
Resumo:
Esse estudo traz uma análise detalhada da relação entre a doença de Alzheimer (DA) e o transtorno do uso de álcool (TUA), investigando como o consumo excessivo de álcool pode influenciar a progressão do Alzheimer em nível molecular e celular. Ao analisar a expressão genética em células cerebrais individuais, a equipe encontrou interrupções compartilhadas na inflamação, sinalização celular e funções dos vasos sanguíneos em ambos os transtornos. Essas descobertas destacam o AUD como um fator de risco potencial para DA e podem levar a novos alvos terapêuticos.
A doença de Alzheimer é uma forma de demência que afeta progressivamente o cérebro, iniciando com perda de memória leve e evoluindo para danos mais graves, que comprometem a comunicação e as habilidades básicas do dia a dia.
Prevê-se que cerca de 14 milhões de pessoas nos Estados Unidos estarão convivendo com Alzheimer até 2060. Embora fatores como idade e genética sejam conhecidos como os principais determinantes da doença, o estudo também explora o impacto do consumo de álcool — um fator de risco com efeitos complexos.
Em muitos casos, o uso prolongado e excessivo de álcool, ou mesmo a abstinência de longo prazo, são fatores de risco para demências, enquanto um consumo regular e moderado pode ter impactos variados.
Um estudo em especial associou o transtorno do uso de álcool a casos de demência precoce, e a pesquisa em modelos animais indica que a dependência pode acelerar os sintomas em camundongos predispostos a desenvolver Alzheimer.

O impacto do álcool em processos celulares é amplo, envolvendo vias importantes para a DA, como neuroinflamação, estresse oxidativo, disfunção mitocondrial, e alterações vasculares, todos processos diretamente relacionados a doenças neurodegenerativas.
O álcool também interfere na autofagia (o processo pelo qual as células eliminam componentes danificados), no fluxo sanguíneo cerebral e na integridade dos vasos.
Neste estudo, pesquisadores do The Scripps Research Institute aplicaram uma tecnologia avançada, a análise transcriptômica de célula única, para estudar o impacto do álcool e do Alzheimer ao nível da expressão gênica em células cerebrais de pessoas com Alzheimer, abrangendo estágios iniciais, intermediários e avançados da doença.
Com a análise do transcriptoma (conjunto completo de moléculas de RNA em uma célula), os cientistas puderam observar mudanças na atividade genética de cada célula cerebral. A equipe estudou amostras de 75 indivíduos com Alzheimer e 10 pessoas sem a doença, isolando e analisando a expressão gênica em centenas de milhares de células cerebrais individuais.
Para uma maior precisão, eles usaram o estadiamento clínico da DA, que considera não apenas a presença de placas características da doença, mas também a gravidade de outras patologias associadas.

Tabela com todos os genes identificados na DA. Genes regulados positivamente (Upregulated genes) e Genes regulados negativamente (Downregulated genes). Nos estágios da doença: Inicias (Early), Intermediários (Intermediate) e Avançado (Advanced)
Com essa abordagem, os cientistas identificaram mudanças específicas na expressão gênica ao longo da progressão da doença, observando, por exemplo, uma diminuição progressiva nos neurônios glutamatérgicos (excitadores) e GABAérgicos (inibidores) em diferentes camadas cerebrais.
Dentro dos neurônios GABAérgicos, os neurônios que produzem somatostatina (Sst) foram particularmente vulneráveis no início da doença. Além disso, encontraram reduções significativas em subtipos de neurônios glutamatérgicos, tanto nas camadas superficiais quanto nas camadas profundas do cérebro.
As análises também revelaram que o Alzheimer e o TUA compartilham várias vias alteradas, como neuroinflamação, fosforilação e sinalização de cálcio. Marcadores genéticos do TUA mostraram correlações significativas com a DA avançada, especialmente fatores de transcrição envolvidos na neuroinflamação e degeneração neuronal.

Essas descobertas sugerem que a progressão acelerada da DA em pacientes com histórico de consumo excessivo de álcool pode estar associada a mecanismos transcricionais compartilhados, afetando o modo como genes específicos se expressam e influenciam a doença.
Em resumo, o estudo traz novas evidências de que a dependência de álcool pode potencialmente exacerbar a progressão do Alzheimer, sugerindo que alguns dos processos biológicos envolvidos no Alzheimer também podem ser acionados pelo consumo excessivo de álcool.
Esse estudo traz uma análise detalhada da relação entre a doença de Alzheimer (DA) e o transtorno do uso de álcool (TUA), investigando como o consumo excessivo de álcool pode influenciar a progressão do Alzheimer em nível molecular e celular.

Distribuição do número de neurônios nos tipos de células correspondentes em cada categoria de doadores na DA. a) Todos os neurônios inibitórios. b) Todos os neurônios excitatórios. c) Sst. d) Sst Chodl. e) Vip. f) Sncg. g) Pvalb. h) L5/6 NP. i) L5 ET. j) L5 IT. k) L2/3 IT. l) L6 IT Car3.
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Transcriptional Patterns in Stages of Alzheimer's Disease Are Cell-Type–Specific and Partially Converge with the Effects of Alcohol Use Disorder in Humans
Arpita Joshi, Federico Manuel Giorgi and Pietro Paolo Sanna
eNeuro 19 September 2024, 11 (10) ENEURO.0118-24.2024
Abstract:
Advances in single-cell technologies have led to the discovery and characterization of new brain cell types, which in turn lead to a better understanding of the pathogenesis of Alzheimer's disease (AD). Here, we present a detailed analysis of single-nucleus (sn)RNA-seq data for three stages of AD from middle temporal gyrus and compare it with snRNA-seq data from the prefrontal cortices from individuals with alcohol use disorder (AUD). We observed a significant decrease in both inhibitory and excitatory neurons, in general agreement with previous reports. We observed several cell-type–specific gene expressions and pathway dysregulations that delineate AD stages. Endothelial and vascular leptomeningeal cells showed the greatest degree of gene expression changes. Cell-type–specific evidence of neurodegeneration was seen in multiple neuronal cell types particularly in somatostatin and Layer 5 extratelencephalic neurons, among others. Evidence of inflammatory responses was seen in non-neuronal cells, particularly in intermediate and advanced AD. We observed common perturbations in AD and AUD, particularly in pathways, like transcription, translation, apoptosis, autophagy, calcium signaling, neuroinflammation, and phosphorylation, that imply shared transcriptional pathogenic mechanisms and support the role of excessive alcohol intake in AD progression. Major AUD gene markers form and perturb a network of genes significantly associated with intermediate and advanced AD. Master regulator analysis from AUD gene markers revealed significant correlation with advanced AD of transcription factors that have implications in intellectual disability, neuroinflammation, and other neurodegenerative conditions, further suggesting a shared nexus of transcriptional changes between AD and AUD.
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