Resumo:
Os medicamentos anticonvulsivantes (ASMs), usados para tratar epilepsia e estabilizar o humor, apresentam riscos durante a gravidez, como malformações fetais e problemas de neurodesenvolvimento. O valproato é um dos mais perigosos, associado a QIs mais baixos e maior incidência de autismo, TDAH e deficiência intelectual.
Os medicamentos anticonvulsivantes (ASMs) são amplamente utilizados para tratar convulsões em casos de epilepsia e estabilizar o humor em condições psiquiátricas, como transtorno bipolar.
Apesar de sua eficácia, o uso desses medicamentos durante a gravidez levanta sérias preocupações devido ao risco que representam para o desenvolvimento do feto. Esses riscos incluem malformações físicas e impactos no neurodesenvolvimento da criança a longo prazo.
Um dos ASMs mais conhecidos, o Valproato, é comprovadamente teratogênico, ou seja, causa defeitos congênitos e danos ao desenvolvimento fetal, sendo contraindicado para grávidas independentemente da indicação.
Estudos robustos, como o Neurodevelopmental Effects of Antiepileptic Drugs, demonstraram que crianças expostas ao Valproato no útero apresentam um QI mais baixo aos seis anos, além de uma maior probabilidade de desenvolver autismo, deficiência intelectual e TDAH (Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade).
No entanto, os riscos associados a outros anticonvulsivantes mais recentes ou menos utilizados, como o Topiramato, ainda são menos compreendidos.
Pesquisas, como um amplo estudo nórdico, sugerem que o uso do Topiramato durante a gravidez pode dobrar o risco de condições neurodesenvolvimentais, como deficiência intelectual em crianças.
Por outro lado, um estudo norte-americano não conseguiu confirmar essas associações de maneira conclusiva, destacando a necessidade de mais investigações.
Avaliar os efeitos causais dos ASMs é uma tarefa complexa, pois não é viável realizar ensaios clínicos randomizados por questões éticas e práticas.
Além disso, fatores genéticos que influenciam tanto a indicação dos ASMs quanto os transtornos neurodesenvolvimentais podem confundir os resultados.
Isso significa que os riscos associados aos medicamentos podem estar misturados com as características genéticas subjacentes da mãe ou do feto.
Para lidar com essas limitações, pesquisadores da University of Bristol conduziram um estudo combinando dados de cuidados primários do Reino Unido e registros nacionais da Suécia.
Essa análise, envolvendo mais de 3,18 milhões de crianças, das quais 17.495 foram expostas a ASMs durante a gestação, avaliou a relação entre a exposição aos medicamentos e diagnósticos neurodesenvolvimentais, como autismo e deficiência intelectual.
A metodologia incluiu comparações entre irmãos expostos e não expostos aos medicamentos, permitindo minimizar a interferência de fatores genéticos e ambientais.
Os resultados mostraram que crianças expostas ao Valproato apresentaram maior probabilidade de diagnóstico de autismo, deficiência intelectual e TDAH.
Quanto ao Topiramato, a exposição foi associada a um aumento de 2,5 vezes no risco de deficiência intelectual. A Carbamazepina foi associada a um risco 1,25 vezes maior de autismo e 1,3 vezes maior de deficiência intelectual. Enquanto isso, pouca evidência de aumento de risco neurodesenvolvimental utilizando Lamotrigina, sugerindo um perfil de segurança mais favorável.
O risco ajustado absoluto agrupado (%) de condições neurodesenvolvimentais da prole por exposição a ASM durante a gravidez nas idades de 4, 8 e 12 anos. Todas as estimativas são ajustadas para idade materna, região, diagnóstico de condições neurodesenvolvimentais antes da gravidez, evidência de consumo perigoso de bebida alcoólica e uso de drogas ilícitas durante a gravidez, gravidez, utilização de assistência médica, eventos convulsivos, uso de antipsicóticos e antidepressivos no ano anterior à gravidez, vômitos ou prescrições de antieméticos durante a gravidez e posição socioeconômica.
Observe que as estimativas combinadas do risco de TDAH entre aqueles não expostos a um ASM são fortemente ponderadas em direção ao Reino Unido (idade de risco 12), onde um risco menor foi estimado do que na Suécia (idade de risco 12). Tamanho da amostra para a figura: Coorte total = 3.182.771, Sem ASM = 3.165.276, Carbamazepina = 3.030, Gabapentina = 1.428, Lamotrigina = 5.974, Levetiracetam = 806, Fenitoína = 240, Pregabalina = 1.715, Topiramato = 418, Valproato = 1.601, Outros ASM = 543, Politerapia = 1.740. Os dados de origem são fornecidos como um arquivo de dados de origem. TDAH, transtorno do déficit de atenção e hiperatividade, medicamento anticonvulsivante ASM.
Esses achados destacam a necessidade de planejar cuidadosamente o uso de anticonvulsivantes antes da concepção, sempre que possível, e de considerar alternativas mais seguras, como a Lamotrigina, quando clinicamente apropriado.
Embora os riscos devam ser discutidos caso a caso, a pesquisa fornece informações valiosas para guiar médicos e pacientes em decisões informadas, especialmente em revisões por agências reguladoras, como a Agência Europeia de Medicamentos (EMA).
Mais pesquisas, especialmente com coortes maiores e acompanhamento a longo prazo, são essenciais para compreender melhor os riscos e benefícios de cada ASM durante a gravidez. Enquanto isso, a colaboração entre médicos, cientistas e reguladores é crucial para melhorar os cuidados para mulheres que precisam de ASMs e desejam engravidar.
LEIA MAIS:
Antiseizure medication use during pregnancy and children’s neurodevelopmental outcomes.
Madley-Dowd P, Ahlqvist VH, Forbes H. et al.
Nat Commun 15, 9640 (2024).
Abstract:
The teratogenic potential of valproate in pregnancy is well established; however, evidence regarding the long-term safety of other antiseizure medications (ASMs) during pregnancy remains limited. Using routinely collected primary care data from the UK and nationwide Swedish registries to create a cohort of 3,182,773 children, of which 17,495 were exposed to ASMs in pregnancy, we show that those exposed to valproate were more likely to receive a diagnosis of autism, intellectual disability, and ADHD, when compared to children not exposed to ASMs. Additionally, children exposed to topiramate were 2.5 times more likely to be diagnosed with intellectual disability (95% CI: 1.23–4.98), and those exposed to carbamazepine were 1.25 times more likely to be diagnosed with autism (95% CI: 1.05–1.48) and 1.30 times more likely to be diagnosed with intellectual disability (95% CI: 1.01–1.69). There was little evidence that children exposed to lamotrigine in pregnancy were more likely to receive neurodevelopmental diagnoses. While further research is needed, these findings may support considering safer treatment alternatives well before conception when clinically appropriate.
Commentaires