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Nova Tecnologia Recria Tumores Para Antecipar Respostas ao Tratamento do Câncer Cerebral


Esse estudo representa um grande avanço porque, pela primeira vez, um ensaio clínico utilizou organoides tumorais de pacientes em tempo real para acompanhar um tratamento experimental. Esse modelo abre novas possibilidades para prever a eficácia de terapias inovadoras antes mesmo de serem administradas aos pacientes, permitindo ajustes personalizados e potencialmente melhorando os resultados clínicos.


Nos últimos anos, os cientistas têm explorado maneiras de criar modelos mais precisos para estudar o câncer e desenvolver novas terapias. Uma dessas estratégias envolve o uso de organoides tumorais, que são pequenas estruturas tridimensionais cultivadas em laboratório a partir de células de tumores reais de pacientes. 


Esses organoides se mostraram ferramentas valiosas porque preservam as características originais dos tumores melhor do que modelos tradicionais, como culturas de células ou xenoenxertos (implantes de células tumorais humanas em animais de laboratório).


Como resultado, eles oferecem uma visão mais realista sobre como os tumores crescem, interagem com seu ambiente e respondem a diferentes tratamentos.


Embora os organoides tumorais já tenham sido utilizados para estudar os mecanismos do câncer e criar biobancos (coleções de amostras tumorais armazenadas para pesquisa), um avanço recente tem chamado atenção: sua capacidade de prever como um paciente específico responderá ao tratamento em tempo real.  


a) Do tecido cancerígeno humano, células tumorais podem ser isoladas e colocadas em cultura para produzir esferoides. b) Células-tronco embrionárias (ESCs) e células-tronco pluripotentes induzidas (iPSCs) são dois tipos comuns de células-tronco usadas como fonte celular para produção de organoides. Tanto as ESCs quanto as iPSCs podem formar uma variedade de modelos organoides quando recebem as dicas de sinalização e matriz extracelular especifica (ECM) corretas. Imagem: Vanessa Velasco, S. Ali Shariati & Rahim Esfandyarpour


Essa abordagem já foi explorada em alguns tipos de câncer, como os de mama, pele (melanoma), pulmão e trato gastrointestinal. No entanto, essa estratégia ainda não havia sido aplicada em tumores do sistema nervoso central (SNC), como o glioblastoma, dentro de um contexto clínico imediato. 


Até agora, os organoides tumorais eram usados principalmente para análises retrospectivas, ou seja, estudos feitos depois que os pacientes já haviam sido tratados. A grande questão era: seria possível gerar organoides tumorais rapidamente o suficiente para acompanhar o tratamento de um paciente e ajudar a prever sua resposta?


O glioblastoma (GBM) é o tumor cerebral maligno mais comum em adultos e, infelizmente, um dos mais agressivos. Mesmo com o tratamento padrão, que envolve cirurgia para remover o máximo possível do tumor, seguida de radioterapia e quimioterapia com temozolomida, a sobrevivência média dos pacientes é inferior a dois anos. 


No caso do glioblastoma recorrente (rGBM), que volta a crescer após o tratamento inicial, a situação é ainda mais desafiadora: os pacientes geralmente sobrevivem menos de um ano. Essa realidade destaca a necessidade urgente de novas terapias mais eficazes. 


Um dos principais obstáculos no tratamento do glioblastoma é sua enorme heterogeneidade, ou seja, os tumores variam muito de um paciente para outro e até mesmo dentro do mesmo indivíduo, dificultando a ação dos medicamentos. 

Além disso, os métodos tradicionais de estudo do glioblastoma, como linhagens celulares e xenoenxertos, levam muito tempo para serem desenvolvidos, tornando-os pouco úteis para a tomada de decisões rápidas no tratamento clínico.


Para superar essas limitações, pesquisadores desenvolveram um protocolo inovador para criar organoides de glioblastoma (GBOs) a partir de tumores de pacientes logo após a cirurgia. 


Diferentemente de outros métodos, essa abordagem mantém a estrutura original do tumor, incluindo diferentes tipos de células, padrões genéticos e até mesmo a interação com o microambiente tumoral. 


O grande diferencial desse protocolo é sua rapidez: os GBOs podem ser gerados em apenas 2 a 3 semanas após a cirurgia, o que possibilita que eles sejam testados ao mesmo tempo em que o paciente recebe seu tratamento.


Esses organoides não apenas podem ser usados para pesquisa, mas também podem ser armazenados em biobancos ou implantados no cérebro de camundongos para experimentos mais detalhados.


Uma das abordagens terapêuticas mais promissoras no combate ao câncer é a imunoterapia com células CAR-T, que já tem mostrado grande eficácia em cânceres do sangue, como leucemias.


No entanto, essa estratégia enfrenta grandes desafios em tumores sólidos como o glioblastoma, devido à complexidade do microambiente tumoral e à variabilidade dos antígenos tumorais (as moléculas que o sistema imunológico reconhece para atacar o câncer).  

Imagem: UNC Medical Center


Para lidar com essa dificuldade, os pesquisadores desenvolveram uma célula CAR-T especial, que ataca dois alvos simultaneamente: o receptor do fator de crescimento epidérmico (EGFR) e o receptor de interleucina-13 alfa 2 (IL13Rα2). Esse tratamento inovador está sendo testado em um estudo clínico de fase 1 com pacientes com glioblastoma recorrente. 


