O Elo Surpreendente Entre Fígado, Exercício e Memória
- Lidi Garcia
- 6 de mai.
- 4 min de leitura

Exercícios físicos, como correr, ajudam a proteger o cérebro, e isso pode estar ligado à produção de cetonas pelo fígado. Um estudo com ratas mostrou que quando o fígado não consegue produzir essas cetonas, há prejuízos na memória e na saúde das células cerebrais. No entanto, o exercício regular conseguiu evitar esses danos, mesmo com pouca produção de cetonas. Isso reforça como o corpo e o cérebro estão conectados, e como manter-se ativo é essencial para a saúde mental.
Sabemos que praticar exercícios físicos traz muitos benefícios para o corpo e a mente. Um tipo específico de exercício, chamado exercício de resistência (como correr ou pedalar), já foi demonstrado em vários estudos como sendo protetor para o cérebro, ou seja, ele ajuda a manter a saúde cerebral e pode até reduzir o risco de doenças neurológicas.
No entanto, ainda existem dúvidas sobre como exatamente esses benefícios acontecem. Uma das hipóteses é que o fígado, durante os exercícios, produz substâncias chamadas cetonas que poderiam estar envolvidas nessa proteção ao cérebro.

Para entender melhor o papel das cetonas do fígado na saúde do cérebro, os pesquisadores usaram ratas saudáveis de 6 meses de idade e bloquearam, por meio de um vírus, uma enzima no fígado chamada HMGCS2. Essa enzima é essencial para a produção de cetonas.
Depois disso, os animais foram divididos em grupos: alguns fizeram apenas um exercício rápido e isolado, enquanto outros passaram por um treinamento de corrida mais longo, ao longo de 4 semanas.
Após os exercícios, os pesquisadores mediram os níveis de cetonas no sangue e também fizeram testes de memória e comportamento, além de analisarem o cérebro das ratas.

O exercício agudo (feito apenas uma vez) aumentou as cetonas no sangue, mas quando a produção de cetonas no fígado foi bloqueada, esse aumento desapareceu, tanto após o exercício único quanto após o programa de 4 semanas.
No cérebro, os efeitos também foram claros: quando a produção de cetonas foi interrompida, a função das mitocôndrias (as “usinas de energia” das células) piorou, especialmente em uma região importante chamada córtex frontal.
Além disso, as ratas com menos cetonas apresentaram memória espacial mais fraca e menor capacidade de adaptação entre os neurônios, o que prejudica a aprendizagem.

Esta imagem mostra o impacto da produção reduzida de cetonas pelo fígado no funcionamento do cérebro, e como o exercício pode reverter isso. À esquerda, vemos um rato com a enzima HMGCS2 “silenciada” no fígado, o que reduz a produção de corpos cetônicos (como BHB e AcAc). Essa queda nas cetonas prejudica o funcionamento das mitocôndrias no cérebro, reduz a produção do fator BDNF (essencial para a saúde dos neurônios), atrapalha a plasticidade sináptica (a capacidade de formar novas conexões neurais) e, por fim, prejudica a cognição. À direita, mesmo com a redução de HMGCS2, o exercício de resistência (como correr na esteira) restaura todas essas funções: ele melhora a função mitocondrial, aumenta o BDNF, melhora a plasticidade sináptica e preserva a cognição. Em resumo, o exercício atua como uma “compensação” para os efeitos negativos causados pela baixa produção de cetonas no fígado.
Curiosamente, mesmo quando as cetonas estavam reduzidas, o treinamento físico de longo prazo conseguiu evitar esses prejuízos. Ou seja, o exercício de resistência ajudou a proteger o cérebro, mesmo com menos cetonas sendo produzidas pelo fígado.
Esse estudo foi o primeiro a mostrar que a produção de cetonas pelo fígado é importante para manter a saúde do cérebro, especialmente em termos de memória e energia celular.
Ele também reforça o valor do exercício físico regular como uma forma poderosa de proteger o cérebro, mesmo quando outras funções do corpo, como a do fígado, não estão funcionando perfeitamente. Em resumo, cuidar do corpo (e do fígado) tem um impacto direto sobre o funcionamento da mente.
LEIA MAIS:
Cognitive impairment caused by compromised hepatic ketogenesis is prevented by endurance exercise
Taylor J. Kelty, Nathan R. Kerr, Chih H. Chou, Grace E. Shryack, Christopher L. Taylor, Alexa A. Krause, Alexandra R. Knutson, Josh Bunten, Tom E. Childs, Grace M. Meers, Ryan J. Dashek, Patrycja Puchalska, Peter A. Crawford, John P. Thyfault, Frank W. Booth and R. Scott Rector
The Journal of Physiology. 14 January 2025
DOI: 10.1113/JP287573
Abstract:
Extensive research has demonstrated endurance exercise to be neuroprotective. Whether these neuroprotective benefits are mediated, in part, by hepatic ketone production remains unclear. To investigate the role of hepatic ketone production on brain health during exercise, healthy 6-month-old female rats underwent viral knockdown of the rate-limiting enzyme in the liver that catalyses the first reaction in ketogenesis: 3-hydroxymethylglutaryl-CoA synthase 2 (HMGCS2). Rats were then subjected to either a bout of acute exercise or 4 weeks of chronic treadmill running (5 days/week) and cognitive behavioural testing. Acute exercise elevated ketone plasma concentration 1 h following exercise. Hepatic HMGCS2 knockdown, verified by protein expression, reduced ketone plasma concentration 1 h after acute exercise and 48 h after chronic exercise. Proteomic analysis and enrichment of the frontal cortex revealed hepatic HMGCS2 knockdown reduced markers of mitochondrial function 1 h after acute exercise. HMGCS2 knockdown significantly reduced state 3 complex I + II respiration in isolated mitochondria from the frontal cortex after chronic exercise. Spatial memory and protein markers of synaptic plasticity were significantly reduced by HMGCS2 knockdown. These deficiencies were prevented by chronic endurance exercise training. In summary, these are the first data to propose that hepatic ketogenesis is required to maintain cognition and mitochondrial function, irrespective of training status, and that endurance exercise can overcome neuropathology caused by insufficient hepatic ketogenesis. These results establish a mechanistic link between liver and brain health that enhance our understanding of how peripheral tissue metabolism influences brain health.
Comments