere que a paz crescente entre os sexos envolveu a redução da agressividade ancestral feminina, em vez de aumentar a agressividade masculina.


As implicações desta pesquisa podem se estender além dos lêmures. Problemas com a sinalização da ocitocina no cérebro têm sido associados à agressividade, transtornos de personalidade e autismo em humanos e outros animais.


Ao estudar os lêmures, os pesquisadores esperam entender melhor como a química cerebral molda o comportamento social, não apenas em animais, mas possivelmente também em pessoas.



LEIA MAIS:


Neuropeptide receptor distributions in male and female Eulemur vary between female-dominant and egalitarian species

Allie E. Schrock, Mia R. Grossman, Nicholas M. Grebe, Annika Sharma, Sara M. Freeman, Michelle C. Palumbo, Karen L. Bales, Heather B. Patisaul, and Christine M. Drea

The Royal Society, Biology Letters, March 2025. Volume 2. Issue 3


Abstract


Aggression and its neurochemical modulators are typically studied in males, leaving the mechanisms of female competitive aggression or dominance largely unexplored. To better understand how competitive aggression is regulated in the primate brain, we used receptor autoradiography to compare the neural distributions of oxytocin and vasopressin receptors in male and female members of female-dominant versus egalitarian/codominant species within the Eulemur genus, wherein dominance structure is a reliable proxy of aggression in both sexes. We found that oxytocin receptor binding in the central amygdala (CeA) was predicted by dominance structure, with the members of three codominant species showing more oxytocin receptor binding in this region than their peers in four female-dominant species. Thus, both sexes in female-dominant Eulemur show a pattern consistent with the regulation of aggression in male rodents. We suggest that derived pacifism in Eulemur stems from selective suppression of ancestral female aggression over evolutionary time via a mechanism of increased oxytocin receptor binding in the CeA, rather than from augmented male aggression. This interpretation implies fitness costs to female aggression and/or benefits to its inhibition. These data establish Eulemur as a robust model for examining neural correlates of male and female competitive aggression, potentially providing novel insights into female dominance.

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