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O Papel do Estrogênio no Aumento do Consumo de Álcool em Mulheres


Ao investigar o papel do estrogênio no cérebro, os pesquisadores avançam na compreensão dos mecanismos que regulam comportamentos complexos, oferecendo novas perspectivas para intervenções em transtornos relacionados ao consumo de álcool. Esse estudo demonstrou que o estrogênio pode atuar rapidamente por meio de mecanismos não genômicos para regular a função neuronal e o comportamento, especialmente no contexto do consumo de álcool em fêmeas com órgãos reprodutivos intactos.


O sexo biológico é um fator crucial que regula o comportamento entre diferentes espécies, mas os mecanismos neurobiológicos subjacentes que governam essas diferenças ainda não são completamente compreendidos. 


Um dos elementos centrais na modulação do comportamento é o estrogênio (17β-estradiol, E2), um hormônio esteroide sexual produzido principalmente nos ovários das fêmeas.


O estrogênio desempenha papéis fundamentais em diversos comportamentos adaptativos, como reprodução, aprendizado, memória e respostas emocionais. 

Entretanto, ele também pode contribuir para comportamentos desadaptativos associados a transtornos neuropsiquiátricos.


O estrogênio é tradicionalmente entendido como atuando através de receptores nucleares de estrogênio (ERs) para promover alterações transcricionais extensas via mecanismos genômicos.


Recentemente, no entanto, descobriu-se que o estrogênio também pode agir rapidamente sobre os ERs associados à membrana em várias regiões cerebrais, como o hipocampo, o hipotálamo, o estriado, o núcleo accumbens e a amígdala. 

Essas ações rápidas são menos exploradas, mas estudos em roedores ovariectomizados (sem os ovários) mostraram que o estrogênio pode promover rapidamente a consolidação da memória.


Esses efeitos rápidos foram investigados utilizando formas modificadas de estrogênio que não atravessam a membrana celular, limitando assim sua ação aos receptores na superfície da célula.


Pesquisas experimentais em roedores revelaram que a administração aguda de moduladores de estrogênio ou de ER pode influenciar rapidamente comportamentos como agressão e comportamento sexual, além de regular o aprendizado, a memória e a auto-administração de psicoestimulantes. 


Em pássaros, por exemplo, o estrogênio, produzido a partir da testosterona, regula rapidamente o canto e o comportamento reprodutivo. 


No entanto, o impacto do E2 endógeno produzido pelos ovários no cérebro feminino e seu papel na regulação do comportamento em animais com órgãos reprodutivos intactos ainda não foi completamente explorado.


Há evidências crescentes de que o E2 desempenha um papel importante no comportamento relacionado ao álcool e drogas, como o consumo excessivo de álcool e a ansiedade, fatores de risco primários para transtornos psiquiátricos, incluindo transtorno de uso de álcool (AUD). 


As mulheres têm uma probabilidade maior de desenvolver AUD do que os homens com um histórico semelhante de uso de álcool, um fenômeno conhecido como "efeito telescópico". Além disso, o consumo excessivo de álcool é cada vez mais comum entre mulheres, especialmente durante a puberdade, quando os hormônios sexuais começam a flutuar.

Estudos mostraram que roedores fêmeas tendem a consumir mais álcool do que os machos, e essa diferença é parcialmente mediada pelos hormônios ovarianos.


A remoção dos ovários diminui o consumo de álcool, enquanto a administração de E2 pode restaurar o consumo elevado. Foi demonstrado que a sinalização de E2 promove o consumo de álcool em fêmeas intactas, e a redução da atividade dos receptores de estrogênio reduz o consumo.


Em um estudo recente conduzido por pesquisadores da Universidade de Cornell, foi demonstrado que o consumo de álcool e o comportamento de evitação em camundongos fêmeas variam ao longo do ciclo estral, de acordo com os níveis de E2. 


O estrogênio (E2) promoveu o aumento no consumo de álcool em camundongos fêmeas através de uma sinalização rápida que ocorre nos receptores de estrogênio alfa (ERα) associados à membrana celular, localizados no núcleo do leito da estria terminal (BNST). 


