Resumo:
O Transtorno de Estresse Pós-Traumático (TEPT) é uma condição marcada por sintomas como intrusões traumáticas, evitação, alterações no humor e cognições, além de mudanças na excitação e reatividade emocional. Em crianças pequenas, esses sintomas podem se manifestar por meio de brincadeiras que revivem aspectos do evento traumático ou em sonhos perturbadores. Este estudo explora como fatores de risco e proteção no ambiente familiar podem influenciar essa associação, com foco especial no impacto do trauma materno sobre o desenvolvimento de sintomas em seus filhos pequenos.
O Transtorno de Estresse Pós-Traumático (TEPT) é uma condição que surge após vivenciar ou presenciar eventos extremamente traumáticos, como violência, desastres ou guerras. Ele é caracterizado por sintomas como flashbacks (revivências intensas do trauma), evitação de situações associadas ao evento, alterações no humor e reatividade exacerbada, como estar constantemente em alerta.
Nos adultos, o TEPT pode ser devastador, mas seus efeitos também podem se estender às crianças da família. Estudos mostram que crianças pequenas frequentemente refletem seus traumas em brincadeiras repetitivas ou em pesadelos.
Além disso, a ciência tem apontado uma ligação entre o TEPT dos pais e o dos filhos, mas ainda há muito a entender sobre os mecanismos que explicam essa relação.
Este estudo, realizado por pesquisadores da Ben-Gurion University of the Negev, Israel, teve como foco investigar como as mães que enfrentam o TEPT influenciam seus filhos e se há fatores que podem proteger as crianças dessa influência negativa.
O trabalho buscou explorar o papel das funções executivas (FEs) maternas, que são habilidades cognitivas complexas responsáveis pela autorregulação, como memória de trabalho, controle de impulsos e flexibilidade mental.
Pesquisadores acreditam que essas funções podem ajudar as mães a lidar melhor com o estresse, criando um ambiente mais protetor para seus filhos.
A pesquisa foi realizada com 131 mães vivendo em uma região de conflito no sul de Israel, onde o risco de exposição a eventos traumáticos é alto. Todas estavam grávidas pela segunda vez e tinham pelo menos um filho pequeno.
As mães foram avaliadas em três aspectos principais: (1) Nível de TEPT Materno: As mães relataram seus próprios sintomas de TEPT, como flashbacks ou sentimentos de medo extremo. (2) TEPT Infantil: Também responderam a perguntas sobre os comportamentos dos filhos, como sinais de ansiedade ou brincadeiras relacionadas ao trauma. (3) Funções Executivas Maternas: As habilidades cognitivas das mães foram avaliadas por meio de testes computadorizados.
Uma habilidade específica chamada “atualização da memória de trabalho” foi destacada. Ela mede a capacidade de armazenar e ajustar informações conforme necessário, algo crucial para lidar com o estresse e tomar decisões em situações difíceis.
Além disso, os pesquisadores analisaram o nível de ameaça ao qual cada família estava exposta. Isso incluiu desde eventos diretos, como ataques, até viver em um ambiente de alta tensão contínua.
Os resultados do estudo confirmaram que há, de fato, uma ligação entre o TEPT das mães e de seus filhos. Ou seja, quanto mais grave o TEPT da mãe, maiores as chances de a criança também apresentar sintomas. No entanto, essa relação foi modulada por dois fatores: A atualização da memória de trabalho materna e o nível de ameaça.
As mães com melhores habilidades de memória de trabalho demonstraram um efeito protetor. Elas conseguiram amortecer o impacto de seus próprios traumas sobre os filhos, mesmo em situações de alta ameaça. Já as mães com habilidades reduzidas de memória de trabalho apresentaram uma correlação mais forte entre seus sintomas e os das crianças, especialmente quando expostas a contextos de maior perigo.
Já em ambientes de alta ameaça, a influência do TEPT materno sobre o infantil foi mais evidente entre mães com habilidades cognitivas limitadas. Por outro lado, para mães com boa capacidade de autorregulação, o nível de ameaça não teve um impacto significativo na relação entre os sintomas de TEPT delas e dos filhos.
Esses achados sugerem que as funções executivas eficazes ajudam as mães a lidar melhor com o estresse, permitindo que protejam seus filhos de vivenciarem os mesmos impactos psicológicos.
Este estudo destaca um ponto crucial: a saúde mental das mães não afeta apenas a elas, mas também seus filhos. No entanto, há fatores que podem agir como um "escudo protetor" para as crianças, e as funções executivas das mães são um deles.
Habilidades como memória de trabalho e autorregulação ajudam as mães a responder de maneira mais positiva ao estresse e a criar um ambiente familiar mais seguro, mesmo em situações difíceis. Além disso, essas habilidades podem ser desenvolvidas ou fortalecidas por meio de intervenções psicológicas e programas de treinamento.
Este trabalho abre caminho para novas estratégias de apoio a famílias expostas a traumas, principalmente em contextos de conflito. Ao melhorar as funções executivas das mães, pode ser possível reduzir os efeitos intergeracionais do TEPT.
A pesquisa também levanta questões importantes: será que essas descobertas se aplicam a pais em outros contextos? E como exatamente as funções executivas podem ser trabalhadas para oferecer proteção contra o impacto do trauma?
Compreender essas questões é essencial para desenvolver políticas e programas que protejam famílias em situações de risco, garantindo um futuro mais saudável para crianças e adultos.
LEIA MAIS:
The association between maternal and child posttraumatic stress symptoms among families living in southern Israel: The buffering role of maternal executive functions
Michal Levy, Tal Yatziv, Kinneret Levavi, Porat Yakov, Alison Pike, Kirby Deater-Deckard, Amnon Hadar, Guy Bar, Miron Froimovici, Naama Atzaba-Poria
Stress & Health. Volume 40, Issue5. October 2024. e3456
Abstract:
Posttraumatic stress disorder is a prolonged stress and anxiety response that occurs after exposure to a traumatic event. Research shows that both parental and child posttraumatic stress symptoms (PTSS) are correlated but parental executive functions (EFs) could buffer this link. EFs refers to a group of high-level cognitive processes that enable self-regulation of thoughts and actions to achieve goal-directed behaviours and can be of importance for both positive parenting interactions and effective coping skills for PTSS. Our study aimed to (1) examine the link between maternal and child PTSS and the moderating role of varying degrees of exposure to severe security threats context, and (2) to identify the moderating role of maternal EFs in this interaction, among families living in southern Israel. Our sample included 131 mothers in their second pregnancy and their firstborn children. Mothers performed computerised tasks to assess their EFs and they reported on their own and their child's PTSS. Results revealed a positive correlation between maternal PTSS and child PTSS. However, the link between maternal and child PTSS was moderated by maternal working memory updating abilities and threat context severity. Among mothers with lower updating capacities, the association between maternal and child symptoms was stronger under higher threat contexts; conversely, among mothers with higher maternal updating abilities, threat context did not modulate the link between maternal and child PTSS, suggesting a stress-buffering effect. Our study contributes to the growing literature on the significant role of parental EFs in the context of parent-child interactions.
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