
Cientistas desenvolveram um novo tratamento para restaurar a visão em pessoas com lesão grave na córnea causada pela perda de células-tronco essenciais para a regeneração ocular (LSCD). O procedimento, chamado CALEC, utiliza células do próprio paciente cultivadas em laboratório e mostrou ser seguro e eficaz em um estudo clínico. A maioria dos pacientes apresentou melhora significativa na visão e nos sintomas. A pesquisa abre caminho para novas opções de tratamento e pode beneficiar muitas pessoas no futuro.
A córnea, a parte transparente do olho que permite a passagem da luz, precisa estar sempre saudável para garantir uma visão nítida. Isso depende de um grupo especial de células chamadas células-tronco epiteliais limbares, que ficam no limbo da córnea (a área de transição entre a córnea e a conjuntiva, a parte branca do olho).
Essas células ajudam a regenerar a camada externa da córnea e a mantê-la protegida. Quando essas células são danificadas ou destruídas, ocorre a Deficiência de Células-Tronco Limbais (LSCD), uma condição grave que pode levar à cegueira.

Os sintomas incluem inflamação, crescimento anormal de vasos sanguíneos na córnea, cicatrizes, visão embaçada e grande desconforto nos olhos, como dor e sensibilidade à luz.
O tratamento para Deficiência de Células-Tronco Limbais busca restaurar a superfície ocular saudável e recuperar a função dessas células-tronco. Quando apenas um olho é afetado, os médicos podem retirar um pequeno pedaço de tecido saudável do olho bom do próprio paciente para transplante, evitando o uso de doadores e reduzindo a necessidade de medicamentos imunossupressores.

Existem diferentes formas de transplante, incluindo o enxerto direto de tecido: enxerto autólogo de limbo conjuntiva (CLAU) e transplante epitelial de limbo simples (SLET) e o transplante de células cultivadas em laboratório (CLET).
O método transplante de células cultivadas em laboratório permite expandir as células-tronco em laboratório antes do transplante, reduzindo o risco de comprometer o olho saudável. Porém, esse procedimento ainda não é aprovado nos Estados Unidos devido à falta de regulamentação e estudos clínicos específicos.
Para superar essa barreira, cientistas desenvolveram uma nova técnica chamada transplante de células epiteliais limbares autólogas cultivadas (CALEC).

Esta imagem mostra, de forma simplificada, como funciona o processo do transplante CALEC para tratar a cegueira causada por deficiência de células-tronco na córnea.
Primeiro, os médicos retiram uma pequena amostra de tecido do olho saudável do paciente. Depois, as células dessa amostra são isoladas e cultivadas em laboratório sobre uma membrana especial.
Esse crescimento acontece em duas etapas até que as células estejam prontas para serem transplantadas no olho doente, ajudando a regenerar a superfície ocular. Também são apresentados gráficos que analisam a relação entre o crescimento das células e a energia celular, além do tempo necessário para o processo.
Esse método inovador segue padrões rigorosos exigidos pela FDA (agência reguladora dos EUA) e não utiliza componentes de origem animal ou células de terceiros. Os pesquisadores conduziram um estudo clínico para avaliar a segurança e a viabilidade desse transplante em pacientes com Deficiência de Células-Tronco Limbais em apenas um olho.
O estudo envolveu 15 participantes, com idades entre 24 e 78 anos, acompanhados por até 18 meses após o transplante. Os principais objetivos eram verificar se as células transplantadas sobreviviam e se havia efeitos colaterais graves, como infecções ou rejeição do enxerto.

A pesquisadora principal Ula Jurkunas, MD, realiza o primeiro transplante de células-tronco do ensaio clínico CALEC em 2018 no Mass Eye and Ear em Boston, em um paciente que sofreu uma queimadura química grave no olho. Crédito: Mass Eye and Ear
Os resultados foram promissores: 93% dos enxertos foram bem-sucedidos, e a maioria dos pacientes apresentou melhora na superfície da córnea e nos sintomas visuais.
Apenas um paciente teve uma infecção ocular não relacionada ao tratamento. No geral, 86% dos participantes apresentaram melhora significativa nos primeiros três meses, e esse índice aumentou para mais de 90% após um ano.
Os resultados indicam que o transplante de células epiteliais limbares autólogas cultivadas (CALEC) é seguro e tem grande potencial para restaurar a visão em pacientes com Deficiência de Células-Tronco Limbais. No entanto, mais estudos são necessários para confirmar sua eficácia a longo prazo e possibilitar sua aprovação como um tratamento disponível para mais pessoas no futuro.
LEIA MAIS:
Cultivated autologous limbal epithelial cell (CALEC) transplantation for limbal tem cell deficiency: a phase I/II clinical trial of the first xenobiotic-free, serum-free, antibiotic-free manufacturing protocol developed in the US
Ula V. Jurkunas, Aaron R. Kaufman, Jia Yin, Allison Ayala, Maureen Maguire, Lassana Samarakoon, Lynette K. Johns, Mohit Parekh, Sanming Li, Alex Gauthier, Helene Negre, Kit L. Shaw, Diego E. Hernandez Rodriguez, Heather Daley, Reza Dana, Myriam Armant and Jerome Ritz
Nature Communications. 4 March 2025, 1607 (2025)
DOI: 10.1038/s41467-025-56461-1
Abstract:
We developed a two-stage manufacturing process utilizing cultivated autologous limbal epithelial cells (CALEC), the first xenobiotic-free, serum-free, antibiotic-free protocol developed in the United States, to treat blindness caused by unilateral limbal stem cell deficiency (LSCD) and conducted a single-center, single-arm, phase I/II clinical trial. Primary outcomes were feasibility (meeting release criteria) and safety (ocular infection, corneal perforation, or graft detachment). Participant eligibility included male or female participants age 18 to <90 years old and ability to provide written informed consent with LSCD. Funding was provided by the National Eye Institute of the National Institutes of Health. CALEC grafts met release criteria in 14 (93%) of 15 participants at conclusion of trial. After first stage manufacturing, intracellular adenosine triphosphate levels correlated with colony forming efficiency (r = 0.65, 95% CI [0.04, 0.89]). One bacterial infection occurred unrelated to treatment, with no other primary safety events. The secondary outcome was to investigate efficacy based on improvement in corneal epithelial surface integrity (complete success) or improvement in corneal vascularization and/or participant symptomatology as measured by OSDI and SANDI (partial success). 86%, 93%, and 92% of grafts resulted in complete or partial success at 3, 12, and 18 months, respectively. Our results provide strong support that CALEC transplantation is safe and feasible and further studies are needed to evaluate therapeutic efficacy. Clinicaltrials.gov registration: NCT02592330.
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