Resumo:
As descobertas desse estudo são um marco no campo da neurogenética, ampliando nossa compreensão sobre como a variação genética influencia o desenvolvimento e o funcionamento do cérebro profundo. Elas também reforçam a conexão entre essas variações e doenças neuropsiquiátricas, como TDAH e Parkinson. Apesar disso, mais pesquisas são necessárias para confirmar relações causais e explorar como esses insights podem ser traduzidos em tratamentos mais eficazes para distúrbios cerebrais.
As estruturas subcorticais do cérebro desempenham papéis fundamentais em distúrbios do desenvolvimento, condições psiquiátricas e doenças neurológicas.
Essas áreas incluem regiões profundas do cérebro responsáveis por funções como memória, controle motor, regulação emocional e processamento de recompensas e punições.
Um novo estudo, conduzido por pesquisadores da Universidade de Queensland e publicado na revista Nature Genetics, trouxe avanços significativos para a compreensão dessas estruturas ao identificar variações genéticas associadas ao seu volume.
Locais das regiões subcorticais. Cada região é rotulada com cores diferentes. Fonte: Zhenni Gao et al. August 2021. Brain Structure and Function 226(10):1-11. DOI: 10.1007/s00429-021-02355-z
No maior estudo desse tipo até hoje, os cientistas analisaram amostras de DNA e exames de ressonância magnética de 74.898 indivíduos de ascendência europeia.
Eles realizaram estudos de associação genômica ampla (GWAS) para examinar o volume intracraniano e de nove regiões subcorticais: tronco cerebral, hipocampo, amígdala, tálamo, núcleo accumbens, putâmen, núcleo caudado, globo pálido e diencéfalo ventral.
Através dessa abordagem, os pesquisadores identificaram 254 loci genéticos independentes que influenciam o volume dessas regiões, explicando até 35% da variação observada entre os participantes.
Loci genéticos referem-se às posições específicas ocupadas por um gene ou uma sequência de DNA no genoma, geralmente em um cromossomo. No contexto de estudos como GWAS, como no texto que discutimos, "loci independentes" referem-se a regiões do genoma onde variantes genéticas específicas foram identificadas como estando associadas a um traço ou condição. Cada locus independente aponta para uma região genética que contribui para uma característica sem redundância com outros loci identificados.
Esses loci genéticos também foram associados à expressão gênica em tipos específicos de células neurais, em diferentes momentos de sua diferenciação.
Genes relacionados à sinalização intracelular e processos de envelhecimento cerebral foram destacados, sugerindo uma relação com o desenvolvimento e a degeneração do cérebro.
Estudo de associação em todo o genoma (GWAS) nada mais é do que uma ferramenta utilizada no estudo de relação entre características fenotípicas e genótipo. Fonte: Wasana Sukhumsirichart. Genetic Diversity and Disease Susceptibility. DOI: 10.5772/intechopen.76728
Além de mapear as variações genéticas que moldam o volume cerebral, o estudo explorou a conexão dessas variantes com doenças como o transtorno de déficit de atenção/hiperatividade (TDAH) e a doença de Parkinson.
A análise revelou evidências de que alterações nos volumes de estruturas subcorticais estão ligadas a um risco genético aumentado para essas condições.
Segundo os pesquisadores, essas descobertas são um passo crucial para compreender as bases biológicas de distúrbios cerebrais.
Eles tambem destacam que as influências genéticas responsáveis pelas diferenças individuais na estrutura cerebral podem ser fundamentais para entender as causas subjacentes de doenças relacionadas ao cérebro.
O estudo foi realizado em parceria com o consórcio internacional ENIGMA (Enhancing Neuro Imaging Genetics through Meta-Analysis), uma iniciativa que reúne mais de mil laboratórios de pesquisa de 45 países. A missão do ENIGMA é investigar variações genéticas que afetam a estrutura e a função do cérebro, unindo esforços para desbravar os mecanismos biológicos subjacentes a condições neurológicas e psiquiátricas.
Uma das metas dessa pesquisa é identificar regiões cerebrais que apresentam diferenças estruturais entre grupos, como pessoas com determinadas doenças, e investigar como genes específicos controlam o desenvolvimento dessas áreas.
Esses achados podem fornecer pistas importantes sobre intervenções terapêuticas, apontando diretamente onde os genes agem no cérebro.
Embora este estudo seja correlacional, representando associações entre genes e estruturas cerebrais, ele estabelece um alicerce valioso para investigações futuras. Este é o primeiro estudo que localiza com precisão onde os genes atuam no cérebro. Esse conhecimento inicial pode servir como um roteiro para intervenções que visem corrigir disfunções cerebrais em diferentes condições.
As descobertas desse estudo são um marco no campo da neurogenética, ampliando nossa compreensão sobre como a variação genética influencia o desenvolvimento e o funcionamento do cérebro profundo.
Elas também reforçam a conexão entre essas variações e doenças neuropsiquiátricas, como TDAH e Parkinson. Apesar disso, mais pesquisas são necessárias para confirmar relações causais e explorar como esses insights podem ser traduzidos em tratamentos mais eficazes para distúrbios cerebrais.
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Genomic analysis of intracranial and subcortical brain volumes yields polygenic scores accounting for variation across ancestries.
García-Marín LM, Campos AI, Diaz-Torres S. et al.
Nat Genet 56, 2333–2344 (2024).
Abstract:
Subcortical brain structures are involved in developmental, psychiatric and neurological disorders. Here we performed genome-wide association studies meta-analyses of intracranial and nine subcortical brain volumes (brainstem, caudate nucleus, putamen, hippocampus, globus pallidus, thalamus, nucleus accumbens, amygdala and the ventral diencephalon) in 74,898 participants of European ancestry. We identified 254 independent loci associated with these brain volumes, explaining up to 35% of phenotypic variance. We observed gene expression in specific neural cell types across differentiation time points, including genes involved in intracellular signaling and brain aging-related processes. Polygenic scores for brain volumes showed predictive ability when applied to individuals of diverse ancestries. We observed causal genetic effects of brain volumes with Parkinson’s disease and attention-deficit/hyperactivity disorder. Findings implicate specific gene expression patterns in brain development and genetic variants in comorbid neuropsychiatric disorders, which could point to a brain substrate and region of action for risk genes implicated in brain diseases.
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