No estudo, os pacientes passam por uma cirurgia para reduzir o tumor e recebem um pequeno dispositivo chamado reservatório Ommaya, que permite a administração direta das células CAR-T no líquido cefalorraquidiano (LCR). 


Os primeiros resultados indicaram que o tratamento foi seguro e bem tolerado, com os pacientes apresentando expansão significativa das células CAR-T no líquido cefalorraquidiano e liberação de citocinas inflamatórias, sugerindo ativação do sistema imunológico contra o tumor. 


Além disso, todos os seis pacientes do estudo apresentaram algum grau de regressão tumoral no primeiro mês após o tratamento, segundo exames de ressonância magnética.


No entanto, as respostas não foram duradouras para todos os pacientes, e alguns apresentaram um fenômeno conhecido como pseudoprogressão, em que o tumor parece crescer temporariamente antes de reduzir.

Um desenho de ensaio único com tratamentos paralelos de pacientes e glioblastomas derivados de pacientes


O grande problema das terapias para glioblastoma, especialmente com células CAR-T, é que pode levar meses para determinar se um paciente realmente está respondendo ao tratamento. Dado que o glioblastoma recorrente tem um tempo de sobrevivência muito curto, essa espera pode ser fatal para alguns pacientes. 


É aqui que os organoides entram como uma ferramenta revolucionária. No mesmo período em que as células CAR-T estavam sendo preparadas para os pacientes do estudo clínico, os pesquisadores também cultivaram organoides tumorais desses mesmos pacientes. 


Dessa forma, puderam testar as células CAR-T nos organoides ao mesmo tempo em que os pacientes recebiam o tratamento real, permitindo uma avaliação precoce da eficácia da terapia.


Os resultados foram promissores: nos organoides tratados com as células CAR-T do próprio paciente, os pesquisadores observaram redução dos alvos tumorais e destruição significativa das células cancerígenas, um efeito que foi diretamente relacionado à quantidade de células CAR-T detectadas no líquido cefalorraquidiano dos pacientes.  

Organoide de glioblastoma derivado de paciente tratado com células CAR-T de alvo duplo. Células T (magenta) infiltram o organoide do tumor e matam células tumorais (azul; amarelo indica células morrendo). (Imagem: Yusha Sun e Xin Wang dos laboratórios de Guo-li Ming e Hongjun Song)


Além disso, os padrões de liberação de citocinas nos organoides espelharam aqueles observados nos pacientes ao longo do tempo, indicando que os organoides podem refletir com precisão a resposta do paciente ao tratamento.


Esse estudo representa um grande avanço porque, pela primeira vez, um ensaio clínico utilizou organoides tumorais de pacientes em tempo real para acompanhar um tratamento experimental. 


Esse modelo abre novas possibilidades para prever a eficácia de terapias inovadoras antes mesmo de serem administradas aos pacientes, permitindo ajustes personalizados e potencialmente melhorando os resultados clínicos.


Além disso, os dados obtidos com os organoides podem ajudar a entender melhor os mecanismos biológicos por trás das respostas (ou da falta de resposta) aos tratamentos, auxiliando no desenvolvimento de novas estratégias terapêuticas.


Em resumo, a combinação de organoides tumorais e células CAR-T pode revolucionar a forma como tratamos o glioblastoma.


Essa abordagem não apenas permite testes rápidos de novos tratamentos personalizados, mas também ajuda a preencher uma lacuna crítica na oncologia: a necessidade de ferramentas eficazes para prever a resposta dos pacientes às terapias, especialmente para tumores altamente agressivos como o glioblastoma. 


Embora mais estudos sejam necessários, essa pesquisa aponta para um futuro promissor, em que tratamentos personalizados baseados em organoides podem aumentar as chances de sucesso das terapias e melhorar a qualidade de vida dos pacientes com câncer cerebral.



LEIA MAIS:


Patient-derived glioblastoma organoids as real-time avatars for assessing responses to clinical CAR-T cell therapy

Meghan Logun, Xin Wang, Yusha Sun, Stephen J. Bagley, Nannan Li, Arati Desai, Daniel Y. Zhang, MacLean P. Nasrallah, Emily Ling-Lin Pai, Bike Su Oner, Gabriela Plesa, Donald Siegel, Zev A. Binder, Guo-li Ming, Hongjun Song, and Donald M. O’Rourke

Cell Stem Cell


Abstract:


Patient-derived tumor organoids have been leveraged for disease modeling and preclinical studies but rarely applied in real time to aid with interpretation of patient treatment responses in clinics. We recently demonstrated early efficacy signals in a first-in-human, phase 1 study of dual-targeting chimeric antigen receptor (CAR)-T cells (EGFR-IL13Rα2 CAR-T cells) in patients with recurrent glioblastoma. Here, we analyzed six sets of patient-derived glioblastoma organoids (GBOs) treated concurrently with the same autologous CAR-T cell products as patients in our phase 1 study. We found that CAR-T cell treatment led to target antigen reduction and cytolysis of tumor cells in GBOs, the degree of which correlated with CAR-T cell engraftment detected in patients’ cerebrospinal fluid (CSF). Furthermore, cytokine release patterns in GBOs mirrored those in patient CSF samples over time. Our findings highlight a unique trial design and GBOs as a valuable platform for real-time assessment of CAR-T cell bioactivity and insights into immunotherapy efficacy.

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