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Esquizofrenia e vozes na cabeça: processos cerebrais defeituosos são a causa


Resumo: 

Um novo estudo revela que as alucinações auditivas na esquizofrenia podem ser causadas por dois processos cerebrais defeituosos: uma supressão falha de sons autogerados e uma resposta hiperativa a ruídos internos. A pesquisa mostrou que pacientes com alucinações tinham uma descarga corolária "quebrada" e uma resposta aprimorada a sons não intencionais, em comparação com aqueles sem alucinações. Essas descobertas sugerem que tratamentos futuros para alucinações auditivas podem ter como alvo esses processos interrompidos.


As experiências perceptivas podem ser desencadeadas tanto pelo processamento sensorial quanto por mecanismos internos, como a recuperação de memórias ou a criação de imagens mentais. Ou seja, nossas percepções podem ser geradas tanto pelo mundo ao nosso redor quanto por nossas próprias mentes.


No entanto, é crucial que o cérebro monitore essas diferentes fontes para distinguir o que é real do que é imaginado. Quando esse monitoramento falha, podem surgir alucinações.


Um exemplo claro disso são as alucinações auditivas, comuns em pacientes com esquizofrenia, que "ouvem" vozes mesmo na ausência de sons externos. Esses pacientes têm dificuldade em distinguir seus próprios pensamentos, como a fala interna, de vozes reais, levando-os a acreditar que esses pensamentos vêm de fora.


Estudos sugerem que alucinações auditivas podem ser explicadas por uma combinação de duas funções complementares que modulam sinais motores e perceptivos no cérebro. A primeira função, chamada Descarga Corolária (CD), age como uma "cópia" de sinais motores genéricos, que são enviados durante a execução de ações.


Esses sinais têm o papel de inibir os processos sensoriais conectados para avisar o cérebro sobre as consequências sensoriais esperadas de suas próprias ações.


Em termos simples, o cérebro "prevê" os resultados de uma ação e reduz a sensibilidade a eles para que possamos diferenciar entre estímulos que geramos e aqueles que vêm do ambiente.


A segunda função, conhecida como Cópia de Eferência (EC), refere-se a uma cópia mais específica de um plano motor que aumenta a sensibilidade a certas sensações ligadas diretamente à ação em questão. Por exemplo, quando estamos nos preparando para falar, o cérebro aumenta sua sensibilidade aos sons da fala, ajudando a focar no que estamos prestes a dizer. 

Um recente estudo, publicado por pesquisadores da Shanghai Jiao Tong University na Plos Biology, propõe que alucinações auditivas em pacientes com esquizofrenia são causadas por falhas seletivas nessas funções.


No caso de pacientes com alucinações, o CD não inibe corretamente os estímulos internos, como a fala interna, e o EC acaba aumentando a sensibilidade a sons ou sensações internas que não deveriam ser percebidas como reais. Isso cria a experiência de "ouvir vozes" que, na verdade, são geradas internamente, mas são confundidas com sons externos.

A Figura mostra esquemas de funções distintas de sinais motores na transformação motora para sensorial em estágios temporais de ação em populações normais e clínicas. (A) Indivíduos normais. (B) indivíduos portadores de esquizofrenia sem alucinações auditivas e (C) Indivíduos portadores de esquizofrenia com alucinações auditivas. doi.org/ 10.1371/journal.pbio.3002836


Quando esse mecanismo falha, especialmente em pacientes com esquizofrenia, o automonitoramento também falha, e as alucinações auditivas podem aparecer. Contudo, há um ponto interessante: em vez de apenas falhar em suprimir os sons autogerados, como a fala interna, há evidências de que em alguns pacientes o cérebro aumenta a sensibilidade a esses sons, levando à percepção de sons que não existem externamente.


Nesse novo estudo, os pesquisadores realizaram experimentos de eletroencefalograma (EEG) medindo as ondas cerebrais de vinte pacientes diagnosticados com esquizofrenia com alucinações auditivas e vinte pacientes diagnosticados com esquizofrenia que nunca tinham experimentado tais alucinações.


Em geral, quando as pessoas estão se preparando para falar, seus cérebros enviam um sinal conhecido como "descarga corolária" que suprime o som de sua própria voz.


No entanto, o novo estudo mostrou que quando os pacientes com alucinações auditivas estavam se preparando para falar uma sílaba, seus cérebros não apenas falharam em suprimir esses sons internos, mas tiveram uma resposta de "cópia de eferência" aprimorada para sons internos diferentes da sílaba planejada.


Os pesquisadores concluem que deficiências nesses dois processos provavelmente contribuem para alucinações auditivas e que alvejá-los no futuro pode levar a novos tratamentos para tais alucinações.


Em resumo, este estudo sugere que os problemas no sistema motor e auditivo do cérebro, responsáveis por distinguir entre sons gerados internamente e sons externos, desempenham um papel crucial nas alucinações auditivas em pessoas com esquizofrenia. Essas descobertas são importantes porque podem ajudar no desenvolvimento de novos tratamentos para melhorar a vida dos pacientes com esses sintomas.

    


LEIA MAIS:


Impaired motor-to-sensory transformation mediates auditory hallucinations

Yang F, Zhu H, Cao X, Li H, Fang X, Yu L, et al. 

PLoS Biol. https://doi.org/ 10.1371/journal.pbio.3002836


Abstract:


It has been hypothesized that a copy of motor signals, termed efference copy (EC) or corollary discharge (CD), suppresses sensory responses to yield a sense of agency; impairment of the inhibitory function leads to hallucinations. However, how can the sole absence of inhibition yield positive symptoms of hallucinations? We hypothesize that selective impairments in functionally distinct signals of CD and EC during motor-to-sensory transformation cause the positive symptoms of hallucinations. In an electroencephalography (EEG) experiment with a delayed articulation paradigm in schizophrenic patients with (AVHs) and without auditory verbal hallucinations (non-AVHs), we found that preparing to speak without knowing the contents (general preparation) did not suppress auditory responses in both patient groups, suggesting the absent of inhibitory function of CD. Whereas, preparing to speak a syllable (specific preparation) enhanced the auditory responses to the prepared syllable in nonAVHs, whereas AVHs showed enhancement in responses to unprepared syllables, opposite to the observations in the normal population, suggesting that the enhancement function of EC is not precise in AVHs. A computational model with a virtual lesion of an inhibitory inter-neuron and disproportional sensitization of auditory cortices fitted the empirical data and further quantified the distinct impairments in motor-to-sensory transformation in AVHs. These results suggest that “broken” CD plus “noisy” EC causes erroneous monitoring of the imprecise generation of internal auditory representation and yields auditory hallucinations. Specific impairments in functional granularity of motor-to-sensory transformation mediate positivity symptoms of agency abnormality in mental disorders.


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