Resumo:
Cientistas usando exames de fMRI de todo o cérebro, descobriram que bilíngues têm uma comunicação mais eficiente entre diferentes regiões cerebrais, especialmente entre o cerebelo e o córtex frontal esquerdo. Aprender uma segunda língua, principalmente na infância, melhora a conectividade cerebral, impulsionando a flexibilidade cognitiva e a neuroplasticidade. Isso pode levar a um melhor desempenho cognitivo e maior resistência ao declínio relacionado à idade.
O bilinguismo oferece uma oportunidade única para estudarmos como o cérebro organiza e processa a linguagem. Isso ocorre porque o cérebro humano tem uma capacidade notável de se adaptar e mudar ao longo da vida, um fenômeno chamado de neuroplasticidade.
Quando aprendemos algo novo, especialmente uma nova língua, o cérebro passa por modificações, tanto em sua estrutura (física) quanto em sua funcionalidade (como ele processa informações).
Uma questão importante na neurociência é como a idade afeta essas mudanças. O aprendizado de uma língua desde o nascimento, quando o cérebro ainda está em desenvolvimento, leva a uma organização cerebral diferente em comparação ao aprendizado de uma segunda língua na idade adulta, quando o cérebro já possui caminhos estabelecidos para processar a primeira língua.
Estudos mostram que o bilinguismo pode melhorar várias funções cognitivas, como memória, atenção e até a capacidade de entender a fala em ambientes barulhentos. Além disso, o bilinguismo pode ajudar a proteger o cérebro em casos de envelhecimento, lesões cerebrais ou condições como a epilepsia.
Pesquisas em neuroimagem (como a fMRI, que estuda o cérebro em ação) indicam que o aprendizado de uma segunda língua afeta áreas específicas do cérebro, como o cerebelo e regiões do hemisfério esquerdo, associadas ao processamento da linguagem.
No entanto, também foi observado que o bilinguismo influencia outras partes do cérebro, incluindo áreas envolvidas no controle cognitivo, que ajudam a coordenar as diferentes tarefas necessárias para o uso de múltiplas línguas.
Outro aspecto interessante do bilinguismo é que ele não apenas afeta regiões específicas do cérebro, mas também melhora a forma como diferentes áreas do cérebro se comunicam entre si.
O cérebro funciona como uma rede complexa de áreas interconectadas, e a eficiência dessa rede é crucial para a cognição. Pesquisas mostram que bilíngues tendem a ter uma maior integração funcional entre essas áreas cerebrais, o que significa que o cérebro de uma pessoa bilíngue é mais eficiente em suas operações.
Um novo estudo do Neuro (Instituto Neurológico de Montreal-Hospital) da Universidade McGill, da Universidade de Ottawa e da Universidade de Zaragoza na Espanha elabora o papel do bilinguismo na cognição, mostrando maior eficiência da comunicação entre regiões cerebrais. Os cientistas recrutaram 151 participantes que falavam francês, inglês ou ambas as línguas e registraram a idade em que aprenderam sua segunda língua.
Os participantes foram escaneados usando ressonância magnética funcional em estado de repouso (fMRI) para registrar a conectividade de todo o cérebro, em vez de focar em regiões específicas, como foi feito em estudos anteriores sobre bilinguismo.
As varreduras de fMRI revelaram que os participantes bilíngues tinham maior conectividade entre regiões cerebrais do que os participantes monolíngues, e essa conectividade era mais forte naqueles que aprenderam sua segunda língua em uma idade mais jovem. Esse efeito era particularmente forte entre o cerebelo e o córtex frontal esquerdo.
As análises de rede do cérebro inteiro revelam maior eficiência global em indivíduos bilíngues do que em monolíngues, indicando maior integração funcional no cérebro bilíngue.
A Figura mostra regiões do cérebro que apresentaram maior conectividade cortical e córtico-cerebelar no grupo bilingue em comparação ao grupo monolíngue. Gráfico de barras de frequência dividido em bordas intra-direitas (R–R), intra-esquerdas (L–L) ou inter-hemisféricas (L–R). AUD auditivo, CBL cerebelar, CON cingulo-opercular, CPN cingulo-parietal, DMN modo padrão, DAN atenção dorsal, FPN fronto-parietal, RTN retroesplenial-temporal, SAL saliência, SMH sensório-motor-mão, SMM sensório-motor-boca, SUB subcortical, VAN atenção ventral, VIS visual.
Além disso, a idade em que a segunda língua foi adquirida correlacionou-se com essa maior eficiência, sugerindo que a exposição precoce a uma segunda língua tem efeitos positivos duradouros na organização funcional do cérebro.
Investigações posteriores usando a abordagem estatística baseada em rede indicam que esse efeito é impulsionado principalmente pela maior conectividade funcional entre redes de associação e o cerebelo. Essas descobertas mostram que o momento da experiência de aprendizagem bilíngue altera a organização funcional do cérebro em níveis global e local.
A Figura a conectividade cortical e córtico-cerebelar foi maior em bilíngues precoces e simultâneos em comparação aos monolíngues. AUD auditivo, CBL cerebelar, CON cingulo-opercular, CPN cingulo-parietal, DMN modo padrão, DAN atenção dorsal, FPN fronto-parietal, RTN retroesplenial-temporal, SAL saliência, SMH sensório-motor-mão, SMM sensório-motor-boca, SUB subcortical, VAN atenção ventral, VIS visual.
Em resumo, o bilinguismo não apenas melhora habilidades cognitivas, mas também reorganiza o cérebro de maneiras que vão além do simples processamento da linguagem. A idade em que uma pessoa aprende a segunda língua tem um impacto significativo na eficiência e organização dessa rede cerebral, com vantagens cognitivas que podem durar a vida toda.
“Nosso trabalho sugere que aprender uma segunda língua durante a infância ajuda a construir uma organização cerebral mais eficiente em termos de conectividade funcional”, diz Zeus Gracia Tabuenca, o primeiro autor do artigo.
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Enhanced efficiency in the bilingual brain through the inter-hemispheric cortico-cerebellar pathway in early second language acquisition
Gracia-Tabuenca, Z., Barbeau, E.B., Kousaie, S. et al.
Commun Biol 7, 1298 (2024). doi.org/10.1038/s42003-024-06965-1
Abstract:
Bilingualism has a profound impact on the structure and function of the brain, but it is not yet well understood how this experience influences brain functional organization. We examine a large sample (151 participants) of monolinguals and bilinguals with varied age of second language acquisition, who underwent resting-state functional magnetic brain imaging. Whole-brain network analyses reveal higher global efficiency in bilingual individuals than monolinguals, indicating enhanced functional integration in the bilingual brain. Moreover, the age at which the second language was acquired correlated with this increased efficiency, suggesting that earlier exposure to a second language has lasting positive effects on brain functional organization. Further investigation using the network-based statistics approach indicates that this effect is primarily driven by heightened functional connectivity between association networks and the cerebellum. These findings show that the timing of bilingual learning experience alters the brain functional organization at both global and local levels.
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