Resumo:
O estudo da funcionalidade do cérebro em pessoas com psicose revelou diferenças importantes na conectividade entre várias redes cerebrais, o que levou à descoberta de um biomarcador promissor para diagnosticar e entender melhor esse transtorno.
A psicose é uma condição complexa que afeta os pensamentos, emoções e percepções das pessoas. Pesquisas anteriores mostraram que indivíduos com psicose apresentam diferenças na forma como diferentes partes do cérebro "se comunicam".
Essas diferenças incluem uma comunicação excessiva entre o tálamo (uma estrutura que atua como um "hub" sensorial) e o córtex cerebral, e uma redução na comunicação entre áreas do córtex que regulam os sentidos e o movimento.
Essas alterações foram documentadas antes, mas com perguntas ainda abertas: Essas mudanças são observadas em todas as redes sensoriais do cérebro? Elas estão relacionadas a outros fatores da doença, como medicamentos ou comorbidades? Podem essas diferenças ser usadas como uma base sólida para um biomarcador, isto é, um indicador objetivo da presença da psicose?
Pesquisadores da University of Rochester Medical Center investigaram essas questões usando dados do projeto Human Connectome Early Psychosis Project, um estudo que analisa conexões cerebrais em indivíduos com psicose. Eles examinaram 105 pacientes com psicose (incluindo psicose afetiva e não-afetiva) e 54 controles saudáveis.
Segundo eles analisaram a conectividade. A conectividade funcional em estado de repouso (RSFC, Resting-State Functional Connectivity) foi usada.
O método de conectividade funcional em estado de repouso (RSFC) é uma abordagem usada em neurociência para analisar como diferentes regiões do cérebro se conectam e interagem quando uma pessoa está em um estado de repouso, ou seja, sem realizar atividades específicas.
Os pesquisadores usam imagens de ressonância magnética funcional (fMRI) para medir a atividade cerebral. Durante o exame, os participantes ficam deitados, geralmente com os olhos fechados, mas acordados e sem realizar tarefas ativas.
O fMRI detecta mudanças nos níveis de oxigênio no sangue, que estão relacionadas à atividade neural. Isso é chamado de resposta dependente do nível de oxigênio no sangue (BOLD). A RSFC analisa os sinais BOLD ao longo do tempo para identificar padrões de sincronização entre diferentes regiões cerebrais
Os sinais BOLD de cada região cerebral são correlacionados com os de outras regiões, criando uma matriz de conectividade funcional.
Eles analisaram a atividade de 718 regiões do cérebro para medir como diferentes partes se conectavam, considerando tanto a conexão entre o tálamo e o córtex quanto as conexões internas do córtex.
Eles focaram em redes sensoriais específicas (visuais primárias, visuais secundárias, auditivas e somatomotoras) baseando-se em uma recente partição da rede cerebral. Isso garantiu que estavam estudando conexões bem definidas e relevantes.
Para calcular as matrizes de conectividade funcional, foi usada uma técnica chamada correlação parcial regularizada. Esse método reduz ruídos e confusões ao medir as relações diretas entre duas regiões do cérebro, excluindo a influência de outras áreas. Por exemplo, ao medir a conexão entre as redes visuais e somatomotoras, o método elimina o impacto de outras redes que possam estar influenciando indiretamente essa relação.
Segundo eles analisaram a conectividade. A conectividade funcional em estado de repouso (RSFC, Resting-State Functional Connectivity) foi usada. RSFC mede como diferentes áreas do cérebro estão conectadas enquanto a pessoa está em repouso.
Os pesquisadores descobriram diferenças específicas na conectividade entre pacientes com psicose e indivíduos saudáveis. Primeiro identificaram uma hiperconectividade tálamo-cortical e hipoconectividade córtico-cortical. Essas alterações foram claras nas redes somatomotoras e visuais secundárias (visual2).
As redes auditivas e visuais primárias, porém, não apresentaram essas alterações.
Com isso um biomarcador simples e eficaz emergiu. Ao combinar e normalizar os dados das redes somatomotoras e visuais secundárias, os pesquisadores criaram um indicador confiável da presença de psicose.
Esse biomarcador foi baseado na diferença entre conectividade tálamo-cortical e córtico-cortical. Ele demonstrou uma força estatística robusta.
O biomarcador identificado possui características muito promissoras. Ele possui independência de fatores externos. Ele não foi influenciado por uso de medicamentos antipsicóticos, outras comorbidades psiquiátricas, substâncias, ansiedade ou dados demográficos como idade e gênero.
Também possui uma confiabilidade moderada. Com um índice ICC (coeficiente de correlação intraclasse) de 0,62, o marcador demonstrou ser relativamente consistente em medições repetidas.
Ele pode ser detectado em exames de apenas 5 minutos. Também apresentou uma boa capacidade de distinguir grupos em testes rigorosos de validação cruzada (AUC = 0,79).
Por fim, o biomarcador foi eficaz em diferenciar pacientes com psicose em estágio avançado de controles saudáveis ou com TDAH em dois bancos de dados independentes.
Este estudo apresenta um avanço significativo na compreensão e diagnóstico da psicose. Ele fornece um método simples, robusto e objetivo para identificar a doença, mesmo em estágios iniciais. Pode ser integrado a avaliações neurocognitivas existentes para melhorar a precisão do diagnóstico. Além disso, ao destacar alterações específicas em redes somatomotoras e visuais secundárias, ele abre novas possibilidades para intervenções direcionadas e personalizadas.
Os resultados introduzem um biomarcador de conectividade cerebral que pode revolucionar a forma como detectamos e tratamos a psicose. Ele é rápido, confiável, independente de confusões externas e aplicável em uma variedade de contextos. Essa descoberta representa um passo à frente no uso de neurociência e tecnologia para combater doenças mentais.
LEIA MAIS:
Functional dysconnectivity of visual and somatomotor networks yields a simple and robust biomarker for psychosis.
Keane BP, Abrham YT, Cole MW. et al.
Mol Psychiatry (2024).
Abstract:
People with psychosis exhibit thalamo-cortical hyperconnectivity and cortico-cortical hypoconnectivity with sensory networks, however, it remains unclear if this applies to all sensory networks, whether it arises from other illness factors, or whether such differences could form the basis of a viable biomarker. To address the foregoing, we harnessed data from the Human Connectome Early Psychosis Project and computed resting-state functional connectivity (RSFC) matrices for 54 healthy controls and 105 psychosis patients. Primary visual, secondary visual (“visual2”), auditory, and somatomotor networks were defined via a recent brain network partition. RSFC was determined for 718 regions via regularized partial correlation. Psychosis patients—both affective and non-affective—exhibited cortico-cortical hypoconnectivity and thalamo-cortical hyperconnectivity in somatomotor and visual2 networks but not in auditory or primary visual networks. When we averaged and normalized the visual2 and somatomotor network connections, and subtracted the thalamo-cortical and cortico-cortical connectivity values, a robust psychosis biomarker emerged (p = 2e-10, Hedges’ g = 1.05). This “somato-visual” biomarker was present in antipsychotic-naive patients and did not depend on confounds such as psychiatric comorbidities, substance/nicotine use, stress, anxiety, or demographics. It had moderate test-retest reliability (ICC = 0.62) and could be recovered in five-minute scans. The marker could discriminate groups in leave-one-site-out cross-validation (AUC = 0.79) and improve group classification upon being added to a well-known neurocognition task. Finally, it could differentiate later-stage psychosis patients from healthy or ADHD controls in two independent data sets. These results introduce a simple and robust RSFC biomarker that can distinguish psychosis patients from controls by the early illness stages.
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