O BNST é uma região do cérebro conhecida por apresentar diferenças significativas entre os sexos, chamada de dimorfismo sexual, e por expressar altos níveis de receptores de estrogênio. A ativação desses receptores pela sinalização do E2 não segue o caminho genômico tradicional, mas sim uma via rápida que influencia diretamente a comunicação entre neurônios. 

Circuitos humanos de ansiedade e dependência. O BNST é um nó central tanto no neurocircuito de ansiedade quanto no de dependência. (esquerda) O BNST está localizado centralmente para influenciar as respostas de ansiedade humana, com conexões com múltiplas regiões límbicas e do tronco cerebral que mediam a resposta defensiva à ameaça, incluindo a amígdala, ínsula anterior, hipocampo, hipotálamo e substância cinzenta periaquedutal (adaptado de Grupe e Nitschke, 2013). (direita) O BNST é acionado durante o estágio emocional negativo de abstinência e interage com a amígdala e o estriado ventral, incluindo a concha do núcleo accumbens e a área tegmentar ventral, para mediar o reforço negativo (adaptado de Koob e Volkow, 2010). AI, ínsula anterior; Amyg, amígdala; BNST, núcleo leito da estria terminal; Hy, hipotálamo; PAG, substância cinzenta periaquedutal; VS, estriado ventral. FONTE: S N Avery, J A Clauss & J U Blackford. Neuropsychopharmacology, volume  41,  pages 126–141 (2016).


Dentro do BNST, existem neurônios que sintetizam e liberam o fator de liberação de corticotropina (CRF), um neuropeptídeo envolvido nas respostas ao estresse e que está fortemente ligado a comportamentos relacionados ao álcool e à ansiedade. 


O estudo mostrou que esses neurônios são fundamentais para o efeito do E2 no comportamento, pois a sinalização rápida do E2 aumenta a excitação sináptica, ou seja, a comunicação entre neurônios, e intensifica a atividade desses neurônios do BNST que liberam CRF.


Esse aumento na atividade neuronal facilita o comportamento de consumo de álcool, sugerindo um mecanismo específico pelo qual o E2 regula o consumo de álcool em fêmeas.


Esse estudo demonstrou que o estrogênio pode atuar rapidamente por meio de mecanismos não genômicos para regular a função neuronal e o comportamento, especialmente no contexto do consumo de álcool em fêmeas com órgãos reprodutivos intactos.


Ao investigar o papel do estrogênio no cérebro, os pesquisadores avançam na compreensão dos mecanismos que regulam comportamentos complexos, oferecendo novas perspectivas para intervenções em transtornos relacionados ao consumo de álcool.



LEIA MAIS:


Rapid nongenomic estrogen signaling controls alcohol drinking behavior in mice

Lia J. Zallar, Jean K. Rivera-Irizarry, Peter U. Hamor, Irena Pigulevskiy, Ana-Sofia Rico Rozo, Hajar Mehanna, Dezhi Liu, Jacqueline P. Welday, Rebecca Bender, Joseph J. Asfouri, Olivia B. Levine, Mary Jane Skelly, Colleen K. Hadley, Kristopher M. Fecteau, Scottie Nelson, John Miller, Pasha Ghazal, Peter Bellotti, Ashna Singh, Lauren V. Hollmer, David W. Erikson, Jacob Geri & Kristen E. Pleil 

Nature Communications, volume 15, Article number: 10725 (2024) 


Abstract:


Ovarian-derived estrogen can signal non-canonically at membrane-associated receptors in the brain to rapidly regulate neuronal function. Early alcohol drinking confers greater risk for alcohol use disorder in women than men, and binge alcohol drinking is correlated with high estrogen levels, but a causal role for estrogen in driving alcohol drinking has not been established. We found that female mice displayed greater binge alcohol drinking and reduced avoidance when estrogen was high during the estrous cycle than when it was low. The pro-drinking, but not anxiolytic, effect of high endogenous estrogen occurred via rapid signaling at membrane-associated estrogen receptor alpha in the bed nucleus of the stria terminalis, which promoted synaptic excitation of corticotropin-releasing factor neurons and facilitated their activity during alcohol drinking. Thus, this study demonstrates a rapid, nongenomic signaling mechanism for ovarian-derived estrogen in the brain controlling behavior in gonadally intact females.

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