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A Conexão Oculta: Vírus Intestinal e o Desenvolvimento do Alzheimer


O estudo identificou um subtipo de microglia chamado CD83(+), associado à doença de Alzheimer (DA), presente em maior número nos cérebros de indivíduos com a doença. Essas células estão ligadas a um aumento de imunoglobulina G4 (IgG4) e à presença do citomegalovírus humano (HCMV) em várias partes do corpo, sugerindo uma interação entre a infecção viral, o sistema imunológico e a progressão da DA.


Recentemente, avanços na tecnologia de sequenciamento de RNA de núcleo único (snRNAseq) têm possibilitado uma análise mais detalhada de como as células cerebrais funcionam e se comportam em condições como a doença de Alzheimer (DA).


Essa técnica permite estudar a expressão gênica em nível celular, algo que não pode ser realizado com métodos tradicionais de análise de tecidos.


Um estudo baseado em dados coletados do programa de doação de cérebros "Arizona Study of Aging and Neurodegenerative Disorders" (AZSAND) analisou 481.840 núcleos de amostras do giro frontal superior (uma região do cérebro) de 101 indivíduos idosos, incluindo 66 com DA e 35 controles saudáveis. 


Os pesquisadores identificaram um subtipo específico de células do sistema imunológico no cérebro, chamadas microglias CD83(+), que estavam presentes em 47% dos casos de DA e em 25% dos controles saudáveis.


As microglias são células imunológicas do cérebro que desempenham papéis essenciais na limpeza de detritos celulares e na resposta a inflamações. 

As microglias CD83(+) são nomeadas por expressarem um marcador chamado CD83, mas também apresentam outros genes associados. Entre os casos de DA, essas microglias não mostraram relação com fatores de risco comuns, como a presença da variante genética APOE4, idade ou outras comorbidades.


No entanto, sua presença foi associada a um aumento na carga de placas neuríticas (depósitos anormais de proteínas no cérebro) e emaranhados neurofibrilares (uma característica marcante da DA).


Análises mais profundas mostraram que essas microglias estão associadas a alterações em vias biológicas críticas, como as de senescência celular, processamento de ferro e lipídios, e ativação do sistema complemento.


Essas funções são importantes para o desenvolvimento e a saúde do cérebro. Um fator intrigante identificado foi o RNA não codificante AC131944.1.  Diferentemente do RNA que codifica proteínas, este tipo de RNA tem funções regulatórias, como controlar a expressão de outros genes.


No caso do AC131944.1, ele pode estar influenciando genes ligados às funções críticas mencionadas acima, desempenhando um papel central no comportamento anômalo dessas microglias. Isso o torna um alvo potencial para estudos futuros e, possivelmente, para intervenções terapêuticas.


Como CD83 é também um marcador de células dendríticas (que combatem infecções), os pesquisadores da Arizona State University, USA, levantaram a hipótese de que a presença de microglias CD83(+) poderia estar relacionada a alterações microbianas ou imunológicas. 


Dados coletados de amostras do cólon transverso (TC) desses indivíduos revelaram níveis elevados de uma proteína associada a anticorpos IgG4. Isso sugere que o sistema imunológico pode estar reagindo a estímulos microbianos no intestino de forma diferente em indivíduos com DA.

A ideia de que micróbios podem influenciar o risco ou o progresso da DA não é nova. Desde o início do século XX, pesquisadores propuseram essa possibilidade. No entanto, nenhum único patógeno foi consistentemente ligado à DA.


Neste estudo, os cientistas identificaram uma associação significativa entre a presença do citomegalovírus humano (HCMV), microglias CD83(+), e IgG4 em várias partes do corpo, incluindo o cérebro.


Para entender melhor a ligação entre HCMV e a DA, os pesquisadores usaram organoides cerebrais (modelos laboratoriais de minicérebros). Quando infectados com HCMV, esses organoides começaram a apresentar sinais típicos da DA, como o acúmulo de proteínas Aβ42 e pTau-212 e a morte neuronal.


Isso sugere que o vírus pode desempenhar um papel direto na indução de características da DA. Além disso, a análise mostrou que a presença de microglias CD83(+) e de IgG4 pode indicar uma tentativa do sistema imunológico de tolerar a infecção por HCMV.


Essa resposta imune moderada pode proteger contra uma destruição celular mais agressiva, mas também pode permitir que a doença progrida.

A infecção por HCMV de organoides cerebrais humanos acelera as características neuropatológicas da DA. (A) A infecção por HCMV de organoides cerebrais humanos demonstra correlações significativas entre Aβ42 e pTau-212, e abundância de HCMV em (B–C) células vivas e (D–E) mortas. Fotomicrografias representativas mostradas. Aβ42, beta-42 amiloide; DA, doença de Alzheimer; LCR, fluido cerebrospinal; HCMV, citomegalovírus humano;


O estudo identificou associações significativas entre microglias CD83(+), HCMV e IgG4 em várias partes do corpo e do sistema nervoso central. As descobertas apontam para interações complexas entre micróbios, o sistema imunológico e a progressão da DA.


A presença de HCMV no sistema nervoso e em outros tecidos abre a possibilidade de intervenções antivirais específicas. No entanto, os mecanismos exatos ainda precisam ser mais explorados, incluindo fatores que levam algumas pessoas expostas ao HCMV a desenvolverem DA enquanto outras não.



LEIA MAIS:


Alzheimer's disease-associated CD83(+) microglia are linked with increased immunoglobulin G4 and human cytomegalovirus in the gut, vagal nerve, and brain

Benjamin P. Readhead and Diego F. Mastroeni et al. 

Alzheimer’s & Dementia. 19 December 2024 


Abstract:


While there may be microbial contributions to Alzheimer's disease (AD), findings have been inconclusive. We recently reported an AD-associated CD83(+) microglia subtype associated with increased immunoglobulin G4 (IgG4) in the transverse colon (TC). We used immunohistochemistry (IHC), IgG4 repertoire profiling, and brain organoid experiments to explore this association. CD83(+) microglia in the superior frontal gyrus (SFG) are associated with elevated IgG4 and human cytomegalovirus (HCMV) in the TC, anti-HCMV IgG4 in cerebrospinal fluid, and both HCMV and IgG4 in the SFG and vagal nerve. This association was replicated in an independent AD cohort. HCMV-infected cerebral organoids showed accelerated AD pathophysiological features (Aβ42 and pTau-212) and neuronal death. Findings indicate complex, cross-tissue interactions between HCMV and the adaptive immune response associated with CD83(+) microglia in persons with AD. This may indicate an opportunity for antiviral therapy in persons with AD and biomarker evidence of HCMV, IgG4, or CD83(+) microglia.

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